UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA – UnB Faculdade de Direito Curso de Graduação em Direito

A LUTA DOS EX-CABOS DA FAB PELA ANISTIA: ANÁLISE DO DISSENSO INSTITUCIONAL A RESPEITO DA NATUREZA DA PORTARIA 1.104-GM3/64

Por Jéssica Narzira Bento de Melo

Brasília – DF

2017

De: soares1104gm3@bol.com.br <soares1104gm3@bol.com.br>
Enviada em: terça-feira, 12 de maio de 2020 20:46
Para: gvlima1@gmail.com; gvlima@terra.com.br
Assunto: A LUTA DOS EX-CABOS DA FAB PELA ANISTIA: ANÁLISE DO DISSENSO INSTITUCIONAL A RESPEITO DA NATUREZA DA PORTARIA 1.104-GM3/64

 

Gilvan Vanderlei, boa Noite!

Peço a sua concordância na Publicação desta Matéria para, "À Quem se interessar possa saber e interpretar…" (Em ANEXO)

 A LUTA DOS EX-CABOS DA FAB PELA ANISTIA: ANÁLISE DO DISSENSO INSTITUCIONAL A RESPEITO DA NATUREZA DA PORTARIA 1.104-GM3/64 NA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA.

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA – UnB

Faculdade de Direito

Curso de Graduação em Direito

 

A LUTA DOS EX-CABOS DA FAB PELA ANISTIA: ANÁLISE DO DISSENSO INSTITUCIONAL A RESPEITO DA NATUREZA DA PORTARIA 1.104-GM3/64

 

Trabalho de conclusão de curso apresentado como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharela em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Brasília – UnB, elaborado sob orientação da Prof.ª Dr.ª Eneá de Stutz e Almeida.

Jéssica Narzira Bento de Melo

Brasília – DF

2017

 

 A LUTA DOS EX-CABOS DA FAB PELA ANISTIA: ANÁLISE DO DISSENSO INSTITUCIONAL A RESPEITO DA NATUREZA DA PORTARIA 1.104-GM3/64

Jéssica Narzira Bento de Melo

Trabalho de conclusão de curso apresentado como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharela em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Brasília – UnB, elaborado sob orientação da Prof.ª Dr.ª Eneá de Stutz e Almeida.

Brasília – DF, 26 de junho de 2017.

BANCA EXAMINADORA:

 

_________________________________________
Professora Dr.ª Eneá de Stutz e Almeida Orientadora

_________________________________________
Mestranda Camila Gomes Lima Membra da banca examinadora

_________________________________________
Especialista Marcelo Pires Torreão Membro da banca examinadora

_________________________________________
Especialista Rodrigo da Silva Castro Membro suplente da banca examinadora

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

  • memória dos meus avós Narzira e Manoel Bento, pela tremenda honradez de carregá-los comigo.

 

AGRADECIMENTOS

A Deus, meu fôlego de vida.

Aos meus pais, que me deram a vida e me ensinaram a vivê-la com dignidade, não bastaria um obrigado. À minha mãe, Dirce, que se doou por inteira e renunciou aos seus sonhos para que eu pudesse realizar os meus, não bastaria um muito obrigado. Ao meu pai, Gercimar, que iluminou os caminhos obscuros com afeto e dedicação para que eu os trilhasse sem medo e cheia de esperanças, não bastaria um muitíssimo obrigado. Aos meus irmãos, Wilson e Wagner (in memoriam), pelo cuidado que jamais seria traduzido em palavras.

Ao meu futuro esposo, Weslley, que jamais permitiu que minhas ausências diminuíssem o amor e o propósito que nos une.

Ao Black Belt, pela confiança no que era improvável. Obrigada por entenderem, ainda a contragosto, minhas ausências.

  • Universidade de Brasília, pela oportunidade e acolhimento.
  • Professora Eneá de Stutz e Almeida, minha Orientadora, que, desde o início, abraçou este trabalho e esteve disposta a me ajudar. Faltam palavras para agradecer pela confiança, pelas indicações, por me acalmar durante esses meses de convivência. Você é imensamente responsável por esta conquista.
  • Camila Gomes Lima por ter tão prontamente aceitado tomar parte na banca examinadora e pelas contribuições para aprimoramento desta pesquisa. Ao Marcelo Pires Torreão pela imensa contribuição na minha formação prática profissional. Ao Rodrigo da Silva Castro por ter me apresentado dilemas da anistia política antes desconhecidos.
  • vida, estou de volta.

Estranhem o que não for estranho.

 Tomem por inexplicável o habitual.

                                  Sintam-se perplexos ante o cotidiano.

                                  Tratem de achar um remédio para o abuso,

                                   mas não se esqueçam de que o abuso é sempre a regra.

                                                                                                                                           (Bertold Brecht, A exceção e a regra)

 

RESUMO

A Constituição brasileira de 1988 concedeu, em seu artigo 8º do ADCT, a anistia aos que foram atingidos, em decorrência de motivação exclusivamente política, por atos de exceção, no período de 18 de setembro de 1946 até 05 de outubro de 1988. Esse dispositivo constitucional foi regulamentado pela Lei n.º 10.559, de 13 de novembro de 2002, que, além da declaração da condição de anistiado político, dispõe sobre uma série de direitos consectários da anistia, e cria a Comissão de Anistia. Esse regime de anistia política é resultado de um processo político de longa duração.

Dessa forma, este trabalho pretende reconstruir o referido processo, e evidenciar que a anistia é um processo inconcluso, vez que há atingidos, mesmo respaldados por leis, que ainda enfrentam dificuldades e resistências institucionais que parecem nunca ter fim. Então, apresentar-se-á a árdua luta de um grupo de ex-aeronautas pela declaração de anistia política. Essa luta está associada ao reconhecimento de que o expediente denominado Portaria 1.104, que os desligou da Aeronáutica, foi um ato de exceção, de natureza exclusivamente política que interrompeu um projeto de vida.

Palavras-Chave: Regime de anistia política. Concessão de anistia política. Aeronáutica. Desligamento. Portaria 1.104. Ato de exceção, de natureza exclusivamente política.

ABSTRACT

The Brasilian Constitution of 1988 granted, in article 8 of the ADCT, amnesty to those who were hit, due to exclusively political motivation, by acts of exception, between the period from September 18, 1946 to October 5, 1988. This constitutional provision was regulated by Law n.º 10.559 from November 13, 2002, that, in addition to the declaration of political amnesty, it provides for a number of rights resulting from the amnesty, and creates the Amnesty Commission. This system of political amnesty is the result of a long-term political process.

In this way, this work intends to reconstruct the previously mentioned process, and demonstrate that amnesty is an unfinished process, despite de fact that there are stricken, even backed by laws, who still face institutional difficulties and resistance that never seem to end. So, it will be presented the arduous struggle of an ex-aeronauts group for the declaration of political amnesty. This struggle is associated with the recognition that the regulatory file called Ordinance n.º 1.104, that disconnected them from the Aeronautics, was an exception act, of an exclusively political nature, which interrupted a project of life.

Keywords: Regime of political amnesty. Grant of political amnesty. Aeronautics.

Disconnexion. Ordinance n. 1.104. Exception act, of an exclusively political nature.

 

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABAP – Associação Brasileira de Anistiados Políticos

ABI – Associação Brasileira de Imprensa

ACAFAB – Associação dos Cabos da Força Aérea Brasileira

ADCT – Ato das Disposições Constitucionais Transitórias

AGU – Advocacia-Geral da União

AMFN – Associação dos Marinheiro e Fuzileiros Navais

ARENA – Aliança Renovadora Nacional

BNM – Brasil Nunca Mais

CBA – Comitê Brasileiro pela Anistia

CEBs – Comunidades Eclesiais de Base

CEMDP – Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos

CGU – Consultoria-Geral da União

CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil

FAB – Força Aérea Brasileira

GT – Grupo de Trabalho

IPM – Inquérito Policial Militar

LDO – Lei de Diretrizes Orçamentárias

MDB – Movimento Democrático Brasileiro

MFPA – Movimento Feminino Pela Anistia

MP – Medida Provisória

OAB – Ordem dos Advogados do Brasil

PDS – Partido Democrático Social

PDT – Partido Democrático Trabalhista

PFL – Partido da Frente Liberal

PMDB – Partido do Movimento Democrático Brasileiro

PSDB – Partido da Social Democracia Brasileira

PT – Partido dos Trabalhadores

PTB – Partido Trabalhista Brasileiro

SBPC – Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência

SNI – Sistema Nacional de Informações

STF – Supremo Tribunal Federal

STM – Superior Tribunal Militar

TCU – Tribunal de Contas da União

UDN – União Democrática Nacional

 

SUMÁRIO

Introdução

Capítulo 1 – O Regime de Anistia Política

1.1 – Anistia Política: uma reivindicação antiga.

1.2 – Concessão de anistia: uma prerrogativa concorrida.

1.3 – Lei n.º 6.683, de 28 de agosto de 1979: a anistia que não foi ampla, nem geral, nem irrestrita..

1.4 – Pós Lei n.º 6.683/79.

1.5 – Emenda Constitucional n.º 26, de 27 de novembro de 1985..

