Liminar concedida no STJ pela Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, nos autos do MS 26.670-DF, ao ex-Cabo da FAB – JACKSON FABIO DOS SANTOS, que teve sua anistia política anulada pelo MMFDH em 05/06/2020.
LIMINAR X – Liminar concedida no STJ pela Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, nos autos do MS 26.670-DF, ao ex-Cabo da FAB – JACKSON FABIO DOS SANTOS, que teve sua anistia política anulada pelo MMFDH em 05/06/2020.
– A Portaria anistiadora referenciada nos autos do MS 26.670-DF foi publicada no D.O.U. nº 87, Seção 1, da sexta-feira, dia 7 de maio de 2004, Página 26. veja abaixo:
PORTARIA No 1.256, DE 5 DE MAIO DE 2004
O MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA, no uso de suas atribuições legais, com fulcro no artigo 10 da Lei nº. 10.559, de 13 de novembro de 2002, publicada no Diário Oficial de 14 de novembro de 2002 e considerando o resultado do julgamento proferido pela Terceira Câmara da Comissão de Anistia na sessão realizada no dia 12 de fevereiro de 2004, no Requerimento de Anistia n° 2003.01.27803, resolve: Declarar JACKSON FABIO DOS SANTOS anistiado político, reconhecendo a contagem de tempo de serviço, para todos os efeitos, até a idade limite de permanência na ativa, assegurando as promoções à graduação de Segundo-Sargento com os proventos da graduação de Primeiro-Sargento e as respectivas vantagens, concedendo-lhe reparação econômica em prestação mensal, permanente e continuada no valor de R$ 2.651,67 (dois mil, seiscentos e cinqüenta e um reais e sessenta e sete centavos), com efeitos financeiros retroativos a partir de 19.08.1998 até a data do julgamento em 12.02.2004, totalizando 65 (sessenta e cinco) meses e 24 (vinte e quatro) dias, perfazendo um total de R$ 174.479,89 (cento e setenta e quatro mil, quatrocentos e setenta e nove reais e oitenta e nove centavos), nos termos do artigo 1°, incisos I, II e III, da Lei n.º 10.559 de 14 de novembro de 2002. MÁRCIO THOMAZ BASTOS
Superior Tribunal de Justiça
EDcl no MANDADO DE SEGURANÇA Nº 26670 – DF (2020/0192858-0)
RELATORA: MINISTRA ASSUSETE MAGALHÃES
EMBARGANTE: JACKSON FABIO DOS SANTOS
ADVOGADOS: DANIEL FERNANDES MACHADO – DF016252
GUSTAVO HENRIQUE LINHARES DIAS – DF018257
MARCELO PIRES TORREÃO – DF019848
SERGIO DE BRITO YANAGUI – DF035105
ISABEL IZAGUIRRE ZAMBOTTI DORIA – DF049682
ANDERSON ROCHA LUNA DA COSTA – DF048548
EMBARGADO: UNIÃO
IMPETRADO: MINISTRO DA MULHER, DA FAMILIA E DOS DIREITOS HUMANOS
DECISÃO
Trata-se de Embargos Declaratórios, opostos por JACKSON FABIO DOS SANTOS, em 25/08/2020, a decisão de minha lavra, assim fundamentada:
"Trata-se de Mandado de Segurança, com pedido de liminar, impetrado por JACKSON FÁBIO DOS SANTOS, em face de suposto ato ilegal da MINISTRA DA MULHER, DA FAMÍLIA E DOS DIREITOS HUMANOS, consubstanciado na Portaria 1.524, de 05/06/2020 (fl. 50e), que anulou a Portaria 1.256, de 07/05/2004, que declarara o impetrante anistiado político, ante a ausência de comprovação da existência de perseguição exclusivamente política no ato concessivo.
Para tanto, alega que:
"O Impetrante, ex-cabo da Aeronáutica, foi declarado anistiado político, com base em portaria editada pelo Ministro de Estado da Justiça (doc. 3).
