No último dia (27/10) na Primeira Seção do STJ, a Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, nos autos do MS 27.921-DF, em decisão liminar restaurou a anistia política, post mortem, do ex-Cabo da FAB – ORLANDO DOS SANTOS NEVES.
DECISÃO: (…) Ante o exposto, ressalvando meu entendimento quanto à alegada nulidade da Notificação para defesa, mas em homenagem ao entendimento majoritário da Primeira Seção do STJ, nos termos do art. 34, XIX, do RISTJ, concedo a segurança, para anular a Notificação 747/2020/DGTI/CCP/CGP/CA e demais atos posteriores, inclusive a Portaria 1.096, de 24/03/2021. Prejudicado o Agravo interno de fls. 89/121e. (…)
★ – A Portaria ANULADORA da anistia de ORLANDO DOS SANTOS NEVES, post mortem, referenciada nos autos do MS 27.921-DF que foi publicada no D.O.U. nº 57, Seção 1, da quinta-feira, dia 25 de março de 2021, Página 145. veja abaixo:
PORTARIA Nº 1.096, DE 24 DE MARÇO DE 2021
A MINISTRA DE ESTADO DA MULHER, DA FAMÍLIA E DOS DIREITOS HUMANOS, no uso de suas atribuições legais, com fulcro no artigo 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal de 1988, regulamentado pela Lei nº 10.559, de 13 de novembro de 2002, e na Portaria nº 3.076, de 16 de dezembro de 2019, com fundamento na Nota Técnica nº 330/2021/DFAB/CGGA/CA/MMFDH, de 12 de março de 2021, no Requerimento de Anistia nº 2002.01.06278, resolve: Art. 1º Fica anulada a Portaria nº 781, de 3 de junho de 2003 do Ministro de Estado da Justiça, publicada no Diário Oficial da União de 4 de junho de 2003, que declarou anistiado político ORLANDO DOS SANTOS NEVES post mortem, filho de DELTA DOS SANTOS NEVES, e os demais atos dela decorrentes, ante a ausência de comprovação da existência de perseguição exclusivamente política no ato concessivo. Art. 2º É assegurada a não devolução das verbas indenizatórias já recebidas. Art. 3º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.
DAMARES REGINA ALVES
★ – A Portaria ANISTIADORA do ex-Cabo da FAB (Pré64) ORLANDO DOS SANTOS NEVES referenciada nos autos do MS 27.921-DF que foi publicada no D.O.U. nº106, Seção 1, da quarta-feira, dia 4 de junho de 2003, Página 33. veja abaixo:
PORTARIA No 781, DE 3 DE JUNHO DE 2003
O MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA, no uso de suas atribuições legais, com fulcro no artigo 10 da Lei no 10.559, de 13 de novembro de 2002, publicada no Diário Oficial de 14 de novembro de 2002 e considerando o resultado do julgamento proferido pela Terceira Câmara da Comissão de Anistia, na sessão realizada no dia 16 de abril de 2003, no Requerimento de Anistia no 2002.01.06278, resolve: Declarar ORLANDO DOS SANTOS NEVES, anistiado político, reconhecendo a contagem de tempo de serviço, para todos os efeitos, até a idade limite de permanência na ativa, assegurando as promoções à graduação de Suboficial com os proventos do posto de Segundo-Tenente e as respectivas vantagens, concedendo-lhe reparação econômica em prestação mensal, permanente e continuada no valor de R$ 3.712,50 (três mil, setecentos e doze reais e cinqüenta centavos), com efeitos financeiros retroativos a partir de 08.04.1997 até a data do julgamento em 16.04.2003, totalizando 72 (setenta e dois) meses e 09 (nove) dias, perfazendo um total de R$ 268.413,75 (duzentos e sessenta e oito mil, quatrocentos e treze reais e setenta e cinco centavos), nos termos do artigo 1o, incisos I, II e III, da Lei no 10.559 de 14 de novembro de 2002.