1.6 – Lei n.º 10.559, de 13 de novembro de 2002, e a Comissão de Anistia..

 

Capítulo 2 – O caso dos ex-cabos da Força Aérea Brasileira.

2.1 – Período antecedente ao golpe de 1964: momento de lutas por melhorias nas instituições militares e por cidadania .

2.1.1 – Governo de João Goulart.

2.1.2 – A Revolta dos Sargentos.

2.1.3 – A Revolta dos Marinheiros e a deflagração do Golpe.

2.2 – As primeiras punições.

2.3 – A extensão da perseguição: a Portaria 1.104-GM3, de 12 de outubro de 1964.

2.4- O recomeço da vida no mundo civil.

 

Capítulo 3 – A luta dos ex-cabos da FAB pela declaração de anistiado político.

3.1 – O dissenso institucional a respeito da natureza da Portaria 1.104.

3.2 – Exorbitância de competências.

3.2.1 – O posicionamento do Tribunal de Contas.

3.3 – O posicionamento do Poder Judiciário.

3.4 – Portaria n.º 134/11, Grupo de Trabalho Interministerial: cauda de legalidade autoritária.

Considerações finais.

Referências Bibliográficas.

Anexo.

1 – Fundamentação do voto condutor da edição da Súmula Administrativa n.º 2002.07.0003 da Comissão de Anistia;

2 – NOTA N. AGU/JD/1-2006.

 

Introdução

A saída da ditadura militar brasileira não aconteceu por um passe de mágica, instantaneamente, pelo contrário, requereu tempo e a conjugação de inúmeros fatores, igualmente sujeitos ao tempo. Nesse processo de transição, surge uma forma distinta de justiça, com características bem definidas, de forma a possibilitar o trato do presente com o passado, visando a projeção de um futuro.

A chamada Justiça de Transição refere-se a uma concepção de justiça associada a períodos de intensa transformação política, em que os Estados nacionais, a sociedade civil e os organismos internacionais, por meio de medidas judiciais e extrajudiciais, buscam lidar com o legado de violações de direitos humanos, atrocidades em massa e outras formas de severo trauma social, com vistas à não-repetição e à construção de uma temporalidade impreterivelmente diferente.

Durante essa travessia, apareceram várias questões prejudiciais à normalidade democrática. Nesse contexto de questionamentos e enfrentamentos necessários, surge a anistia como eixo estruturante da Justiça de Transição brasileira.1

O direito à anistia política ampara-se no artigo 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), posteriormente regulamentado pela Lei n.º 10.559, de 13 de novembro de 2002. Verifica-se que houve um enorme decurso de tempo entre a garantia constitucional do direito e a regulamentação de sua implementação. Somando-se a isso, do reconhecimento estatal tardio do prejuízo causado a uma série de brasileiros que remonta ao período de 1946 a 1988, denota-se claramente a necessidade de uma rápida efetivação desse direito e seus consectários, de modo a que seja possível a justiça ainda no tempo da vida.

O referido regime de anistia política é resultado de um processo político de longa duração, que tem início nos dias que seguiram o golpe militar de 1964, e se fortalece entre os anos de 1974 e 1975. Após o momento mais crítico da repressão, acontece uma das maiores mobilizações sociais vistas na história do Brasil. A palavra de ordem era a “anistia ampla, geral e irrestrita”. Nesse momento, buscava-se essencialmente o resgate das liberdades públicas, civis e políticas.

Em contrapartida, o governo militar impôs a anistia que lhe convinha: a Lei n.º 6.683 de 1979, uma anistia parcial e restrita, que excluía os ditos “crimes de sangue”, mas incluía expressão de sentido dúbio, “crime conexo ao crime político”. Ocorre que a anistia, mesmo parcial, permitiu a recomposição de alguns direitos, os quais forjaram o ambiente para a retomada do processo democrático.

Após a eleição indireta de um civil para a Presidência da República, a anistia foi reafirmada nos termos da Lei de 1979 por uma Emenda Constitucional convocatória da Constituinte.

Acontece que a nova Constituição não previu em seus dispositivos os mesmos termos das anistias anteriores. Ao contrário, a Constituição da República de 1988, claramente faz referência aos que foram atingidos por atos de exceção, prevendo inclusive, um conjunto de direitos reparatórios. Desta feita, o conceito de anistia foi alargado para liberdade e reparação.

Tem-se, portanto, que dos quatro pilares da Justiça de Transição, quais sejam: verdade e memória, reformas das instituições, justiça e reparações, este último foi efetivamente constitucionalizado em 1988.

O primeiro capítulo desta pesquisa destina-se à reconstrução desse processo político de longa duração. Isso será feito não do ponto de vista dogmático, de sua natureza jurídica, mas frisando como a normatividade da anistia política foi formada ante as lutas e “concórdios”. A abordagem principia pelas primeiras reivindicações pela anistia, quando a repressão ainda não havia mostrado sua face mais cruel, passa pela concessão do benefício e se estende até o atual regramento de anistia política.

Feito isso, surgem algumas questões de fundo que movem esta pesquisa, como: o referido processo da anistia já findou? O que resta dessa luta pela anistia? Ao procurar responder essas questões, provavelmente uma agenda repleta de pendências será descoberta.

Pensando ser possível construir uma narrativa sobre a ditadura militar no Brasil a partir da temática da anistia, tendo como base as histórias de vida de pessoas que foram atingidas pela repressão e que até hoje lutam contra ela, apresentar-se-á no segundo capítulo o caso de ex-cabos Força Aérea Brasileira (FAB) que perderam suas funções em razão de uma portaria de 12 de outubro de 1964, editada pelo Ministério da Aeronáutica. Esse grupo alega em seus requerimentos, enviados à Comissão de Anistia, que essa portaria teve caráter exclusivamente político. Em contrapartida, a FAB alega que essa portaria teve cunho administrativo.

Já no terceiro capítulo, será visto que essas pessoas, mesmo respaldadas pelo regime do anistiado político, ainda enfrentam dificuldades e resistências institucionais que parecem nunca ter fim. Dentro disso, a Comissão de Anistia é percebida como precípuo instrumento de superação do regime autoritário e efetivação da Justiça de Transição. Detidamente, buscar-se-

  • mostrar nesse capítulo a luta desses ex-cabos da FAB pela obtenção da declaração de anistiado político. Isso está associado ao reconhecimento de que o expediente denominado Portaria 1.104, que os desligou da Aeronáutica, foi um ato de exceção de natureza exclusivamente política.

A pesquisa favorecerá um entendimento mais claro de como algumas instituições do Estado brasileiro estão construindo obstáculos à Justiça de Transição. E isso, transcende o espaço de debate jurídico, repercutindo sobre ciências afins como a História, a Sociologia, a Política, a Economia, etc.

Pressupõe-se, neste estudo, que a declaração de anistia política, as práticas institucionais e a judicialização da questão resultam das disputas sociais e do estabelecimento de lugares de fala, não havendo uma convergência de consensos, mas a imposição e a resistência dos sentidos de poder, aos sentidos da anistia. O estudo em questão não tem a pretensão de alcançar a verdade sobre o caso dos ex-cabos da FAB ou um sentido essencial que deva ser imposto. É do interesse, em verdade, realçar as disputas institucionais pelo sentido da anistia, em última instância, disputas pelo poder. A contenda para determinar se a Portaria 1.104 é ato de exceção, de motivação exclusivamente política, ou mero ato administrativo, é precípua para os projetos ideológicos em competição. Da luta desse grupo de ex-militares ver-se-á que a anistia não é algo fixo, acabado, natural, mas permeado por inúmeras vozes e os mais variados argumentos pró e contra o reconhecimento de uma história.

Esta pesquisa justifica-se socialmente por se deter sobre questão extremamente controvertida: o caso dos ex-cabos da FAB, a Portaria 1.104. Mais que uma pesquisa, preocupa-se este estudo em trazer ao conhecimento a luta de um grupo que já perfaz pelo menos 53 anos, aportando-se a 1964. A luta dos militares “subversivos” de ontem, hoje idosos, não cessou. A tez e o semblante combativo persistem e os discursos continuam direcionados à aquisição de direitos.

 

Capítulo 1 – O Regime de Anistia Política

 

A Constituição brasileira de 1988 concedeu, em seu artigo 8º do ADCT, a anistia aos que foram atingidos, em decorrência de motivação exclusivamente política, por atos de exceção, no período de 18 de setembro de 1946 até 05 de outubro de 1988. Esse dispositivo constitucional foi regulamentado pela Lei n.º 10.559, de 13 de novembro de 2002, que, além da declaração da condição de anistiado político, dispõe sobre uma série de direitos consectários da anistia, e cria a Comissão de Anistia.

Esse regime de anistia política é resultado de um processo político de longa duração, que teve sua origem na carestia de direitos do regime militar, e tem se realizado na história, por meio de lutas e “concórdios” entre espoliados e oprimidos, de um lado, e espoliadores e opressores de outro.

Dessa forma, este primeiro capítulo destina-se à reconstrução do referido processo. A abordagem principia pelas primeiras reivindicações pela anistia, quando a repressão ainda não havia mostrado sua face mais cruel, passa pela concessão do benefício e se estende até o atual regramento de anistia política.