Desde então, o Impetrante recebe mensalmente a reparação econômica na forma de prestação mensal, permanente e continuada.
Em 16/12/2019, a Ministra de Estado da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, publicou a Portaria n.º 3.076 (doc. 4), por meio da qual determinou a realização de procedimentos de revisão de anistias.
Em seguida, foi enviada uma notificação genérica (doc. 5) para apresentação de defesa pelo anistiado (doc. 6) no prazo de 10 (dez) dias.
Então, o respectivo Ministério editou uma Nota Técnica (doc. 7) e, ato contínuo, foi publicado no Diário Oficial da União o ato administrativo que anulou a anistia do Impetrante:
(…)
Esse é o ato coator contra o qual se impetra este mandado de segurança. Conforme será demonstrado, a Impetrada violou o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa, em desconformidade com o julgamento do Supremo Tribunal Federal no RE 817.338 (Tese 839 da Repercussão Geral).
(…)
Para anular a anistia do Impetrante, a Ministra de Estado da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos fundamentou-se no julgamento do Recurso Extraordinário 817.338, realizado pelo Supremo Tribunal Federal.
(…)
Inicialmente, destaca-se que o Impetrante foi intimado para apresentar defesa em um processo administrativo genérico de revisão, sem saber as razões pelas quais a Autoridade Coatora pretendia anular sua anistia política (doc. 5).
(…)
O ato administrativo de intimação para defesa possui conteúdo abstrato, pois não traz qualquer elemento de acusação, prova, fundamentação ou motivação que pudesse afastar a condição de anistiado político do Impetrante.
O Impetrante não foi notificado sobre qualquer fato concreto que houvesse sido levantado contra sua condição de anistiado.
Enfim, o Impetrante foi simplesmente notificado para apresentar defesa, sem saber exatamente de que deveria se defender.
Ademais, no curso do processo, o Impetrante foi cerceado em seu direito de defesa, uma vez que foram negados os pedidos de produção de prova (doc. 6), inclusive quanto ao depoimento pessoal e à oitiva de testemunhas.
(…)
Dessa forma, a Autoridade Coatora anulou a anistia política do Impetrante sem atender ao requerimento de produção de provas formulado expressamente na Defesa Administrativa do anistiado (doc. 6), em clara violação ao art. 2º, parágrafo único, X, e ao art. 38, caput, §§ 1º e 2º, todos da Lei n.º 9.784/99:
(…)
Portanto, ao proibir a produção de provas, o ato da Administração Pública incide em gravíssima violação ao adequado direito de defesa do Administrado.
No julgamento do Recurso Extraordinário 817.338 (Tese 839 da Repercussão Geral), o Supremo Tribunal Federal tomou todas as cautelas para garantir que o processo de anulação das anistias políticas dos ex-cabos observasse o contraditório, a ampla defesa e o devido processo legal.
(…)
De fato, a supressão de direitos e bens do particular sem esses elementos viola frontalmente as garantias do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa (art. 5º, LIV e LV, da CRFB/1988; art. 7º do CPC/2015; art. 2, caput, da Lei n.º 9.784/99), bem como constituem grave ofensa aos princípios da motivação e da publicidade dos atos administrativos (art. 37, caput, CRFB/1988; art. 2º, parágrafo único, VII, VIII e IX, art. 26, § 1º, VI e art. 50, I e VIII, e § 1º, da Lei n.º 9.784/99). Vale transcrever esses dispositivos a seguir:
(…)
A realização desses princípios e garantias exige a exposição pública e clara dos pressupostos de fato e de direito que fundamentaram a notificação do Administrado e a prolação do ato de anulação da anistia.
A garantia constitucional da presunção de inocência (art. 5º, LVII, CRFB/1988) é direito indissociável da relação entre Poder Público e indivíduo no modelo do Estado Democrático de Direito e deve reger todas as medidas adotadas pelo poder estatal que vise à supressão de garantias constitucionais.
