PARTE V

Ex-Cabo da F.A.B. Pós 1964 – Responde à matéria produzida pelo Correio Braziliense

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Em 18/03/2003, o saudoso e Exmo. Sr. Senador Ramez Tebet, em pronunciamento no Senado Federal, publicado no Diário do Senado Federal de 19/03/2003, pg. 3864, assim discursou:

“(….) afinal a matéria que me traz à tribuna é referente à Lei nº 10.559 , de 13 de novembro de 2002, que tive a honra e a satisfação de promulgar quando na Presidência do Congresso Nacional.

Essa lei cuida das indenizações e dos direitos dos anistiados civis e militares punidos politicamente à época do regime autoritário.

Surgiu a noticia (…), de que o Governo Federal, sob o pretexto de rever as indenizações havia suspendido todos os pagamentos, o que nos causou profunda estranheza, porque foi feito um esforço muito grande para aprová-la no âmbito do Congresso Nacional – foi relator da matéria o Líder do meu partido, Senador Renan Calheiros.

Felizmente as coisas não bem assim: tomamos conhecimento de que os novos conselheiros da Comissão de anistia já estão a postos. A partir de 19 de março começam os trabalhos voltados para os anistiados políticos. Foi o que garantiu o novo presidente da Comissão, Dr. Marcello Lavènere, na sexta-feira ultima, dia 14, durante ato solene que contou com a presença do ministro Márcio Thomaz Bastos, de conselheiros e anistiados.

O Ministro da Justiça, homem de profundo conhecimento jurídico e de grande senso de justiça, afirmou que dará todo apoio à Comissão de Anistia e destacou que pretende dar continuidade ao trabalho iniciado na Gestão anterior, lembrando, ainda, que um dos principais objetivos do governo do Presidente Lula é promover uma administração voltada para o social.

O presidente que acaba de ser empossado, Dr. Marcelo Lavènere, citou que todo o esforço da Comissão da Paz, pleiteando reparação dos danos causados, não representa a mínima parte do que os anistiados sofreram. (…)

Essa Comissão de Anistia, realiza (…) um trabalho relevante, de interesse público, e um trabalho realizado sem remuneração. O Dr. Marcelo Lavènere sucede o Dr José Alves Paulino, importante e eficiente membro do Ministério Público que procurou desenvolver um grande trabalho.

Isso é importante? É sim (…), porque se trata da reparação de uma injustiça. Na realidade, sabemos que não há dinheiro que pague a perda da vida, a perda da tranqüilidade e do futuro. Estas pessoas foram punidas – civis e militares -, basicamente, por pensarem diferentemente do regime então vigente. Nós, que somos políticos, sabemos o que é isto: o quanto custa pensar diferentemente em alguns momentos, o quanto custa defender determinados ideais.

O senso prático nos força a tentar estabelecer valores, a quantificar monetariamente a vida, a carreira e o futuro perdidos. Nunca seremos completamente felizes em estabelecer tais valores.

É preciso recordar: muitos dos possíveis beneficiários dessa lei, civis e militares, tiveram suas punições estabelecidas há 30 anos ou mais. É gente que deveria estar aproveitando uma aposentadoria digna, família criada, netos, uma boa receita para ter um pouco de paz de espírito. Em vez disso, vivem um presente de altos e baixos, vivem a inquietude.

Venho a esta tribuna pedir justiça para esses cidadãos e para que isso aconteça o mais rapidamente possível. (…).

A norma jurídica não precisa ser reinventada ou reformada; ela já é suficientemente clara sobre esse assunto. Precisamos, portanto, aplicá-la em sua plenitude. O art. 17, por exemplo, fala da anulação do beneficio e (…) em caso de fraude. Mas duvido que seja esse o problema.

(…) Vamos poupar esses homens que já ultrapassaram os 70 anos de idade. (…) outros já se foram, outros estão prestes a ir. Que todos eles, sejam civis ou militares, tenham a satisfação de receber uma recompensa pelo que lutaram e pelo que batalharam em favor do restabelecimento de uma vida democrática neste País.”