 

1.1 – Anistia Política: uma reivindicação antiga

 

A reivindicação pela anistia política foi contemporânea ao ano de instauração do golpe militar. O primeiro a pleiteá-la foi Alceu de Amoroso Lima, o Tristão de Athayde, em dezembro de 1964, durante entrevista a uma emissora de rádio carioca.2 No ano seguinte, Carlos Heitor Cony, foi quem defendeu a anistia nos seguintes termos: “desde 1º de abril o governo tem diante de si um dilema incontornável: ou processa e condena regularmente os militares acusados em todo o País; ou concede anistia”3. Em 1966, o General Pery Constant Bevilacqua, Ministro do Superior Tribunal Militar (STM), apelou pela adoção do expediente.4 E, em 1967, um manifesto da Frente Ampla, grupo político de oposição que reunia Carlos Lacerda, Juscelino Kubitschek e João Goulart, requereu a anistia geral, para que se dissipasse a atmosfera de guerra civil que existia no país.5

  • em 1975 que surge a primeira organização social voltada notadamente para a defesa da anistia política. Após o momento mais crítico da repressão, Terezinha Zerbini, mulher de um general cassado, reúne mães de filhos mortos, viúvas, familiares dos desaparecidos, dos presos e dos exilados políticos, e lança o Movimento Feminino pela Anistia (MFPA).6

Mais uma vez, as mulheres foram vanguardistas na história, e lançaram o Manifesto da Mulher Brasileira, que era um chamado à organização política dos diferentes setores da sociedade civil, sobretudo as mulheres, para que engajassem na luta pela anistia política. Veja:

Nós, mulheres brasileiras, assumimos nossas responsabilidades de cidadãs no quadro político nacional.

Através da História, provamos o espírito solidário da Mulher, fortalecendo aspirações de amor e justiça.

Eis porque nós nos antepomos aos destinos da Nação que só cumprirá a sua finalidade de Paz, se for concedida a Anistia AMPLA E GERAL a todos aqueles que foram atingidos pelos atos de exceção.

Conclamamos todas as Mulheres no sentido de se unirem a esse movimento, procurando o apoio de todos quantos se identifiquem com a idéia da necessidade de ANISTIA, tendo em vista um dos objetivos nacionais: A UNIÃO DA NAÇÃO.7 [grafia no original]

O MFPA irradiou-se rapidamente por todo o Brasil. Constituíram-se núcleos em Minas Gerais, presidido por Helena Greco, na Bahia, em Pernambuco, no Rio de Janeiro, em Sergipe, no Ceará, na Paraíba e no Rio Grande do Sul.

O ano de 1977 foi agitado por manifestações estudantis em protesto contra prisões e torturas que logo se tornariam também manifestações em prol da anistia, com os “Dias Nacionais de Protesto e Luta pela Anistia” e o surgimento dos “Comitês Primeiro de Maio pela Anistia”.8 Nos meses seguintes, organizações da ala progressista da Igreja Católica, como a Comissão de Justiça e Paz, as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), e o Colégio Episcopal da Igreja Metodista aderiram à luta por anistia. Os movimentos populares como o “Panela Vazia” e os metalúrgicos do Grande ABC também se empreenderam nessa luta.9

Em fevereiro de 1978, o Comitê Brasileiro pela Anistia (CBA), foi fundado no Rio de Janeiro por advogados, familiares e amigos de vítimas do regime, para coordenar as ações em prol da anistia.10 Um diferencial foi a elaboração do “Programa Mínimo de Ação”, do qual constavam sete pontos principais: fim radical e absoluto das torturas; perdão imediato a todos os presos e perseguidos políticos (não-extensivo aos “algozes de suas vítimas”); elucidação da situação dos desaparecidos políticos; reconquista do habeas corpus; fim do tratamento arbitrário e desumano contra os presos políticos; revogação da Lei de Segurança Nacional; e, por fim, apoio às lutas pelas liberdades democráticas.11

Já no mês de maio, a discussão sobre anistia efervesceu na conferência nacional da OAB, realizada em Curitiba. Os advogados exigiam a volta do Estado de Direito, o qual não se estabeleceria somente com o fim dos atos de exceção, mas com a “participação efetiva do povo nos atos de criação e aplicação da ordem estatal”.12

Também no ano de 1978, a exemplo do que já havia acontecido em outros momentos do regime militar, uma greve de fome de presos políticos voltou a alertar a sociedade para a necessária concessão da anistia. O protesto, que durou 25 dias, começou com presos de Itamaracá, em Pernambuco, os quais pleiteavam o fim do isolamento carcerário de Rholine Sonde Cavalcanti e Carlos Alberto Soares, ambos condenados à prisão perpétua, e logo contou com a adesão de presos políticos de outras regiões do país.13 Várias foram as entidades que se solidarizaram com o movimento e apelaram ao governo pela anistia. Noites de vigília cívica e atos públicos foram organizados em várias capitais do país, e os familiares dos prisioneiros fizeram reivindicações ao Presidente Ernesto Geisel, em Brasília. A greve de fome terminou, e Cavalcanti e Soares passaram a deixar o isolamento quatro dias por semana e tiveram direito a visitas.14

Em setembro de 1978, durante encontro nacional de movimentos pela anistia, a “Carta de Salvador” foi elaborada, e a luta por anistia reforçada. Dela constava que a luta pela anistia era necessária e imprescindível para a obtenção de uma conquista maior: as liberdades democráticas; e que a anistia deveria ser ampla (“para todos os atos de manifestação de oposição ao regime”), geral (“para todas as vítimas dos atos de exceção”) e irrestrita (“sem discriminações ou restrições”).15

Foi em novembro, em São Paulo, que ocorreu o Primeiro Congresso Nacional pela Anistia, com o apoio de entidades como a OAB, a CNBB, a ABI e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). A abertura foi marcada pelo discurso do advogado Luiz Eduardo Greenhalgh, o qual asseverou que o Estado de Direito havia sucumbido ante o gigantismo do estado policial e que o Brasil se tornara conhecido no exterior como um dos países que mais aviltavam os direitos humanos. Greenhalgh também enfatizou a rejeição do movimento à proposta de anistia parcial e de revisão de processos, que pretendiam excluir do alcance da medida os que participaram de movimentos armados, e recusou a possibilidade de uma anistia recíproca, a qual, para ele, era “inteiramente imprópria, sem precedentes e extemporânea a utilização do instituto da anistia para quem não foi identificado oficialmente, não sofreu qualquer sanção punitiva, não foi condenado, nem mesmo julgado”.16

Enfim, ao final dos anos 70, o regime autoritário instalado em 1964 vivia um período de “lenta, gradual e segura” distensão, nas palavras do Presidente Ernesto Geisel. Em 1978, os banimentos políticos vinham sendo revogados, a censura esfriara, a comunidade de informações e segurança estava com suas ações limitadas, e o Ato Institucional n.º 5 formalmente não operava mais.17 No entanto, longo ainda era o caminho para a concessão da anistia política.

 

1.2 – Concessão de anistia: uma prerrogativa concorrida

 

De um modo geral, cada país tem o poder de anistiar aqueles que contrariam as suas leis, e, normalmente, isso encontra-se determinado na Constituição.

A Constituição Política do Império do Brasil de 1824 previa que a concessão de anistia era atribuição privativa do Poder Moderador, o qual era exercido pelo Imperador.18

Na Constituição de 1891, ela passou a ser de competência privativa do Congresso Nacional, e assim foi mantida na emenda de 1926. Já na Constituição de 1934, a competência privativa da União foi restabelecida. A Carta de 1937, no artigo 15, inciso XI, também estabelecia que a referida prerrogativa competia privativamente à União. Por sua vez, a Constituição de 1946 tratava da questão em dois artigos: no artigo 5º era de competência da União, no artigo 66 era de competência exclusiva do Congresso Nacional.

Como se vê, a prerrogativa de concessão de anistia oscilou ao longo das Constituições brasileiras. E, na Constituição de 1967, ela tornou-se um problema relativo à segurança revolucionária, fazendo com que o plenário majoritariamente governista retirasse do Congresso a exclusividade de legislar sobre a questão. Assim, em seu artigo 43, restou previsto que cabia ao Congresso Nacional, com a sanção do Presidente da República, dispor19 sobre todas as matérias de competência da União, especialmente a concessão de anistia. E, segundo o inciso VI, do artigo 57, a iniciativa de leis que concedessem anistia relativa a crimes políticos era de competência exclusiva do Presidente da República, depois de ouvido o Conselho de Segurança Nacional.

Não obstante a expressa previsão de que a anistia era prerrogativa exclusiva do Presidente da República, em vários momentos do regime militar a bancada do Movimento Democrático Brasileiro (MDB) testou os limites constitucionais impostos.

E assim, em 1968, o Deputado Paulo Macarini (MDB-SC) apresentou projeto de anistia beneficiando os envolvidos nos acontecimentos que sucederam à morte do estudante Edson Luís de Lima Souto. Em agosto desse ano, o Brasil vivia um “surto de anistia”, tramitavam, na Câmara Federal, outros dez projetos de anistia, todos de iniciativa da oposição.20

Em 1975, foi a vez do Deputado Florim Coutinho (MDB-RJ) reapresentar um projeto de anistia para os banidos, mas este acabou engavetado pelas comissões técnicas.21

Mesmo sabendo que as iniciativas desse tipo de prerrogativa do Legislativo não eram consideradas e não avançariam no Congresso, vários parlamentares insistiam no assunto, consequentemente alimentando o debate.