MÁRCIO THOMAZ BASTOS
Superior Tribunal de Justiça
MANDADO DE SEGURANÇA Nº 27921 – DF (2021/0219109-9)
RELATORA : MINISTRA ASSUSETE MAGALHÃES
IMPETRANTE : RITA BARBOSA DE ARAUJO DE PONTES
ADVOGADO : WASHINGTON LUIZ PINTO MACHADO – RJ057731
IMPETRADO : MINISTRO DA MULHER, DA FAMILIA E DOS DIREITOS HUMANOS
INTERES. : UNIÃO
DECISÃO
Trata-se de Mandado de Segurança, com pedido de liminar, impetrado por RITA BARBOSA DE ARAÚJO PONTES, em face de suposto ato ilegal da MINISTRA DA MULHER, DA FAMÍLIA E DOS DIREITOS HUMANOS, consubstanciado na Portaria 1.096, de 24/03/2021 (fl. 36e), que anulou a Portaria 781, de 03/06/2003, que declarara o falecido marido da impetrante anistiado político, ante a ausência de comprovação da existência de perseguição exclusivamente política no ato concessivo.
Sustenta o impetrante, na inicial, "a notificação expedida à beneficiária da anistia política traz conteúdo, impreciso e vago, inviabilizando a possibilidade de eficiente apresentação de argumentos em defesa dos interesses da parte impetrante, contrariando, inclusive, a orientação da Suprema Corte no Tema 839. Após extenso debate, a E. Primeira Seção desta Corte firmou o entendimento no sentido de que a notificação sem as especificações do art. 26, § 1º, VI, da Lei n. 9.784/99, relativamente os fatos e fundamentos de que deveria se defender o administrado, ante a anunciada possibilidade de perda do estatuto de anistiado político, resulta inequívoco vício de forma. Concluiu-se também, que a forma como realizada a notificação dos interessados tornou 'comprometida a amplitude do exercício do contraditório e da ampla defesa'. Assim, cabe à administração proporcionar o amplo direito do exercício de ampla defesa, inclusive com 'motivação, mediante exposição clara, explícita e congruente, das razões de fato e de direito que justificam' a recusa na produção de provas no âmbito administrativo, consoante previsão do art. 50, inciso I e § 1º, da Lei n. 9.784/1999" (fls. 4/5e).
Alega, ainda, existência de litispendência, ofensa ao princípio do non bis idem, ocorrência de prescrição, violação ao princípio da segurança jurídica, nulidade absoluta do ato administrativo, por ausência dos requisitos de validade, inexistência de julgamento colegiado da Comissão de Anistia, existência de coisa julgada e ato jurídico perfeito, bem como o recebimento de boa-fé dos valores pela impetrante.
Requer, por fim, "que seja deferida a medida liminar para determinar a suspensão dos efeitos da decisão que cassou a portaria anistiadora do impetrante; b – que seja concedida a ordem neste 'mandamus' para decretar a nulidade do ato impugnado; (…) e – que seja deferida a medida liminar para determinar a suspensão da portaria 1.096 de 24 março de 2021 que anulou a portaria 781 de 03 de Junho de 2003 e consequentemente a reinclusão na folha de pagamento do beneficio de prestações mensais, permanentes e continuadas" (fl. 30e).
O pedido de justiça gratuita foi deferido pelo Presidente do STJ, a fl. 40e, sendo que, a fls. 45/46e, diante da ausência dos requisitos autorizadores da tutela de urgência, indeferiu o pedido de liminar, sem prejuízo de ulterior deliberação pelo relator.
A União, a fls. 50/51e, manifesta o seu interesse na causa.
A fls. 53/59e, a impetrante formula pedido de reconsideração do decisum de fls. 45/46e, que indeferiu o pedido de liminar, eis que, repisando argumentos anteriores, "já existe diversos julgados reconhecendo a nulidade das notificações, por apresentarem irregularidades e por serem omissas" (fl. 58e).
Informações da autoridade impetrada, a fls. 60/75e, em que alega a ausência de direito líquido e certo e a regularidade da Portaria 3.076/2019, da notificação encaminhada à impetrante e da portaria de anulação da anistia.