(…)
O ato concreto de anulação da anistia política do Impetrante demonstra que a imputação do ônus da prova à Administração Pública, determinada pela Tese 839 da Repercussão Geral, foi frontalmente violada pela Impetrada, em razão da absoluta omissão administrativa em comprovar a ausência de ato com motivação exclusivamente política capaz de justificar a anulação no caso concreto.
(…)
Logo, a omissão da Autoridade Coatora quanto à falta de fundamentação do ato de anulação da anistia política do Impetrante importou grave violação tanto à Tese do Tema 839 da Repercussão Geral quanto aos princípios constitucionais do contraditório, da ampla defesa, do devido processo legal e da presunção de inocência.
Ainda que se considerasse a obrigação do Impetrante de provar sua condição de anistiado político, mesmo assim, a Impetrada cerceou o direito de defesa do Impetrante e não autorizou a produção das provas necessárias à demonstração do seu direito.
(…)
prevista no art. 7º, inciso III, da Lei nº 12.016/2009, é medida urgente e necessária.
No que tange à probabilidade do direito, é importante destacar, de pronto, que o RE 817.338 ainda não transitou em julgado e, como ainda cabem recursos, o entendimento ainda é passível de mudança.
Aliás, o acórdão nem sequer foi publicado, o que deveria ser motivo suficiente para que não fosse levado adiante o procedimento de revisão contra o Impetrante.
Eventual abertura de procedimento de revisão da anistia só poderia ocorrer após o trânsito em julgado, quando a decisão se tornasse definitiva.
(…)
Por mais absurdo que possa parecer, a Administração exigiu que o Impetrante comprovasse novamente seu direito à anistia política, embora já o tenha feito há mais de 15 anos (doc. 3).
Ao se defender, o Impetrante requereu a produção de prova por meio de depoimento pessoal e oitiva de testemunhas (doc. 6). Tais pedidos de produção probatória foram negados pela Administração (doc. 7).
Todos esses aspectos demonstram claramente a probabilidade do direito do Impetrante, tendo em vista a evidente violação ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa.
Vale ressaltar ainda que já existem três Projetos de Decreto Legislativo (PDL nº 263/2020; PDL nº 264/2020; e PDL nº 265/2020) para sustar as portarias da Ministra de Estado da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, que anulam quase 300 anistias concedidas a perseguidos políticos no País.
Além disso, conforme noticiado, “a OAB já encomendou parecer ao jurista Lenio Streck para impugnar, na Justiça, a decisão da ministra Damares Alves, dos Direitos Humanos, de anular 300 declarações de anistia dadas a perseguidos pela ditadura” 1 .
No que diz respeito ao perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, este é patente, uma vez que o Impetrante recebe reparação econômica em forma prestação mensal, permanente e continuada – que tem natureza alimentar – há mais de 15 anos. Essa prestação é a única fonte de renda do Impetrante.
(…)
A prestação mensal do Impetrante é essencial para o pagamento de todas as suas despesas correntes (doc. 9), como alimentação, educação de filhos e netos, saúde, aluguel, dívidas consignadas. São compromissos imediatos que exigem solução financeira inadiável. Por contar com idade avançada, 74 anos, o Impetrante sofreria danos irreversíveis, caso deixasse de receber a prestação mensal.
(…)
Destaque-se que a concessão da tutela jamais implicará aumento remuneratório ao Impetrante ou incremento de encargo orçamentário aos cofres públicos. De fato, o objetivo da medida antecipatória é a manutenção do pagamento integral da prestação mensal, que vem sendo paga ao Impetrante há mais de 15 anos. Assim, inexiste qualquer ônus extra para a Administração Pública.
(…)
Portanto, torna-se imperativa a imediata suspensão do ato coator, que anulou a portaria de anistia do Impetrante até final julgamento do presente Mandado de Segurança" (fls. 4/15e).
Requer, por fim, a concessão de medida liminar para suspender os efeitos da Portaria 1.524/2020, de modo a não interromper a prestação financeira, decorrente do ato de anistia política, até julgamento definitivo de mérito.