Para a oposição, o Executivo usurpara um poder do Legislativo, contrariando a melhor tradição republicana. Assim, a luta pela anistia era também dirigida à ausência de democracia.

 

1.3 – Lei n.º 6.683, de 28 de agosto de 1979: a anistia que não foi ampla, nem geral, nem irrestrita

 

Em março de 1979, assim que empossado, o Presidente João Baptista Figueiredo encaminhou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 14/79, que previa a concessão de anistia política. De acordo com os meios midiáticos da época, Figueiredo estava exultante e chegou a se emocionar.22

A elaboração do projeto foi tratada como uma questão estritamente estatal, e contou com nomes como Petrônio Portella, ex-Presidente do Senado e Líder da Arena; Golbery do Couto e Silva, Ministro-Chefe da Casa Civil; Octávio Aguiar de Medeiros, Chefe do Sistema Nacional de Informações (SNI); Danilo Venturini, Chefe do Gabinete Militar; e, Heitor Ferreira, Secretário particular do Presidente.23

Restrito, mesquinho, discriminatório, burocrático, casuístico, parcial, arbitrário, omisso, e até odiento. Multitudinárias e diversas foram as críticas ao projeto. Para Teotônio Vilela (MDB-AL), Presidente da Comissão Mista encarregada de analisar o projeto, a anistia era um tema a ser resolvido na sociedade, a quem cabia fixar os parâmetros e precisar o alcance da lei.24 Para os presos políticos, o projeto era condicional, haja vista que a restauração dos direitos atingidos não era imediata, e não tinha sua validade assegurada, já que não pretendia revogar a Lei de Segurança Nacional. Outro aspecto bastante criticado era o fato de a projeto dar azo à ampla, geral, irrestrita e prévia anistia aos torturadores do regime ao incluir “crime conexo ao crime político”. Mas, foi a discriminação contida no projeto que foi alvo das opiniões mais ácidas:

O projeto não exclui os que o regime entende responsáveis pelo terror. Beneficiou alguns para deixar de fora os condenados formalmente. Dois acusados pelo mesmo fato terão tratamento diametralmente oposto. O condenado seguirá na prisão. O que ainda não foi sentenciado recuperará os seus direitos e não responderá pelos atos praticados. Não há argumento lógico, nem princípio ético que justifique tão odiosa desigualdade.25

Pelos cálculos do Palácio do Planalto, estariam excluídos do projeto 195 condenados.26 Já pelo STM, 320 pessoas poderiam ficar de fora da Lei de Anistia.27 Na ocasião o próprio Ministro da Justiça, Petrônio Portella, admitiu a limitação do projeto, mas isso era plausível, uma vez que em sua opinião, a anistia não pode ser dada nos termos desejados pela oposição.28

A insatisfação com o projeto pode ser sentida em toda a sua dimensão a partir do momento em que as emendas começaram a ser apresentadas. Das 305 propostas de emenda ao projeto de lei, 209 foram apresentadas por parlamentares do MDB, entre as quais 65 foram propostas com o objetivo de alterar o artigo 1º, que previa a extensão da anistia política.29

Todavia, após a derrocada tentativa de melhorias no projeto, foram acrescentados à redação do Executivo apenas sete artigos, através do substitutivo vencedor do Relator da Comissão Ernani Satyro (Arena-PB). O prazo de concessão do benefício foi estendido até 15 de agosto de 1979, incluiu no artigo 1º os crimes eleitorais e não só as ações punidas por atos institucionais e complementares, mas também as baseadas em “outros diplomas legais”, e foram garantidas aos dependentes de anistiado falecido o direito às vantagens que lhe seriam devidas. Além de prever a possibilidade de familiares desaparecidos requererem uma declaração de ausência de pessoa, o substitutivo também concedeu anistia aos empregados de empresas privadas punidos por participação em greves ou outros momentos reivindicatórios, e estabeleceu que os anistiados inscritos em partidos políticos legalmente constituídos poderiam votar e ser votados.30

Enfim, no dia 22 de agosto de 1979, o Congresso Nacional aprovou o Projeto de Lei nº 14, que deu origem à Lei n.º 6.683, de 28 de agosto de 1979. O artigo 1º, §§1º e 2º, ficaram com a seguinte redação:

Art. 1º É concedida anistia a todos quantos, no período compreendido entre 02 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979, cometeram crimes políticos ou conexos com estes, crimes eleitorais, aos que tiveram seus direitos políticos suspensos e aos servidores da Administração Direta e Indireta, de fundações vinculadas ao poder público, aos Servidores dos Poderes Legislativo e Judiciário, aos Militares e aos dirigentes e representantes sindicais, punidos com fundamento em Atos Institucionais e Complementares.

  • 1º Consideram-se conexos, para efeito deste artigo, os crimes de qualquer natureza relacionados com crimes políticos ou praticados por motivação política.
  • 2º Excetuam-se dos benefícios da anistia os que foram condenados pela prática de crimes de terrorismo, assalto, sequestro e atentado pessoal.

Ressalta-se, ainda, que a lei possibilitou aos servidores públicos e aos militares o retorno ao serviço, a ser requerido no prazo de 120 dias a partir da publicação da lei, o qual estava condicionado, necessariamente, à existência de vaga e ao interesse da Administração.31 Ademais, embora a lei permitisse a aposentadoria, a transferência para reserva ou reforma e a reversão dos servidores, que se estendia aos dependentes, na hipótese de falecimento, essa não possibilitava o pagamento de indenizações relativos a vencimentos, saldos, salários, proventos, restituições, atrasados, promoções ou ressarcimentos.32

 

1.4 – Pós Lei n.º 6.683/79

 

Apesar da publicação da Lei n.º 6.683/79 e do Decreto n.º 84.143/79, que a regulamentou, poucos foram os perseguidos políticos que tomaram conhecimento e, em menor número ainda, os que se beneficiaram dessa primeira medida reparatória.

O Comitê Brasileiro de Anistia inaugurou a década de 80 com um levantamento completo sobre a situação dos militares em relação a Lei n.º 6.683/79. Além das Forças Armadas, que tinham na Marinha o seu maior número de atingidos, o estudo também incluiu dados das polícias militares. Divulgou-se que apenas 34 dos 7.488 militares que deveriam se beneficiar da Lei de Anistia haviam conseguido reintegração ao serviço ativo, enquanto 748 haviam sido reformados ou aposentados. Em relação aos civis, o quadro também não era muito diferente. Em alguns estados, como Minas Gerais, nenhum dos funcionários punidos por motivos políticos haviam sido anistiados.33

Em 1984, cinco anos depois de aprovada a referida lei, dezessete presos ainda cumpriam penas impostas pelo autoritarismo. Um novo levantamento, desta vez realizado pelo Movimento Feminino pela Anistia e Liberdade Democrática, contabilizava o número de 11.434 pessoas que aguardavam benefícios da anistia. Dos 4.730 civis, 4.691 eram ex-funcionários da Petrobrás, os quais haviam sido demitidos com base em leis de exceção, e somente 309 haviam sido anistiados, sendo que apenas 14 tiveram seus empregos de volta e o restante foi aposentado. Dos 117 bancários perseguidos, 67 conseguiram retornar aos seus empregos, 27 foram aposentados, 8 eram pensionistas e 15 aguardavam a anistia. Nas Forças Armadas, os não-anistiados contabilizavam 6.740. Dos 407 oficiais punidos, 369 estavam na inatividade e 38 aguardavam algum benefício. Dos quase sete mil praças atingidos, 34 voltaram à ativa e 380 estavam inativos, e os outros aguardavam a anistia.34

 

1.5 – Emenda Constitucional n.º 26, de 27 de novembro de 1985

 

Presente de forma praticamente constante na cena política brasileira desde o golpe militar de 64, a questão da anistia voltaria às manchetes dos jornais em outubro de 1985. Três dias antes do recesso parlamentar de julho, o Presidente José Sarney enviou ao Congresso uma emenda constitucional convocando a Assembleia Constituinte para 1987.