A fl. 73, encontra-se a Notificação 747/2020/DGTI/CCP/CGP/CA, referente ao Processo 2002.01.06278, constando como interessado: Orlando dos Santos Neves, e como destinatária: Rita Barbosa de A de Pontes.
A fls. 81/86e, foi deferida a medida liminar, para "restabelecer o pagamento da prestação mensal, permanente e continuada da parte impetrante, com os efeitos decorrentes, até o julgamento final do presente mandamus", o que ensejou a interposição, pela UNIÃO, do Agravo interno de fls. 89/121e, em que alega, primeiramente, a decadência do direito à impetração.
Impugnação da parte agravada, a fls. 123/131e, pelo improvimento do recurso.
O Ministério Público Federal, a fls. 132/137e, opina pela concessão da ordem, em parecer assim ementado:
"MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. ANISTIA POLÍTICA. REVOGAÇÃO DA CONDIÇÃO DE ANISTIADO. PORTARIA DE REVISÃO. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. INDIVIDUALIZAÇÃO DA CONDUTA. NECESSIDADE. DEVIDO PROCESSO LEGAL. RESPEITO. MÁCULA. VIOLAÇÃO DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. PELA CONCESSÃO DA ORDEM.
I. A portaria de instauração de processo administrativo disciplinar deve conter todos os elementos identificadores acerca da autoria e dos fatos a serem investigados, não sendo suficiente fazer alusão a decisão judicial genérica, sem identificar de que forma o investigado está atrelado aos fatos narrados, sob pena de obstar ao acusado ciência da acusação que lhe está sendo imputada e, de consequência, o exercício do direito de defesa.
II. A Administração Pública deve fornecer à impetrante a possibilidade de se defender materialmente nos autos do procedimento de revisão. A mera abertura de procedimento de revisão, sem identificar a conduta violadora, implica violação a direito líquido e certo do autor-impetrante, de forma a fazer presentes os requisitos à concessão da segurança. III. Parecer pela concessão da ordem" (fl. 132e).
De início, em relação à decadência, esta Corte já se manifestou, em caso idêntico, no sentido de que "ao julgar Mandados de Segurança impetrados contra atos praticados em processos administrativos disciplinares, a Primeira Seção desta Corte firmou entendimento segundo o qual o prazo de decadência é contado a partir da publicação da penalidade no Diário Oficial, admitindo-se a impugnação de atos realizados ao longo de todo o procedimento, como indica o precedente: (…) (MS 20.978/DF, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/10/2016, DJe 01/12/2016). Diante da similitude entre o caso dos autos e a situação descrita no julgado, aplico, por analogia, essa orientação" (STJ, AgInt no MS 27.458/DF, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 22/09/2021). No mesmo sentido: STJ, RMS 44.297/ES, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 23/09/2020.
Assim, o termo inicial do prazo decadencial para impetração de mandado de segurança contra a cassação da anistia da impetrante é a data da publicação, no Diário Oficial, da Portaria que cassou a anistia, oportunidade em que o ato se torna apto a gerar efeitos lesivos à esfera jurídica do interessado.
No caso, a Portaria 1.096, de 24/03/2021, fora publicada no DOU em 25/03/2021 (fl. 36e). A parte impetrante impetrou o presente mandamus em 12/07/2021 (fl. 1e), dentro, portanto, do prazo decadencial de 120 (cento e vinte) dias (art. 23 da Lei 12.016/2009).
No mais, é de se consignar que, nos termos do art. 1º da Lei 12.016/2009 e em conformidade com o art. 5º, LXIX, da Constituição Federal, "conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça".
Nesses termos, a impetração do mandamus deve-se apoiar em incontroverso direito líquido e certo, comprovado desde o momento da impetração.
Na hipótese, o Supremo Tribunal Federal, apreciando o Tema 839 (RE 817.338 RG-DF, Rel. Ministro DIAS TOFFOLI, DJe de 31/07/2020), fixou, sob o regime de repercussão geral, a seguinte tese: "No exercício do seu poder de autotutela, poderá a Administração Pública rever os atos de concessão de anistia a cabos da Aeronáutica com fundamento na Portaria 1.104/1964, quando se comprovar a ausência de ato com motivação exclusivamente política, assegurando-se ao anistiado, em procedimento administrativo, o devido processo legal e a não devolução das verbas já recebidas".