O pedido de justiça gratuita foi deferido pelo Presidente desta Corte, a fl. 61e.
De início, é de se consignar que, nos termos do art. 1º da Lei 12.016/2009 e em conformidade com o art. 5º, LXIX, da Constituição Federal, "conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça".
Nesses termos, a impetração do mandamus deve-se apoiar em incontroverso direito líquido e certo, comprovado desde o momento da impetração.
De igual modo, nos termos do art. 7º, III, da Lei 12.016/2009, a concessão de medida liminar em sede de mandado de segurança requer a presença, concomitante, de dois pressupostos autorizadores: a) a relevância dos argumentos da impetração; b) que o ato impugnado possa resultar a ineficácia da ordem judicial, caso seja concedida ao final, havendo o risco de dano irreparável ou de difícil reparação.
Na presente hipótese, em uma análise perfunctória dos autos, própria das tutelas de urgência, não se verifica a presença dos requisitos autorizadores da concessão do pedido liminar. Isso porque, os fundamentos da impetração não são aptos a configurar, de imediato, a concessão da liminar.
Como cediço, o ato administrativo tem fé pública e goza de presunção de legalidade, legitimidade e veracidade. Somente em situações excepcionais, desde que haja prova robusta e cabal, se pode autorizar o afastamento da justificativa do interesse público à sua desconstituição, o que não se verifica de pronto no caso concreto.
O Supremo Tribunal Federal, apreciando o Tema 839, fixou a seguinte tese:
"No exercício do seu poder de autotutela, poderá a Administração Pública rever os atos de concessão de anistia a cabos da Aeronáutica com fundamento na Portaria 1.104/1964, quando se comprovar a ausência de ato com motivação exclusivamente política, assegurando-se ao anistiado, em procedimento administrativo, o devido processo legal e a não devolução das verbas já recebidas."
Na hipótese, a Administração, por meio da Portaria 3.076/2019, determinou a revisão das anistias concedidas com fundamento na Portaria 1.104/GM-3/1964 e, posteriormente, notificou a parte impetrante sobre a instauração de procedimento de revisão, intimando-a para apresentar alegações de defesa.
Nesse procedimento, ao que se percebe, somente após a manifestação do impetrante e ante a Nota Técnica 486/2020/DFAB/CA/MMFDH (fl. 44e), a qual concluiu pela anulação da Portaria anistiadora, sem a devolução das parcelas já recebidas, conforme decisão proferida pelo STF, no RE 817.338/DF, em repercussão geral, a autoridade ora apontada coatora anulou a portaria que declarara o impetrante anistiado político, ante a ausência de comprovação da existência de perseguição exclusivamente política no ato concessivo.
Diante desse contexto, não se pode olvidar que constitui direito da Administração a revisão dos atos administrativos supostamente ilegais, desde que obedecido ao contraditório e à ampla defesa, sendo certo que não se vislumbra a existência dos requisitos autorizadores da concessão da medida de urgência, em razão da inequívoca existência de processo administrativo de revisão.
Vê-se que o que restou decidido pelo STF cinge-se tão somente à possibilidade (ou não) de a Administração rever os atos de concessão de anistia a cabos da Aeronáutica, com fundamento na Portaria 1.104/64, quando se comprovar a ausência de ato com motivação exclusivamente política, assegurando-se, ao anistiado, em procedimento administrativo, o devido processo legal e a não devolução das verbas já recebidas.
No caso, não se verifica, neste juízo precário, portanto, qualquer empecilho a que seja deflagrado o processo administrativo, como ocorreu na espécie, mesmo que não tenha havido a publicação do acórdão do RE 817.338/DF, ou eventual modulação posterior dos efeitos (já que o Pretório Excelso não o fez na ocasião do julgamento).
De igual modo, no que tange ao alegado cerceamento de defesa pelo indeferimento do pedido de produção de provas, vale lembrar que a Administração pode indeferir provas, quando consideradas impertinentes, desnecessárias ou protelatórias (art. 38 da Lei 9.784/99).