Ocorre que juntamente com essa emenda foi enviado um texto que dispunha da anistia concedida aos militares punidos a partir de 1964, haja vista que, conforme exposto anteriormente, foram poucos os beneficiados pela anistia concedida por meio da Lei de 1979. Formou-se assim, no Congresso, uma corrente que vinculava a anistia à convocação da Constituinte. Era sugerida a aprovação de uma anistia mais abrangente, que englobasse todos os oficiais e praças punidos pelo regime militar e permitisse a volta à ativa, com o resgate dos vencimentos não pagos durante o período em que estiveram ausentes. Embora, já estivesse num governo civil, rapidamente, Sarney e os ministros militares articularam uma anistia menos drástica, a qual se consubstanciou na proposta do Deputado Valmor Giavarina

(PMDB-PR). Acontece que, o Deputado Jorge Uequed (PMDB-RS) apresentou uma emenda propondo a desvinculação da votação da anistia da convocação da Constituinte, e estabelecendo novos termos para a anistia dos militares punidos, muito diferente daqueles que os ministros das Forças Armadas estavam dispostos a aceitar.35

A proposta de votação em separado não foi derrubada, e os contrários à iniciativa de Uequed pressionaram o Presidente Sarney a agir. Temiam que, confirmada a emenda, cerca de 2.600 militares punidos com base em atos administrativos fossem promovidos aos postos que estariam ocupando se estivessem permanecido à ativa. Outro medo era que a emenda se tornasse uma espécie de precedente legal e, com isso, militares pudessem requer benefício idêntico na Justiça. Ao final de tal quadro, Uequed não conseguiu o apoio de dois terços dos parlamentares necessários e teve sua emenda derrotada.36

Por conseguinte, no dia 27 de novembro de 1985 foi promulgada a Emenda Constitucional n.º 26, que convocou a Assembleia Nacional Constituinte, prevista para o dia 1º de fevereiro de 1987 e, em seu artigo 4º, reiterou a anistia política concedida pela Lei n.º 6.683/79, conforme transcrito a seguir:

Art. 4º É concedida anistia a todos os servidores públicos civis da Administração direta e indireta e militares, punidos por atos de exceção, institucionais ou complementares.

  • 1º É concedida, igualmente, anistia aos autores de crimes políticos ou conexos, e aos dirigentes e representantes de organizações sindicais e estudantis, bem como aos servidores civis ou empregados que hajam sido demitidos ou dispensados por motivação exclusivamente política, com base em outros diplomas legais.
  • 2º A anistia abrange os que foram punidos ou processados pelos atos imputáveis previstos no "caput" deste artigo, praticados no período compreendido entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979.
  • 3º Aos servidores civis e militares serão concedidas as promoções, na aposentadoria ou na reserva, ao cargo, posto ou graduação a que teriam direito se estivessem em serviço ativo, obedecidos os prazos de permanência em atividade, previstos nas leis e regulamentos vigentes.

Como se vê, a concessão da anistia foi singelamente ampliada, uma vez que foi estendida aos representantes de organizações sindicais e estudantis, possibilitando, outrossim, aos servidores públicos civis e militares, a concessão de promoções, na aposentadoria ou na reserva, ao cargo a que teriam direito caso estivessem em exercício. Entretanto, a concessão de anistia aos autores dos anteriormente referidos “crimes conexos” aos crimes políticos foi mantida.

 

1.6 – Lei n.º 10.559, de 13 de novembro de 2002, e a Comissão de Anistia

 

Mesmo com a aprovação da Lei n.º 6.683/79 e com a ratificação pela Emenda Constitucional n.º 26, os debates em torno da anistia continuaram.

Com a instalação da Assembleia Nacional Constituinte, em 1987, inúmeros foram os momentos em que se voltou a apelar “à pacificação da família brasileira”37. Essa foi a expressão utilizada pelo Deputado Lysâneas Maciel (PDT-RJ), na sessão do dia 14 de junho de 1988, para justificar a necessidade de se anistiar os praças das Forças Armadas punidos por atos administrativos de motivação política. No entanto, os representantes de siglas como PFL, PDS e PTB mantinham-se relutantes no sentido de que nada mais seria concedido à título de anistia política. A fala do Deputado Amaral Neto (PDS-RJ), proferida na ocasião, sintetiza isso: “Demos duas anistias aqui, por lei ordinária, em 1979, e em 1985 demos por emenda constitucional. Não temos mais nada a conceder e votamos não”38. Eles estavam decididos a não ceder, constituintes insistiam que punições sofridas por militares tinham caráter estritamente administrativo e, portanto, não se tratavam de atos de exceção.

Nessa senda, emendas que propunham algum tipo de indenização especial, como a apresentada pelo Deputado Marcelo Cordeiro (PMDB-BA), propondo parcela correspondente

  • soma dos salários dos últimos cinco anos aos servidores civis e militares anistiados, bem como a proposta elaborada pelo Deputado José Maurício (PDT-RJ), prevendo ressarcimento financeiro a todos os parlamentares cassados pelo Executivo, eram mortas à caneta.39

Mesmo assim, foi com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil, em 1988, que a questão da anistia avançou mais um pouco. No tocante a isso, o artigo 8º do ADCT prevê o seguinte:

Art. 8º. É concedida anistia aos que, no período de 18 de setembro de 1946 até a data da promulgação da Constituição, foram atingidos, em decorrência de motivação exclusivamente política, por atos de exceção, institucionais ou complementares, aos que foram abrangidos pelo Decreto Legislativo nº 18, de 15 de dezembro de 1961, e aos atingidos pelo Decreto-Lei nº 864, de 12 de setembro de 1969, asseguradas as promoções, na inatividade, ao cargo, emprego, posto ou graduação a que teriam direito se estivessem em serviço ativo, obedecidos os prazos de permanência em atividade previstos nas leis e regulamentos vigentes, respeitadas as características e peculiaridades das carreiras dos servidores públicos civis e militares e observados os respectivos regimes jurídicos.

Da leitura do dispositivo acima, percebe-se que a anistia a que se referia a Constituição vinha tomando outra forma, que não aquela concebida pela Lei n.º 6.683 de 1979. Em primeiro lugar, é importante destacar que esse dispositivo faz referência tão somente aos perseguidos políticos, isto é, diferente da anistia anterior, que não foi suficientemente clara quanto aos destinatários, o preceito constitucional foi incisivo em destinar a anistia política aos “atingidos”.

Além disso, a anistia abrangeu um período mais amplo do que as anteriores. De fato, o artigo 8º do ADCT abrangeu o período de 18 de setembro de 1946 até a data da promulgação da Constituição, 5 de outubro de 1988, enquanto a anistia conferida pela Lei n.º 6.683/79 e pelo artigo 4º da Emenda Constitucional n.º 26 de 1985 abrangeu apenas o período compreendido entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979.

Quantos aos efeitos consectários da anistia, o artigo 8º indubitavelmente enfatiza a dimensão reparatória da anistia, tendo em vista que determina sejam “asseguradas as promoções, na inatividade, ao cargo, emprego, posto ou graduação a que teriam direito se estivessem em serviço ativo”. O § 1º desse mesmo artigo prevê que os eventuais efeitos financeiros retroagem até a data da promulgação da Constituição de 1988.

De qualquer maneira, os progressos ficaram bastante aquém do que desejavam a oposição e as vítimas do regime militar. Inquestionavelmente, mais uma vez, a temática estava circunscrita aos limites estabelecidos pelas Forças Armadas, como bem disse o Deputado constituinte José Genoíno (PT-SP): “Qualquer questão, da menor à maior, que os militares disseram que a Assembleia não podia aprovar, a Assembleia não contrariou. Ela não contrariou em nada as determinações dos militares. Portanto, curvou-se à tutela militar”40.

Ainda como parte dessa luta pela anistia, em 1992, no governo de Fernando Collor de Melo, fruto da primeira eleição direta pós-ditadura militar, foi regulamentada a pensão excepcional de anistiado para aqueles que foram demitidos em virtude de motivação política, no período de 18 de setembro de 1946 a 05 de outubro de 1988. As promoções a que teriam direito se estivessem no serviço ativo também seriam observadas, assim como a transferência dos benefícios para os dependentes do anistiado, no caso de falecimento deste.

No ano de 1995, isto é, após 15 anos da Lei de Anistia de 1979, a criação de uma comissão de Direitos Humanos na Câmara Federal retomou a pauta das violações perpetradas pelos agentes estatais no período ditatorial, ensejando na elaboração da Lei n.º 9.140, sancionada em 04 de dezembro de 1995, a qual reconheceu como mortas pessoas desaparecidas em virtude da participação em atividades políticas, no período de 02 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979. Assim, tornou-se possível o requerimento dos respectivos atestados de óbito e o pagamento de indenizações arbitradas no valor de até cem mil reais. Com a promulgação da referida lei, foi criada a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP), vinculada ao Ministério da Justiça, responsável por analisar outros casos de desaparecimento e morte.

As Forças Armadas e os setores ligados a ela se manifestaram contrariamente ao reconhecimento de mortes e à concessão de indenizações. Os casos mais emblemáticos foram o de Carlos Marighella, denominado, pela ditadura como o seu “maior inimigo” e morto no dia 04 de novembro de 1969, e o de Carlos Lamarca, considerado pelos militares como o maior traidor do Exército brasileiro, e morto no sertão baiano em 17 de setembro de 1971.

Outro advento do ano de 1995 foi a criação, no âmbito do Ministério do Trabalho, da Comissão Especial de Anistia, que buscava apreciar os pedidos de anistia de empregados do setor privado, empresas públicas e mistas, dos dirigentes e representantes sindicais.

Por ocasião dos 20 anos da Lei de Anistia, em 1999, ocorreram mobilizações em diversos lugares do país. Os eventos ocorridos ensejaram o reencontro de pessoas com uma história em comum e possibilitaram ampliar a discussão acerca da possibilidade de outras “leis reparatórias”.

Irresignados com as novas dificuldades que se incorporaram aos problemas enfrentados desde a aprovação da Lei n.º 6.683/79, os anistiados civis e militares aproveitaram as sessões solenes dos vinte anos da promulgação da Lei da Anistia, organizadas no Congresso Nacional, e encaminharam as suas queixas aos parlamentares.