O Relator, por pertinente, fez constar expressamente de seu voto que: "Verifico, assim, que a matéria em questão está inserida na ordem constitucional, sendo, por tal razão, insuscetível de decadência administrativa. De outro lado, o Supremo Tribunal Federal também já assentou em julgados que a Portaria nº 1.104/64, por si, não constitui ato de exceção, sendo necessária a comprovação, caso a caso, da ocorrência de motivação político-ideológica para o ato de exclusão das Forças Armadas e a consequente concessão de anistia política.
(…)
Desse modo, reconheço o poder-dever da administração pública de revisitar seus atos, em procedimento administrativo, com a observância do devido processo legal, como uma manifestação da obrigação de velar pela supremacia constitucional, princípio propulsor do Estado Democrático de Direito.
(…)
Por fim, registro que a revisão das anistias no caso em exame se refere exclusivamente àquelas concedidas aos cabos da Aeronáutica com fundamento na Portaria nº 1.104 editada pelo Ministro de Estado da Aeronáutica em 12 de outubro de 1964".
Com efeito, consoante entendimento consolidado, sob o rito de repercussão geral, pelo STF (Tema 138), "os atos administrativos que repercutem no campo dos interesses individuais dependem de processo administrativo prévio – no qual hão de ser observados os princípios do devido processo, do contraditório e da ampla defesa – para serem anulados" (STJ, AgInt no REsp 1.703.826/TO, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, DJe de 04/05/2020).
Diante desse cenário, no tocante ao fundamento relativo à irregularidade da Notificação para defesa, encaminhada à parte impetrante, não obstante em um primeiro momento a Primeira Seção tenha denegado a segurança, em situações semelhantes – STJ, MS 25.837/DF e MS 25.848/DF, Rel. p/ acórdão Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 29/03/2021 e DJe de 30/03/2021, respectivamente –, esta Corte, em sessão realizada em 14/04/2021, reformulou o posicionamento anterior, para, por maioria de votos – oportunidade em que fiquei vencida –, conceder a segurança, na linha do voto do Ministro SÉRGIO KUKINA, ao entendimento de que, "na espécie, a notificação endereçada ao anistiado não especificou, como de lei (art. 26, § 1º, VI, da Lei n. 9.784/99), os fatos e fundamentos de que deveria o impetrante se defender, ante a anunciada possibilidade de perder seu estatuto de anistiado político, daí resultando inequívoco vício de forma", restando também comprometida "a amplitude do exercício do contraditório e da ampla defesa pelo autor (art. 5º, LV, da CF), notadamente porque o alto grau de generalidade e de abstração de sua notificação lhe subtraiu, pelo
desconhecimento dos fatos e fundamentos ensejadores do procedimento revisional, o acesso às ferramentas de defesa constitucionalmente postas à sua disposição".
Eis a ementa do referido acórdão:
"ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL ADMINISTRATIVO. PROCESSO DE REVISÃO DE ANISTIA DE MILITAR. CABO DA AERONÁUTICA. MANDADO DE SEGURANÇA. ENUNCIADO APROVADO PELO STF EM REGIME DE REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 839. APLICAÇÃO IMEDIATA. DESNECESSIDADE DE PUBLICAÇÃO. NOTIFICAÇÃO GENÉRICA DO ANISTIADO. VÍCIO DE FORMA. PREJUÍZO AO EXERCÍCIO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. NULIDADE RECONHECIDA. ORDEM CONCEDIDA. RESTABELECIMENTO DA CONDIÇÃO DE ANISTIADO.
1. A ausência de publicação do respectivo acórdão não impede a imediata aplicação de enunciado aprovado pelo STF, em regime de repercussão geral. Nesse sentido: RE 1.215.332 AgR, Rel. Ministro LUÍS ROBERTO BARROSO, 1ª Turma, DJe 14/12/2020 e RE 1.129.931 AgR, Rel. Ministro GILMAR MENDES, 2ª Turma, DJe 27/08/2018.