Depois, na sessão do dia 26/03/2003, da Câmara dos Deputados, o Exmo Sr. Deputado Federal Gonzaga Patriota fez pronunciamento, do qual se transcreve trecho:

“Para piorar a situação, na ultima semana, o Dr. Alves Paulino passou o comando da Comissão de Anistia ao Dr. Marcelo Lavènere Machado, que assumiu com novos conselheiros, dos quais grande número não é jurista.

Os anistiados não podem se tornar vitimas, mais uma vez, do Governo Federal. Não se trata de pedir um favor, mas de fazer justiça a essas pessoas, prejudicadas pela incompetente, cruel e esquecível ditadura militar brasileira.”

Posteriormente, em 13/11/2003, o Exmo Sr. Senador José Maranhão, em discurso pronunciado no Senado Federal, publicado no Diário do Senado Federal de 14/11/2003, pg. 36962, assim expressou-se :

“(…) Lamentável que a ordem democrática, que nos custou tantos sacrifícios restaurar, não se disponha a resgatar essa divida com a prontidão e a diligência necessárias. Pela morosidade, a atual administração contribui para prolongar no tempo as injurias mais diretas e pessoais que a ditadura infligiu à sociedade brasileira. Não podemos esquecer que os crimes perpetrados, que chegaram ao extremo de eliminar vidas, tiveram ampla natureza moral e econômica, cuja significação para as vitimas não se esgotou no ato da violência, mas se avolumou pela continuidade no tempo de seus efeitos nefastos.

Foram carreiras profissionais, projetos e perspectivas existenciais que a ditadura destruiu, atingindo brutalmente pessoas e suas famílias, privadas que foram, às vezes, por longo tempo, em outras, de forma definitiva, da possibilidade de uma reconstrução condigna, ao negar-lhes os direitos e as oportunidades de realização pessoal. Não reparar pronta e plenamente esses malefícios da ditadura equivale a um ato de cumplicidade com os seus crimes.”

O Professor Edgar Bodenheimer, em sua obra – Ciência do Direito, Filosofia e Metodologia Jurídicas, Rio de Janeiro, Forense, 1966, tradução de Enéas Marzano, p. 205 – destaca que, segundo Aristóteles, a justiça consiste “numa espécie de igualdade”.

De um lado, exige que as “coisas” sejam eqüitativamente atribuídas aos membros da comunidade ou Estado, e, de outro, ao direito compete defender essa justa distribuição de quaisquer violações.

O filósofo Leonardo Van Acker, em sua obra – Curso de Filosofia do Direito, 2º fascículo, São Paulo, separata da Revista da PUCSP, vol. XXXV, 1968, p. 99 -, louvando-se em São Tomás de Aquino, enfatiza que no direito natural objetivo, “direito” significa “justo” e “natural” tem o sentido de fundado na própria natureza moral da “coisa”.

Acrescenta que “coisa”, significa “quaisquer objetos, matérias, conteúdos ou resultados da conduta ou do comportamento humano justos”.

A partir da idéia de que consiste “numa espécie de igualdade”, Aristóteles distingue duas formas de justiça:

1) – “justiça distributiva”, que compete ao legislador “na distribuição de encargos, direitos, honrarias e bens entre os membros da comunidade, de acordo com o principio da igualdade proporcional”; e

2) – “justiça corretiva”, na pessoa do Juiz, já que “cabe à Justiça garantir, proteger e manter essa distribuição contra os ataques ilegais e restabelecer o equilíbrio distributivo quando perturbado”.

Considerando a forma de “justiça corretiva” preconizada por Aristóteles, é que o autor, através da presente Ação, vem requerer ao D. Julgador, o restabelecimento do equilíbrio distributivo perturbado por uma simples Portaria do novo Sr. Ministro da Justiça.

Tendo em vista que essa forma de justiça encontra ressonância no escopo da “restitutione in integrum do direito romano, e se afina perfeitamente com o Estado de Direito.

Estado de Direito que, segundo o magistrado Sérgio Nojiri, em sua obra – O Dever de Fundamentar as Decisões Judiciais, 2ª ed., São Paulo, RT, 2000, p. 41/42:

é aquele que se subordina à lei ou como aquele em que o Estado se curva diante do direito que ele próprio criou”.

E acrescenta que é preciso observar, principalmente:

a influencia que ele exerce e sobre ele é exercida pelos princípios da supremacia da Constituição, da separação dos poderes, da legalidade e dos direitos do homem.”