Tanto na sessão da Câmara Federal, quanto na do Senado, era claro que a anistia não era uma decisão pontual, mas um processo que teve início em 1979, e devia ainda ser continuado. O Deputado Jaques Wagner (PT-BA) criticou o Presidente Fernando Henrique Cardoso, visto que ele havia sido o único presidente, desde a época de Figueiredo, que ainda não teria se disposto a receber uma comissão de anistiados.41 Em resposta, Teotônio Vilela Filho (PSDB-AL) informou que o Presidente Fernando Henrique Cardoso receberia, naquele mesmo dia, no Palácio do Planalto, uma comissão representativa de anistiados.

No encontro dos anistiados com o Presidente, eles reclamaram do tratamento que o governo vinha dando à questão do anistiado político, chegaram a dizer que isso denegria a imagem do presidente, uma vez que ele também era um anistiado. Por oportuno, lhe entregaram um texto com os aspectos que gostariam de ver mudados na legislação sobre o assunto. Fernando Henrique Cardoso mostrou-se surpreso, e imediatamente contactou o Ministro da Justiça, José Carlos Dias, e pediu-lhe para rever sua atuação quanto à anistia. Para tanto, foi criada no âmbito do ministério e sob a presidência do próprio Dias, uma comissão especial com vistas ao aperfeiçoamento do processo de anistia.

A referida comissão, com o apoio informal de ex-perseguidos políticos, mas sem participação dos militares, elaborou uma medida provisória (MP) que concedia anistia a civis e militares até então não beneficiados pela legislação em vigor e dava outras providências. A medida provisória ficou pronta em abril do ano 2000, mas com a troca dos ministros da justiça, o texto acabou sendo revisto por uma outra comissão. O Ministro da Justiça da época, José Gregori, enxugou o projeto e o encaminhou ao Ministro da Defesa, Geraldo Quintão, o qual novamente submeteu o texto a revisão.

Somente no dia 31 de maio de 2001, a Medida Provisória n.º 2.151 foi assinada por Fernando Henrique Cardoso, e o artigo 8º do ADCT regulamentado. Segundo o Presidente Fernando Henrique Cardoso: “Essa medida provisória conclui um longo processo de restabelecimento dos valores fundamentais da democracia, dos direitos humanos e da reparação”42.

Quatro direitos gerais foram estabelecidos pela medida provisória: a declaração da condição de anistiado político; a reparação econômica, de caráter indenizatório; a contagem do tempo em que o anistiado esteve afastado de suas atividades, para fins previdenciários; e a conclusão de curso interrompido ou reconhecimento de diploma no exterior.

Entretanto, mais uma vez os anistiados não ficaram contentes. A crítica mais contundente, de acordo com o Presidente da Associação Brasileira de Anistiados Políticos (ABAP), era que a medida praticamente remetia todos os ex-perseguidos ao regime de reparação por prestação única, que em hipótese alguma poderia ultrapassar o teto de cem mil reais. Outra crítica frequente era em relação ao parágrafo 3º, do artigo 3º, que vedava a reparação econômica aos anistiados civis ou militares que haviam sido readmitidos ou reintegrados aos respectivos quadros funcionais. Também reclamavam a incidência de contribuição previdenciária sobre o valor do benefício a ser recebido, referente ao período computado para efeito de aposentadoria.

A comissão mista destinada a emitir parecer sobre a medida provisória, adotada em 24 de agosto de 2001 e publicada no dia 27 do mesmo mês, só foi instalada em 09 de maio de 2002. A missão da comissão foi resumida nas palavras do Deputado Vivaldo Barbosa (PDT-RJ): “Esta comissão tem uma tarefa histórica de pôr fim a todo o processo de luta pela anistia. Não pode restar mais nada em relação à anistia após o trabalho dessa comissão”43.

Já no primeiro mês de trabalho da comissão, 109 emendas foram anunciadas aos 23 artigos da medida provisória. No dia 19 de junho, o relatório que concluía por um projeto de lei de conversão, foi aprovado por unanimidade pelos integrantes da comissão mista. Por determinação regimental, a votação do projeto deveria se dar em conjunto nas duas casas, durante sessão do Congresso Nacional. A previsão era que a medida provisória fosse votada antes do recesso parlamentar, mas infelizmente não foi isso que aconteceu. Um impasse foi instalado: o governo não concordava que o pagamento dos anistiados políticos fosse retroativo a 1988, e a oposição condicionava a votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) à aprovação da medida provisória da anistia. Para solucionar isso, o governo e a oposição acordaram que uma nova medida provisória seria editada e garantiria o retroativo, conforme previsto no relatório da comissão, aos anistiados que já haviam aderido à proposta do governo. Os demais passariam a receber indenizações referentes aos últimos cinco anos. Ainda restou acertado que, excetuando-se os estudantes, os anistiados poderiam optar por receber suas indenizações em parcela única ou prestação continuada, e que os militares anistiados seriam promovidos por antiguidade e merecimento.44

Então, em agosto de 2002, ocasião comemorativa dos 23 anos da promulgação da Lei de Anistia, o Presidente Fernando Henrique assinou o novo texto da medida provisória que, pela segunda vez, buscou regulamentar o artigo 8º do ADCT e dava outras providências. Ao término do prazo regimental, doze emendas foram apresentadas à MP n.º 65. No dia 24 de outubro, como ainda não havia sido votada, a medida provisória foi prorrogada pelo Presidente do Congresso Nacional. A medida provisória só foi apreciada na Câmara, em novembro, quando já estava trancando a pauta da Casa. O Relator, Luiz Eduardo Greenhalgh, se posicionou pela rejeição das emendas e declarou: “Este é o melhor dos textos da lei de anistia que o Brasil já teve. Beneficiará cerca de sete mil pessoas e é considerado pelo movimento de anistiados a verdadeira anistia ampla, geral e irrestrita”45. Aprovada na Câmara, a MP seguiu para o Senado Federal, onde também foi ratificada. Finalmente, em 13 de novembro de 2002, a Lei n.º 10.559 foi promulgada.

Em brevíssima síntese, a Lei n.º 10.559/02 estabeleceu o “Regime do Anistiado Político”, que compreende os seguintes direitos: declaração da condição de anistiado político; reparação econômica, de caráter indenizatório; contagem, para todos os efeitos, do tempo em que o anistiado político esteve compelido ao afastamento de suas atividades profissionais; conclusão do curso; reintegração dos servidores públicos civis e dos empregados públicos.

Além disso, a Lei n.º 10.559/2002 criou a Comissão de Anistia do Ministério de Justiça que tem por finalidade examinar e apreciar os requerimentos de anistia, emitindo parecer destinado a subsidiar o Ministro de Estado da Justiça na decisão acerca da concessão de anistia política.

 

Capítulo 2 – O caso dos ex-cabos da Força Aérea Brasileira

 

Como foi visto no capítulo anterior, o atual regime de anistia política é resultado de um processo político de longa duração que principia singulares reivindicações já em 1964, perpassa as lutas propriamente ditas pela anistia a partir da criação do Movimento Feminino pela Anistia em 1975 e dos Comitês Brasileiros pela Anistia em 1978, e chega nas diversas filtragens normativas advindas da concessão do benefício em 1979.

No decorrer do referido processo, somou-se ao instituto jurídico da anistia política uma quantidade de fins e objetivos que o levam a constantes contradições internas.46 Ao lado do fornecimento da verdade, da construção da memória, da regularização da justiça, do restabelecimento da igualdade e da reforma das instituições perpetradoras de violações, está a reparação.47 E, é a partir dela que o Estado brasileiro passou a compreender que todo aquele que foi prejudicado pelo regime de 1964 tem o direito de ser declarado anistiado político e reparado.

Contudo, vale ressaltar que, embora as discussões sobre reparação cingem-se, com frequência, às indenizações materiais e morais, essa dimensão da anistia não pode e não deve ser vista estritamente pelo viés financeiro. Segundo Cecília Coimbra,

[…] entendemos que a reparação, enquanto compensação econômica é um direito, mas só tem sentido para a afirmação de algo novo em nossas vidas se for parte integrante de um processo. Processo que, em nosso país, mal foi iniciado. A reparação, portanto, deve incluir, necessária e fundamentalmente, a investigação e o esclarecimento dos fatos violadores, a publicização e responsabilização dos agentes envolvidos nesses fatos, a garantia do atendimento médico-psicológico e de reabilitação física e social aos atingidos, declarações oficiais e decisões judiciais que restaurem os direitos desses mesmos atingidos. Em suma, um pedido público de desculpas por parte do Estado.48

A despeito de toda amplitude conferida à noção reparatória da anistia, será visto neste trabalho que a anistia é um processo inconcluso, vez que há atingidos, mesmo respaldados por leis, que ainda enfrentam dificuldades e resistências institucionais que parecem nunca ter fim.

A fim de exemplificar que o processo da anistia está longe de ser concluído, será apresentada, no capítulo seguinte, a árdua luta de um grupo de ex-aeronautas pela declaração de anistia política. Essa luta está associada ao reconhecimento de que o expediente denominado Portaria 1.104, que os desligou da Aeronáutica, foi um ato de exceção, de natureza exclusivamente política que interrompeu um projeto de vida.