2. Caso concreto em que se discute a validade de ato administrativo ministerial que determinou a anulação de anterior portaria, por meio da qual se havia declarado a condição de anistiado político do ora impetrante, excabo da Aeronáutica.
3. Ao apreciar o Tema 839, com repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal aprovou o seguinte enunciado: 'No exercício do seu poder de autotutela, poderá a Administração Pública rever os atos de concessão de anistia a cabos da Aeronáutica com fundamento na Portaria nº 1.104/1964,
quando se comprovar a ausência de ato com motivação exclusivamente política, assegurando-se ao anistiado, em procedimento administrativo, o devido processo legal e a não devolução das verbas já recebidas'.
4. Como explica CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO, 'Nos procedimentos administrativos, os atos previstos como anteriores são condições indispensáveis à produção dos subsequentes, de tal modo que estes últimos não podem validamente ser expedidos sem antes completar-se a fase precedente. Além disto, o vício jurídico de um ato anterior contamina o posterior, na medida em que haja entre ambos um relacionamento lógico incindível' (Curso de direito administrativo. 30 ed. São Paulo: Malheiros, 2013, p. 453).
5. Na espécie, a notificação endereçada ao anistiado não especificou, como de lei (art. 26, § 1º, VI, da Lei n. 9.784/99), os fatos e fundamentos de que deveria o impetrante se defender, ante a anunciada possibilidade de perder seu estatuto de anistiado político, daí resultando inequívoco vício de forma.
6. Em indissociável desdobramento, restou também comprometida a amplitude do exercício do contraditório e da ampla defesa pelo autor (art. 5º, LV, da CF), notadamente porque o alto grau de generalidade e de abstração de sua notificação lhe subtraiu, pelo desconhecimento dos fatos e fundamentos ensejadores do procedimento revisional, o acesso às ferramentas de defesa constitucionalmente postas à sua disposição. Assiste-lhe razão, pois, quando diz ter sido chamado a fazer uma defesa 'às cegas'.
Não poderia ter se defendido eficazmente do oculto, do encoberto, do que não se deu a conhecer.
7. A tal propósito, conforme ensinamento de THIAGO MARRARA, 'O contraditório é a premissa da defesa, daí porque andam inexoravelmente juntos. Não há reação ao desconhecido; não há, pois, defesa possível sem conhecimento do objeto processual, suas causas, elementos probatórios nem dos motivos a sustentar as decisões liminares ou finais. O contraditório enseja a divulgação, ativa ou a pedido, dos elementos que estimulam, inspiram e motivam as decisões, garantindo-se aos sujeitos por ela potencialmente afetados a faculdade de reações formais. Essa divulgação há de ser garantida, em situação extrema, mesmo em prejuízo do sigilo ou da restrição de acesso a informações sensíveis. Não por outra razão, a Lei de Acesso à Informação adequadamente prescreve que: 'não poderá ser negado acesso à informação necessária à tutela judicial ou administrativa de direitos fundamentais' (art. 21, caput)' (Princípios do Processo Administrativo.
In Processo administrativo brasileiro – estudos em homenagem aos 20 anos da lei federal de processo administrativo. Belo Horizonte: Fórum, 2020, p. 89-90).
8. Ordem concedida, com o pleno e imediato restabelecimento do estatuto de anistiado político do ora impetrante" (STJ, MS 26.323/DF, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 25/05/2021).
Nesse mesmo sentido: STJ, MS 26.393/DF, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 25/05/2021; MS 26.439/DF, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 25/05/2021; MS 26.577/DF, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 25/05/2021; MS 26.553/DF, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 25/05/2021; MS 26.809/DF, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 25/05/2021.