Com efeito, neste juízo prelibatório, não se verifica qualquer irregularidade da notificação, que visa propiciar o exercício da ampla defesa e do contraditório, e que observou os requisitos impostos pela Lei 9.784/99, informando que o processo de revisão seria iniciado com base no disposto na Portaria 3.076, de 16 de dezembro de 2019, a qual, por sua vez, faz menção ao julgamento do RE 817.338/DF, bem que o procedimento se destina à verificação dos requisitos para a concessão de anistia.
Assim, não se verifica, ab initio, qualquer empecilho a que seja deflagrado o devido processo administrativo, como ocorre na espécie, nem irregularidade no procedimento de intimação e trâmite do processo administrativo, que justifique a concessão da tutela liminar, conforme pretendido.
Igualmente, não se verifica o periculum in mora, de vez que, caso reconhecido o direito, poderá vir a ser restabelecido o status quo ante, bem como eventuais reflexos pretéritos. Presente, por outro lado, o perigo inverso, na medida em que os valores que viessem a ser indevidamente pagos pela União seriam de difícil reparação.
Merece registro, ainda, que a Portaria 1.275/2020 (fl. 209e) é expressa no sentido tanto de assegurar a não devolução das verbas indenizatórias já recebidas, como de reconhecer que a remuneração percebida não possui natureza salarial, mas retribuição indenizatória, decorrente do então reconhecimento da condição de anistiado político.
Ademais, a liminar postulada confunde-se, sim, com o mérito da própria impetração, caracterizando o caráter satisfativo do pedido, a inviabilizar a concessão da medida.
Ante o exposto, indefiro o pedido liminar" (fls. 66/72e).
Inconformado, sustenta o embargante que:
"A r. decisão embargada dispôs que a anulação das anistias pela autoridade coatora se encontra em consonância com a Tese 839 da Repercussão Geral. Contudo, a r. decisão embargada omitiu-se quanto à particularidade deste caso concreto, que diz respeito à expressa negativa ao pedido de produção de provas testemunhais formulado pelo Embargante.(…)A rejeição à produção de prova testemunhal implica violação ao direito à ampla defesa e ao devido processo legal. Como a Tese 839 da Repercussão Geral assegura o respeito ao devido processo legal, a autoridade coatora, ao invés de obedecer, contrariou a determinação do Egr. Supremo Tribunal Federal neste caso específico" (fl. 80e).
Requer, por fim, "sejam acolhidos os presentes embargos de declaração com vistas a, sanada a omissão acima demonstrada e verificada a violação à Tese 839 da Repercussão, ser deferido o pedido liminar do mandado de segurança, de modo a garantir a continuidade do pagamento da prestação mensal, permanente e continuada do Impetrante até o julgamento final do feito, bem como a manutenção do atendimento médico e hospitalar, além dos demais efeitos jurídicos decorrentes" (fl. 83e).
Impugnação da parte embargada, a fls. 117/121 e, pela rejeição dos aclaratórios.
De início, nos termos do art. 1.022 do CPC vigente, os Embargos de Declaração são cabíveis para "esclarecer obscuridade ou eliminar contradição", "suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento" e "corrigir erro material".
Na lição de JOSÉ CARLOS BARBOSA MOREIRA, "há omissão quando o tribunal deixa de apreciar questões relevantes para o julgamento, suscitadas pelas partes ou examináveis de ofício (…), ou quando deixa de pronunciar-se acerca de algum tópico da matéria submetida à sua cognição, em causa de sua competência originária, ou obrigatoriamente sujeita ao duplo grau de jurisdição (art. 475), ou ainda mediante recurso, inclusive quanto a ponto acessório, como seria o caso de condenações em despesas processuais e honorários advocatícios (art. 20), ou de sanção que se devesse impor (por exemplo, as previstas no art. 488, nº II, e no art. 529)" (in Comentários ao Código de Processo Civil, Volume V, Forense, 7ª edição, p. 539).