Então, a gente estava ali com o objetivo de servir, fazer carreira e fomos atingidos por esse ato de exceção do Ministério da Aeronáutica. Foi um momento muito difícil, né, nós fomos pegos de surpresa. Por que de surpresa? Porque a gente ‘tava’ ali como militar e a gente não tinha interesse nenhum em política, a gente não sabia o que estava passando politicamente. Não era o nosso objetivo. Nosso objetivo era ser militar, fazer nossa carreira e ninguém falava em política […] Todos nós, que já tinham mais de 5 anos na FAB, a gente tinha vontade de seguir carreira. Então, nós fomos cerceados daqueles nossos objetivos na FAB, naquela época, era de seguir nossa carreira e defender a pátria. Politicamente, nós não tivemos participação nenhuma no processo.49

Para isso, imprescindível que se mostre neste capítulo o processo de expurgo desses ex-militares, que já estavam nas fileiras da Força Aérea Brasileira desde o início dos anos 1960. Detidamente, será visto que o expediente da Portaria 1.104 insere-se em um projeto de saneamento gestado pelo alto escalão militar, que tinha a pretensão de eliminar do cenário político e militar todo e qualquer óbice ou antagonismo, real ou potencial, ao regime ditatorial e ao projeto de desenvolvimento capitalista.

 

2.1 – Período antecedente ao golpe de 1964: momento de lutas por melhorias nas instituições militares e por cidadania

2.1.1 – Governo de João Goulart

 

Após sete meses no poder, no dia 25 de agosto de 1961, o Presidente Jânio Quadros surpreendeu o Brasil com a sua renúncia ao cargo. Imediatamente, o Congresso Nacional apreciou o incontestável pedido de renúncia, e o Presidente da Câmara Federal, Ranieri Mazzilli tomou posse interinamente no cargo até o retorno do Vice-Presidente João Goulart, que se achava em viagem oficial à China.50 Jânio Quadros possuía forte apoio dos militares51, haja vista que, assim como eles, defendia o combate à corrupção e a defesa da moral. Além de contar com respaldo da União Democrática Nacional (UDN), partido pelo qual boa parte dos militares estava mobilizada desde os anos 40, outro componente que fortalecia a figura de Jânio frente aos militares era o personalismo, que havia existido com Vargas e Juscelino. Apesar do personalismo não ser um fenômeno racional, o imaginário político militar não escapou do complexo messiânico. Ou seja, Jânio era visto tanto pelos militares quanto pelo povo, como o único capaz de salvar o país.52

Além da crise desencadeada pela ausência da pessoa de Jânio Quadros, havia a agravante: como as candidaturas não eram vinculadas, ou seja, havia o voto para o presidente e para o vice-presidente separadamente, era possível eleger opositores políticos, exatamente o que ocorreu em 1960. Então, aqueles que haviam apoiado Jânio passaram a fazer oposição à posse de Jango, pois estavam temerosos com as mudanças que ele pudesse implementar. As razões desse pesar eram muitas e iam desde a associação de Jango a Getúlio, antigo desafeto do alto escalão das Forças Armadas; passavam pela relação de parentesco com Leonel Brizola, conhecido por sua ligação com a esquerda e as ideias revolucionárias; e chegavam ao despreparo de Jango para a função, o que supostamente o tornava presa fácil para a esquerda.53

Frente a tanta oposição, Brizola passou a fazer campanha pela posse do Vice-Presidente em um programa transmitido pela Rádio Mayrink Veiga. A chamada Rede da Legalidade conclamava a população a garantir a posse prevista na Constituição. Foi com a adesão do III Exército, até então, a mais poderosa unidade do exército brasileiro, que o movimento tornou-se mais expressivo.54

Brizola e a Rede da Legalidade foram vistos pelos militares como o recomeço da atuação comunista nas Forças Armadas. O real objetivo da campanha brizolista, segundo os militares, não era garantir a legalidade, mas sim trazer divisão para as Forças Armadas e assegurar que, quando da ascensão de Jango, os comunistas chegassem ao poder e Refere-se ao alto comando das Forças Armadas, ao contrário do restante do capítulo que aprecia em certa medida o caso dos militares subalternos. transformassem o Brasil numa república socialista.55  Segundo depoimento do General-de-Brigada Durval Antunes Machado de Andrade Nery:

O governador, na sua pregação revolucionária, falava todos os dias na Rádio guaíba, na ‘Cadeia da Legalidade’. Lembro perfeitamente, quando ele dirigia a palavra aos militares dizendo: ‘Sargentos do Exército, matem os oficiais!’. Era uma pregação subversiva, para gerar inquietação, para desagregar. Seria o fim das Forças Armadas. Era outra tentativa do Império comunista para implantar no Brasil um regime marxista-leninista.56

Embora a campanha pela legalidade tenha conquistado apoio da sociedade civil e de parte do Exército, foi com uma negociata entre militares e políticos que adveio uma inédita solução constitucional: a aprovação da Emenda Constitucional n.º 4, de 1961, que alterou o regime republicano, substituindo o sistema presidencialista pelo parlamentarismo. Assim, no dia 7 de setembro de 1961, Jango tomou posse como Presidente, tendo Tancredo Neves como Primeiro Ministro.

Somente em 6 de janeiro de 1963, por meio de um plebiscito antecipado, é que o Brasil voltou ao sistema presidencialista.

Empossado, já em seu primeiro discurso como Presidente, Jango lançou sua bandeira de governo: as Reformas de Base. Desde as tramas golpistas em 1961, movimentos sociais explodiam em todo o país com o objetivo de melhorar as condições de vida e trabalho de grande parte da população que se sentia excluída mesmo após o surto desenvolvimentista dos anos 50.

Reformas agrária, política, financeira, educacional, eram algumas das pautas propostas por Jango. E, foi a luta por elas que permitiu mobilizar e aglutinar grande conjunto de forças, que esboçariam, de 1963 a 1964, uma situação pré-revolucionária.57 Para os militares, estava clarividente que João Goulart implementaria uma república sindicalista e tornar-se-ia ditador, liquidando as Forças Armadas, transformando-as em milícia a serviço do governo.

Assim, todo o governo de Jango foi assombrado pela instabilidade: “o governo nasceu, conviveu e morreu sob o espectro do golpe de Estado”58, mas o ano de 1963 revelava que era chegado o fim.

 

2.1.2 – A Revolta dos Sargentos

 

Logo após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que reafirmou a inelegibilidade dos graduados (cabos, sargentos e suboficiais) para órgãos do Poder Legislativo, conforme previa a Constituição de 1946, no dia 12 de setembro de 1963, explodiu a Revolta dos Sargentos, encabeçada por cabos e sargentos, sobretudo da Aeronáutica e da Marinha.59 De acordo com o historiador Marco Antonio Villa,

a gravidade da rebelião, que rompeu com os marcos constitucionais, revela-se nas prisões de um ministro do Supremo Tribunal Federal, do presidente em exercício da Câmara dos Deputados – casos únicos na história brasileira – de um subchefe da Casa Civil, um coronel, seis majores, cinco capitães e oito tenentes, e contou com a complacência do governo federal e dos deputados considerados de esquerda.60

Além de protestarem contra a negativa da justiça em conceder aos praças direitos de serem elegíveis para cargos legislativos, os subalternos das referidas forças lutavam pela conquista de um espaço menos excludente e discriminatório. Eles não podiam andar à paisana, não podiam casar, o cabelo deveria ser cortado de acordo com as normas regulamentares, e a todo tempo corriam o risco de serem severamente punidos. Nas palavras de Eustáquio Caravelli

[…] o que eles queriam não era coisa subversiva: eles queriam que realmente respeitasse um pouco mais o corte de cabelo – que não fosse tão rigoroso como era na época -, uniforme que fosse usado apenas quando entrasse no quartel ou saísse […] -, o direito de votar e o de casar. Não eram coisas subversivas […] O direito à cidadania, é verdade […] Tanto é que nós fomos proibidos de tirar o título de eleitor. Não podia portar o título de eleitor, nem votar.61

Para os generais, essa revolta foi a prova do quão estavam abalados os sustentáculos da hierarquia e disciplina, condições indispensáveis para o exercício do comando de quaisquer forças militares regulares. O propósito do evento passou a ser questionado a partir do momento em que diversos militares de baixa patente passaram a entoar apoio as Reformas de Base, em especial à necessidade de estender o direito de voto aos analfabetos e às patentes subalternas das Forças Armadas, bem como às que atendiam as demandas básicas da sociedade: reforma agrária e educacional, melhor distribuição de renda, etc.