Confira-se, ainda:
“ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO DE REVISÃO DA PORTARIA CONCESSIVA DE ANISTIA A MILITAR, EX-CABO DA AERONÁUTICA. PORTARIA 1.104/GM-3/1964. ENTENDIMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, FIRMADO SOB O REGIME DE REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 839. RE 817.338/DF. APLICAÇÃO IMEDIATA. DESNECESSIDADE DE PUBLICAÇÃO. PORTARIA 3.076/2019. ALEGAÇÃO DE NOTIFICAÇÃO GENÉRICA DO ANISTIADO PARA APRESENTAÇÃO DE DEFESA. VÍCIO DE FORMA. OFENSA AO EXERCÍCIO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. NULIDADE RECONHECIDA. PRECEDENTES DA PRIMEIRA SEÇÃO. ORDEM CONCEDIDA. AGRAVO INTERNO PREJUDICADO.
I. Trata-se de Mandado de Segurança, impetrado por beneficiário de anistia política, concedida nos termos da Lei 10.559/2002, em face de ato da Ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, consubstanciado na Portaria 1.572, de 05/06/2020, que anulou a Portaria 1.481, de 04/06/2004, que declarara o impetrante anistiado político, ante a ausência de comprovação, no ato concessivo do benefício, da existência de perseguição exclusivamente política.
II. Em consulta ao sítio eletrônico do STF, em 16/10/2019 já era possível verificar, no andamento do RE 817.338/DF, o resultado do seu julgamento de mérito, sob o rito de repercussão geral, no qual o Supremo Tribunal Federal, apreciando o Tema 839 (RE 817.338 RG-DF, Rel. Ministro DIAS TOFFOLI, DJe de 31/07/2020), fixou a seguinte tese: 'No exercício do seu poder de autotutela, poderá a Administração Pública rever os atos de concessão de anistia a cabos da Aeronáutica com fundamento na Portaria 1.104/1964, quando se comprovar a ausência de ato com motivação exclusivamente política, assegurando-se ao anistiado, em procedimento administrativo, o devido processo legal e a não devolução das verbas já recebidas'. Assim, não se verifica qualquer empecilho a que fosse deflagrado o devido processo administrativo de revisão de anistia concedida a cabos da Aeronáutica com fundamento na Portaria 1.104/1964 – como ocorre, na espécie -, mesmo antes da publicação do aludido acórdão do STF.
III. Com o aval do STF, promoveu-se a revisão dos procedimentos de anistia – ou seja, daqueles processos de anistias concedidas com fundamento na Portaria 1.104/GM-3/1964, que já haviam sido instaurados pela Comissão de Anistia, ainda quando vinculada ao Ministério da Justiça -, culminando com a edição da Portaria 3.076, de 16/12/2019, da Ministra de Estado da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, quando os ex-cabos da Aeronáutica passaram a ser notificados a respeito da instauração de procedimento de revisão de anistia, concedida com fundamento na Portaria 1.104/GM-3/1964, do Ministério da Aeronáutica, concedendo-lhes o prazo de 10 (dez) dias para apresentação de defesa.
IV. Em um primeiro momento, a Primeira Seção do STJ denegou a segurança, em casos como o presente, eis que, ante a 'ausência de demonstração de direito líquido e certo, não é possível reconhecer eventual:
I) nulidade da decisão administrativa que determinou a revisão da anistia; II) nulidade da revisão da anistia pela violação do direito de contraditório e ampla defesa' (STJ, MS 25.837/DF e MS 25.848/DF, Rel. p/ acórdão Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 29/03/2021 e DJe de 30/03/2021, respectivamente).
V. Contudo, reformulando o posicionamento anterior, a Primeira Seção do STJ, por maioria de votos, na sessão de 14/04/2021 – oportunidade em que fiquei vencida -, concedeu a segurança, em Mandados de Segurança semelhantes, na linha do voto do Ministro SÉRGIO KUKINA, ao entendimento de que, 'na espécie, a notificação endereçada ao anistiado não especificou, como de lei (art. 26, § 1º,
VI, da Lei n. 9.784/99), os fatos e fundamentos de que deveria o impetrante se defender, ante a anunciada possibilidade de perder seu estatuto de anistiado político, daí resultando inequívoco vício de forma', restando também comprometida 'a amplitude do exercício do contraditório e da ampla defesa pelo autor (art. 5º, LV, da CF), notadamente porque o alto grau de generalidade e de abstração de sua notificação lhe subtraiu, pelo desconhecimento dos fatos e fundamentos ensejadores do procedimento revisional, o acesso às ferramentas de defesa constitucionalmente postas à sua disposição' (STJ, MS 26.323/DF, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 25/05/2021). Nesse mesmo sentido: STJ, MS 26.393/DF, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 25/05/2021; MS 26.439/DF, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 25/05/2021; MS 26.577/DF, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 25/05/2021; MS 26.553/DF, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 25/05/2021; MS 26.809/DF, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 25/05/2021.