Infere-se, outrossim, que, não obstante a orientação acerca da natureza recursal dos Declaratórios, singularmente, não se prestam ao rejulgamento da lide, mediante o reexame de matéria já decidida, mas apenas à elucidação ou ao aperfeiçoamento do decisum, em casos, justamente, nos quais eivado de obscuridade, contradição, omissão ou erro material.
Não têm, pois, em regra, caráter substitutivo ou modificativo, mas aclaratório ou integrativo.
In casu, quanto ao cerne do inconformismo recursal, ao contrário do que pretende fazer crer a parte embargante, a decisão está suficientemente fundamentada, no sentido de que:
"Na presente hipótese, em uma análise perfunctória dos autos, própria das tutelas de urgência, não se verifica a presença dos requisitos autorizadores da concessão do pedido liminar. Isso porque, os fundamentos da impetração não são aptos a configurar, de imediato, a concessão da liminar.
Como cediço, o ato administrativo tem fé pública e goza de presunção de legalidade, legitimidade e veracidade. Somente em situações excepcionais, desde que haja prova robusta e cabal, se pode autorizar o afastamento da justificativa do interesse público à sua desconstituição, o que não se verifica de pronto no caso concreto.
O Supremo Tribunal Federal, apreciando o Tema 839, fixou a seguinte tese:
"No exercício do seu poder de autotutela, poderá a Administração Pública rever os atos de concessão de anistia a cabos da Aeronáutica com fundamento na Portaria 1.104/1964, quando se comprovar a ausência de ato com motivação exclusivamente política, assegurando-se ao anistiado, em procedimento administrativo, o devido processo legal e a não devolução das verbas já recebidas.
"Na hipótese, a Administração, por meio da Portaria 3.076/2019, determinou a revisão das anistias concedidas com fundamento na Portaria 1.104/GM-3/1964 e, posteriormente, notificou a parte impetrante sobre a instauração de procedimento de revisão, intimando-a para apresentar alegações de defesa.
Nesse procedimento, ao que se percebe, somente após a manifestação do impetrante e ante a Nota Técnica 486/2020/DFAB/CA/MMFDH (fl. 44e), a qual concluiu pela anulação da Portaria anistiadora, sem a devolução das parcelas já recebidas, conforme decisão proferida pelo STF, no RE 817.338/DF, em repercussão geral, a autoridade ora apontada coatora anulou a portaria que declarara o impetrante anistiado político, ante a ausência de comprovação da existência de perseguição exclusivamente política no ato concessivo.
Diante desse contexto, não se pode olvidar que constitui direito da Administração a revisão dos atos administrativos supostamente ilegais, desde que obedecido ao contraditório e à ampla defesa, sendo certo que não se vislumbra a existência dos requisitos autorizadores da concessão da medida de urgência, em razão da inequívoca existência de processo administrativo de revisão.
Vê-se que o que restou decidido pelo STF cinge-se tão somente à possibilidade (ou não) de a Administração rever os atos de concessão de anistia a cabos da Aeronáutica, com fundamento na Portaria 1.104/64, quando se comprovar a ausência de ato com motivação exclusivamente política, assegurando-se, ao anistiado, em procedimento administrativo, o devido processo legal e a não devolução das verbas já recebidas.
No caso, não se verifica, neste juízo precário, portanto, qualquer empecilho a que seja deflagrado o processo administrativo, como ocorreu na espécie, mesmo que não tenha havido a publicação do acórdão do RE 817.338/DF, ou eventual modulação posterior dos efeitos (já que o Pretório Excelso não o fez na ocasião do julgamento).
De igual modo, no que tange ao alegado cerceamento de defesa pelo indeferimento do pedido de produção de provas, vale lembrar que a Administração pode indeferir provas, quando consideradas impertinentes, desnecessárias ou protelatórias (art. 38 da Lei 9.784/99).