Parafraseando José Rogério Cruz e Tucci, em sua obra – A Motivação da Sentença no Processo Civil, Saraiva, São Paulo, 1987, p. 139:

o ato decisório privado da devida motivação estará intrinsecamente viciado e, portanto, nulo”.

Justamente o que faltou ao ato do novo Sr. Ministro da Justiça, a Portaria nº 594/MJ, de 2004:

(…) a devida motivação e a fundamentação; já que foram desconstituídas pela D. AGU, em seu Parecer nº AGU/JD-01/2006.

Por analogia, acrescente-se que o próprio Supremo Tribunal Federal, em seu Regimento Interno, firma até, que nem os votos assentados pelos ex-ministros daquela Corte Suprema, podem ser modificados pelos novos ministros que os substituíram. No presente caso, está-se a ver que o novo Ministro da Justiça, revogou o que já julgado, decidido e referendado pelo anterior Ministro da Pasta nos termos da CF-88 e da Lei, anulando atos jurídicos perfeitos e retirando direitos adquiridos, por LEITURA EQUIVOCADA de uma Nota da D. AGU.

O Egrégio Supremo Tribunal Federal, na ADI nº 3206-2, Distrito Federal, Tribunal Pleno, 14/04/2005, Relator Ministro Marco Aurélio, extraído da página da Internet daquela Egrégia Corte:

“Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade, em julgar procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade da Port. nº 160, de 13 de abril de 2004, do Ministro de Estado do Trabalho e Emprego.

Brasília, 14 de abril de 2005.

NELSON JOBIM – PRESIDENTE

MARCO AURELIO – RELATOR.

VOTO

O SENHOR MINISTRO MARCO AURELIO

O ato atacado conta com autonomia suficiente a desafiar o controle concentrado de constitucionalidade. Disciplina as contribuições criadas em assembléia geral da categoria, fazendo referencia não só à confederativa, prevista no art. 8º, inciso IV, da Constituição Federal como a assistencial, versada na alínea “e”, do art. 513 da Consolidação das Leis do trabalho (…).

Nota-se abrangência normativa que suplanta, em si, os parâmetros do ato atacado na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.088-3, do Piauí, relatada pelo Ministro Francisco Rezek, quando a Corte mesmo assim concluiu pela admissibilidade, dizendo do cabimento do controle concentrado de constitucionalidade, chegando no julgamento de fundo, a declarar conflitante com a Carta da Republica, ato de tribunal que, mediante idêntico instrumento, ou seja, portaria, importara na exigência, para o desconto, da concordância do servidor .

… No mais, não se está diante de ato do Ministro do Trabalho e Emprego, voltado ao serviço público, à orientação de seus subordinados. Extravasa a Portaria nº 160 os parâmetros próprios a ter-se o que se espera de autoridade de nível inferior à Chefia do Executivo: a transmissão, a subordinados, de decisões de efeito interno, relacionadas com as atividades do Ministério. A competência dos Ministros de Estado de expedir instruções para a execução de leis, decretos e regulamentos, há de ser tomada de forma estrita, direcionada ao funcionamento em si do Ministério. Atente-se para a abrangência da portaria. Alcança a um só tempo (…) introduzindo práticas a serem observadas (…).

(…) Salta aos olhos a impropriedade. De qualquer forma, descabe reconhecer ao Ministro alçada para definir a espécie de instrumento próprio à previsão de contribuição (…). Sem duvida alguma aditou-se a Consolidação das Leis do Trabalho, invadindo-se campo reservado ao legislador.

… A analise feita, cotejando-se a portaria com a Consolidação das Leis do Trabalho, tem objetivo único, ou seja, demonstrar o extravasamento do campo reservado constitucionalmente ao Ministro de Estado, relativamente às portarias. O que cumpre perquirir é que se adentrou área da normatização abstrata e autônoma, o que, a todos os títulos, mostra-se vedada.

Consigno mais, que em 1º de dezembro de 2004, o Senado da República aprovou decreto legislativo, cujo projeto, de nº 1.125 e de iniciativa do senador Paulo Paim, foi subscrito por todos os lideres partidários com o seguinte teor:

“Art. 1º Fica sustada a Portaria nº 160, de 13 de abril de 2004, do Ministro de Estado do Trabalho e Emprego, que “dispõe sobre o desconto em folha (…)”.”