VI. Ordem concedida, para anular a Notificação 728/2019/DGTI/CCP/CGP/CA e demais atos posteriores, inclusive a Portaria 1.572, de 05/06/2020, restando prejudicado o Agravo interno, interposto contra o indeferimento da medida liminar. Ressalva de entendimento, quanto à alegada nulidade da Notificação para defesa” (STJ, MS 26.491/DF, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 29/06/2021).
Na mesma linha, outros julgados: STJ, MS 27.601/DF, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 29/06/2021; MS 26.431/DF, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 29/06/2021; MS 26.313/DF, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 29/06/2021; MS 26.146/DF, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 29/06/2021; MS 25.797/DF, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 29/06/2021.
Sendo assim, ante à irregularidade da Notificação para defesa, encaminhada à parte impetrante (fl. 73e), verifica-se, por si só, fundamento suficiente para a concessão da segurança, restando prejudicadas as demais questões levantadas na exordial.
Vale destacar, no tópico, que, na assentada de 09/06/2020, a Primeira Seção do STJ, à unanimidade – com ressalva do entendimento dos Ministros MAURO CAMPBELL MARQUES, ASSUSETE MAGALHÃES e REGINA HELENA COSTA –, na linha dos votos-vista do Ministro OG FERNANDES, proferidos nos Mandados de Segurança 26.500/DF, 26.706/DF, 26.359/DF, 26.406/DF e 26.408/DF (Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Rel. p/acórdão Ministro OG FERNANDES, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 01/07/2021), concedeu a segurança, apenas pela irregularidade da notificação da parte impetrante, deixando, assim, de apreciar as demais questões suscitadas nos respectivos mandamus.
Ante o exposto, ressalvando meu entendimento quanto à alegada nulidade da Notificação para defesa, mas em homenagem ao entendimento majoritário da Primeira Seção do STJ, nos termos do art. 34, XIX, do RISTJ, concedo a segurança, para anular a Notificação 747/2020/DGTI/CCP/CGP/CA e demais atos posteriores, inclusive a Portaria 1.096, de 24/03/2021. Prejudicado o Agravo interno de fls. 89/121e.
Custas ex lege.
Sem honorários advocatícios, na forma do art. 25 da Lei 12.016/2009 e da Súmula 105/STJ.
Oficie-se a autoridade coatora, com urgência, na forma do art. 13 da Lei 12.016/2009.
I.
Brasília, 27 de outubro de 2021.
Ministra ASSUSETE MAGALHÃES
Relatora
Ministra Assusete Magalhães do STJ.
Para ler ou baixar o Inteiro teor (original) da Decisão Monocrática da Ministra Assusete Magalhães, da Primeira Seção do STJ, nos autos do MS 27.921/DF. Clique Aqui.
Detalhes Fases Decisões Petições Pautas
MS 27921(2021/0219109-9 – 03/11/2021)
Decisão Monocrática – Ministra ASSUSETE MAGALHÃES
RCD no MS 27921(2021/0219109-9 – 16/08/2021)
Decisão Monocrática – Ministra ASSUSETE MAGALHÃES
MS 27921(2021/0219109-9 – 16/07/2021)
Decisão Monocrática – Ministro HUMBERTO MARTINS
MS 27921(2021/0219109-9 – 14/07/2021)
Decisão Monocrática – Ministro HUMBERTO MARTINS
Postado por Gilvan VANDERLEI
Ex-Cabo da FAB – Atingido pela Portaria 1.104GM3/64
E-mail gvlima@terra.com.br
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