Com efeito, neste juízo prelibatório, não se verifica qualquer irregularidade da notificação, que visa propiciar o exercício da ampla defesa e do contraditório, e que observou os requisitos impostos pela Lei 9.784/99, informando que o processo de revisão seria iniciado com base no disposto na Portaria 3.076, de 16 de dezembro de 2019, a qual, por sua vez, faz menção ao julgamento do RE 817.338/DF, bem que o procedimento se destina à verificação dos requisitos para a concessão de anistia.
Assim, não se verifica, ab initio, qualquer empecilho a que seja deflagrado o devido processo administrativo, como ocorre na espécie, nem irregularidade no procedimento de intimação e trâmite do processo administrativo, que justifique a concessão da tutela liminar, conforme pretendido.
Igualmente, não se verifica o periculum in mora, de vez que, caso reconhecido o direito, poderá vir a ser restabelecido o status quo ante, bem como eventuais reflexos pretéritos. Presente, por outro lado, o perigo inverso, na medida em que os valores que viessem a ser indevidamente pagos pela União seriam de difícil reparação.
Merece registro, ainda, que a Portaria 1.275/2020 (fl. 209e) é expressa no sentido tanto de assegurar a não devolução das verbas indenizatórias já recebidas, como de reconhecer que a remuneração percebida não possui natureza salarial, mas retribuição indenizatória, decorrente do então reconhecimento da condição de anistiado político.
Ademais, a liminar postulada confunde-se, sim, com o mérito da própria impetração, caracterizando o caráter satisfativo do pedido, a inviabilizar a concessão da medida.
Ante o exposto, indefiro o pedido liminar" (fls. 66/72e).
Diante desse contexto, observa-se que não há falar em omissão da decisão embargada, revelando-se, assim, o nítido propósito de reexame da matéria.
Deve-se ressaltar que, seja à luz do CPC/73 ou do CPC vigente, os Embargos de Declaração não constituem veículo próprio para o exame das razões atinentes ao inconformismo da parte, tampouco meio de revisão, rediscussão e reforma de matéria já decidida.
Nesse sentido:
"PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OFENSA AO ART. 1.022 DO CPC NÃO CONFIGURADA. INTUITO DE REDISCUTIR O MÉRITO DO JULGADO. INVIABILIDADE.
1. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 1.022 do CPC. Os Embargos Declaratórios não constituem instrumento adequado para a rediscussão da matéria de mérito, nem ao prequestionamento de dispositivos constitucionais com vistas à interposição de Recurso Extraordinário.
2. Não há lacuna na apreciação do decisum embargado. As alegações da embargante não têm o intuito de solucionar omissão, contradição ou obscuridade, mas denotam a vontade de rediscutir o julgado.
3. Embargos de Declaração rejeitados" (STJ, EDcl no AgInt nos EAREsp 990.935/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, CORTE ESPECIAL, DJe de 1º/02/2018).
Ademais, a via recursal eleita não se presta a uniformização jurisprudencial.
Ante o exposto, rejeito os Embargos Declaratórios.
I.
Brasília, 20 de outubro de 2020.
MINISTRA ASSUSETE MAGALHÃES
Relatora
Ministra Assusete Magalhães – STJ
Para ler ou baixar o Inteiro teor (original) da Decisão Monocrática do Ministra Assusete Magalhães, Clique sobre o link do MS desejado.
Dcl no MS 26670 (2020/0192858-0 – 23/10/2020)
Decisão Monocrática – Ministra ASSUSETE MAGALHÃES
MS 26670(2020/0192858-0 – 19/08/2020)
Decisão Monocrática – Ministra ASSUSETE MAGALHÃES
MS 26670(2020/0192858-0 – 10/08/2020)
Decisão Monocrática – Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA
MANDADO DE SEGURANÇA nº 26670 / DF(2020/0192858-0)
Postado por Gilvan VANDERLEI
Ex-Cabo da FAB – Atingido pela Portaria 1.104GM3/64
E-mail gvlima@terra.com.br
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