Julgo procedente o pedido formulado para, ante o vicio formal, declarar a inconstitucionalidade da Portaria nº 160, de 13 de abril de 2004, do Ministro do Trabalho e Emprego.”

Entendemos, s.m.j., que a Portaria nº 1.104/GM3, de 1964, do Sr Ministro da Aeronáutica, pelos mesmos motivos assentados pelo E. STF na ADI acima transcrita, também era inconstitucional, enquanto perdurou sua vigência, e, s.m.j., entendemos que também é inconstitucional a Portaria nº 594, de 2004, do Ministério da Justiça, pelos mesmos motivos .

Pois, se a prevalecer a Portaria nº 594, de 2004, do Ministério da Justiça, que reflete a nova interpretação das normas legais da anistia e que passou a orientar o novo entendimento da nova Comissão de Anistia, restaria configurado que:

TODOS PRAÇAS;

DA MESMA FORÇA ARMADA ( FAB );

DA MESMA GRADUAÇÃO ( CABOS );

COM O MESMO TEMPO DE SERVIÇO ( 08 ANOS );

ATINGIDOS PELO MESMO ATO DE EXCEÇÃO DE NATUREZA EXCLUSIVAMENTE POLITICA ( PORTARIA Nº 1.104 );

TODOS IMPEDIDOS DE CONTINUAREM A EXERCER AS SUAS ATIVIDADES REMUNERADAS;

TODOS DESLIGADOS, LICENCIADOS E EXCLUIDOS DA MESMA FORÇA.

uns sendo anistiados e outros não! Estar-se-ia criando uma “casta” de anistiados, “privilegiados”, em detrimento de outros iguais, em virtude da nova interpretação do novo Sr. Ministro da Justiça.

Entende o autor que, aonde o legislador – tanto o constituinte quanto o ordinário, não restringiu, descabe ao interprete, restringir.

Este é o principio que norteia a legalidade e a segurança jurídica.

E, no caso concreto, ao contrário – dos que passaram a interpretar indevidamente as normas da anistia – o legislador ordinário, nas duas Casas do Parlamento, ao elaborarem as normas de sua exclusiva competência, já firmavam que a anistia era devida a todos os atingidos pela Portaria nº 1.104/GM3, de 1964, independentemente de haverem incorporado na Aeronáutica sob a vigência das Portarias nº 570/54 ou 1.104/64.

A anistia foi exatamente concedida de forma ampla, geral e irrestrita, para igualar os desiguais, que foram assim considerados pelas mesmas autoridades que à época detinham o poder; mas não agora, em plena democracia, extrapolando-se competências e invadindo-se área reservada exclusivamente ao Poder Legislativo, principalmente no caso especifico de anistia política, a qual – nos termos Constitucionais, é da alçada exclusiva do Congresso Nacional. Ferindo-se deste modo o principio da reserva de lei.

Tem-se afirmado no tempo – pelos que estudam a ciência do Direito, que o Julgador deve se ater ao “espírito” da lei . Mas como se deve interpretar esse “espírito” da Lei? No entender do autor, s.m.j., ele se encontra na intenção do legislador! Ao ser elaborada a Lei, o que com ela se pretendia realizar; o que o legislador desejava normatizar; qual o fim a ser alcançado com este meio legal; o que se almejava ver concretizado!

Este “espírito” se revela quando se volta no tempo e se alcança a discussão legislativa que consagrou a norma legal. Naquele momento histórico o “espírito” da Lei se revela e o Julgador o alcança e o entende.

No caso concreto, o que desejavam os legisladores constituintes ao declararem a Anistia Política?

Para alcançar, à época, o espírito constitucional, temos as Emendas apresentadas ao Projeto pelas Comissões Especializadas da Assembléia Nacional Constituinte, a condução do Relator e a promulgação da Carta Magna, contendo em seu estofo jurídico maior, a anistia!

Continua…

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Por Jeová Pedrosa Franco

Cabo – vítima da Portaria 1.104GM3/64

e-mail jeova.franco@yahoo.com.br

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Postado por Gilvan Vanderlei

Cabo – vítima da Portaria 1.104GM3/64

e-mail gvlima@terra.com.br