Poucos meses se passaram da Insurreição dos Sargentos, então, mais fogo foi colocado na caldeira, prestes a explodir, quando Jango, acompanhado de Leonel Brizola, no conhecido Comício da Central do Brasil, discursou em defesa da reforma constitucional, da reforma agrária, do voto dos analfabetos e dos militares subalternos.62 Na ótica das Forças Armadas, o Comício foi uma afronta incomensurável, e uma intervenção militar jamais seria um golpe, mas sim um contragolpe, haja vista que o verdadeiro golpe estava sendo dado pelo presidente.63

 

2.1.3 – A Revolta dos Marinheiros e a deflagração do Golpe

 

Em poucos dias, em 25 de março de 1964, mais uma rebelião militar ocorreria: a Revolta dos Marinheiros. Dois mil marinheiros e fuzileiros navais liderados por José Anselmo dos Santos, o “Cabo” Anselmo, compareceram à sede do Sindicato dos Metalúrgicos do Rio de Janeiro, ocasião comemorativa do segundo aniversário da Associação dos Marinheiro e Fuzileiros Navais (AMFN), entidade considerada ilegal, a despeito da proibição do Ministro da Marinha, Sílvio Mota.64

Na abertura da solenidade, o Cabo Anselmo assegurou a disposição da referida associação de lutar a favor das Reformas de Base, as quais, segundo ele, iriam libertar da miséria os explorados do campo, da cidade, dos navios, dos ares e dos quartéis.65

O Ministro da Marinha Sílvio Mota emitiu ordem de prisão contra os principais organizadores do evento e enviou um destacamento de fuzileiros navais ao local da reunião. Ocorre que, os fuzileiros, ao invés de prenderem os marinheiros, aderiram aos revoltosos, permanecendo na sede do Sindicato dos Metalúrgicos.

A gota d’água para aqueles que conspiravam contra o presidente foi quando na noite do dia 30 de março, no Rio de Janeiro, João Goulart, desobedecendo as ordens das Forças Armadas, comparece em um baile organizado pelos sargentos no Automóvel Clube, e além disso discursa em favor dos sargentos.66

Assim, o golpe é deflagrado em Minas Gerais com o General do Exército Olympio Mourão Filho que desloca sua tropa de Juiz de Fora e parte para a cidade do Rio de Janeiro a fim de derrubar o governo. Então, Jango foi deposto, se exila no Uruguai e começam os longos 21 anos de governo militar.

 

2.2 – As primeiras punições

 

Dado o golpe, na ótica militar, para que fosse implementado um Estado que desse conta do projeto de desenvolvimento capitalista, imprescindível que fosse dada continuidade ao processo de “limpeza”, visando extirpar do caminho quem se identificasse com as políticas janguistas, consideras culpadas pela desordem e pela comunização do país.

Como foi visto das seções anteriores, os movimentos de praças militares já aconteciam antes mesmo do golpe de 1964, e estavam inseridos em um contexto complexo que ameaçava a continuidade das relações de poder até então estabelecidas. O quadro político-social nacional e internacional mobilizou de um lado, a baixa oficialidade a reivindicar seus interesses e, de outro, aqueles contrários a tais projetos, tomavam providências para evitar conflitos que pudessem ameaçar a ordem estabelecida.

  • preciso ponderar que, em que pesem as especificidades de cada um dos segmentos das Forças Armadas, as revoltas trabalharam numa faixa comum a todos eles, o que fazia com que, em detrimento de reivindicações estritamente corporativistas, ganhasse força exatamente o que eles tivessem em comum, a condição de subalternos discriminados pela instituição e de integrantes das camadas populares expostas aos mecanismos excludentes da estrutura social.

Conforme dito, a Revolta dos Sargentos contou com a participação de cabos e soldados da Marinha, mas a maior parte dos envolvidos eram praças da Aeronáutica. As primeiras punições a essa rebelião foram perpetradas a partir da instauração de Inquéritos Policiais Militares (IPMs).67

De acordo com o relatório Brasil: Nunca Mais (BNM),

O processo formado contra os participantes desse movimento, na 1ª Auditoria da Aeronáutica, do Rio de Janeiro, apura o envolvimento de 54 réus, quase todos sargentos da Aeronáutica, apontados como os principais responsáveis pelos atos de amotinação, prisão de oficiais e de outras autoridades, interdição do aeroporto de Brasília, sabotagem de aviões e metralhamento de seus pneus, incitação à solidariedade de colegas do exército e da Marinha, etc. […] O IPM que deu início ao processo chegou a indiciar 52 sargentos, 47 cabos, 47 soldados de primeira classe e 154 soldados de segunda classe.68

Sucede que, o Ministério da Aeronáutica não aguardou os resultados da medida investigativa, e, já em 24 de setembro de 1963, solicitou ao Presidente da República autorização para antecipar o licenciamento dos participantes da Revolta.

Com a expedição do Aviso n.º S-24-GM1, de 3 de outubro, foi autorizado o Comandante da Guarnição da Aeronáutica de Brasília a antecipar a data de licenciamento dos revoltosos engajados em 1961. Tais avisos serviam como meio “legal” de afastar da Força Aérea aqueles que representavam alguma ameaça.

Ocorre que, mais do que licenciar aqueles que participaram dos movimentos era preciso impedir que outros semelhantes viessem a ocorrer nas fileiras da Força Aérea, então, em 4 de abril de 1964, a Aeronáutica editou a Portaria 290-GM1 determinando a abertura de inquérito policial militar a fim de apurar a existência de movimentos reivindicatórios dentro da Força Aérea. No referido ato, o Tenente-Brigadeiro Assis Corrêa de Mello dizia para o Major-Brigadeiro do Ar Antônio Guedes Muniz:

Tendo chegado ao meu conhecimento e, é de domínio público, que militares da Aeronáutica e civis vinham tendo participação, em movimento subversivo, de fundo comunista, movimento esse que provocou a reação das Forças Armadas no desenrolar dos acontecimentos dos últimos dias de março e nos primeiros dias de abril de 1964, a fim de que fossem restabelecidas a ordem, a disciplina, no seio das classes armadas, e a tranquilidade da família brasileira e a preservação das instituições nacionais, determino que seja, com urgência, instaurado, a respeito, o devido inquérito policial-militar delegando-lhe para esse fim, as atribuições policiais que me competem.69

Com isso, quem estava no olho do furacão era a Associação dos Cabos da Força Aérea Brasileira (ACAFAB), a qual, supostamente, teria apoiado indiretamente a Revolta dos Marinheiros, e desenvolvia atividades nocivas à ordem pública, à disciplina e à segurança do Estado.

Desse inquérito policial militar, ficou atestado que a associação

  • Foi criada sem a autorização do Ministério da Aeronáutica;
  • vem utilizando indevidamente o nome da Força Aérea Brasileira;
  • que sua Diretoria tomava parte ativa em reuniões e atividades subversivas;
  • que desenvolvia atividades ilícitas, contrárias ao bem público e a própria segurança nacional;
  • que, através de reuniões subversivas na entidade era tramada a deposição do ex-presidente da República e seguidas, in totem, as teses contrárias ao regime, do então deputado Leonal Brizola;
  • que teve participação direta nos acontecimentos subversivos, que foram levados a efeito no Sindicato dos Metalúrgicos.70

Com base nisso, o parecer final do IPM determinou:

A ASSOCIAÇÃO DOS CABOS DA FORÇA AÉREA BRASILEIRA, registrada sob esse título, contrariando as Autoridades do Ministério da Aeronáutica, deverá ter seu registro, como pessoa jurídica, cassado mediante AÇÃO JUDICIAL INTENTADA pelo Ministério da Aeronáutica; uma vez que essa denominação – “DE CABOS DA FORÇA AÉREA BRASILEIRA” – envolve o nome da corporação e se presta a explorações políticas. É recomendável que sejam tomadas medidas para prevenir que se organizem outras entidades, de caráter tendencioso como a ACAFAB e a CASA DO CABOS DA AERONÁUTICA DE SÃO PAULO, associação de caráter civil organizadas por graduados da Força Aérea Brasileira, que devem ser mantidas em vigilância para evitar que se degenerem.

[…]

DETERMINO, outrossim, a Diretoria Geral do Pessoal da Aeronáutica que atente com especial cautela para a conduta dos Cabos […]

Que o engajamento ou reengajamento, objeto de exame cuidadoso, primordialmente no que se relaciona com o comportamento militar e civil;

Também atendendo, ao sugerido no relatório de fls. 574, RESOLVO, proibir, expressamente, sejam feitos, em folhas de pagamento, desconto em desfavor DA ASSOCIAÇÃO DOS CABOS DA FORÇA AÉREA BRASILEIRA, da Casa dos Cabos da Aeronáutica de São Paulo e de quaisquer outras associações de caráter civil, organizadas por Cabos pertencentes à Aeronáutica.

Outrossim, DETERMINO aos Senhores Comandantes de unidades que procedam ao fechamento sumário e imediato de todas as sucursais da denominada ASSOCIAÇÃO DOS CABOS DA FORÇA AÉREA BRASILEIRA, que porventura, ainda estejam em atividade.

[…]

A extinção completará a série de medidas adotadas pelas autoridades federais para erradicar do meio social e sobretudo das classes militares os organismos subversivos.

Impõe-se medida contra a “ASSOCIAÇÃO DOS CABOS DA FORÇA AÉREA BRASILEIRA”, que, valendo-se das garantias constitucionais que asseguram a liberdade de associação de palavra, de imprensa e das demais que caracterizam o regime democrático que vivemos, pretendeu fazer letra morta das disposições que condicionam tais liberdades a licitude das suas finalidades.71

Além da fatídica suspensão da ACAFAB, 11 cabos identificados como os líderes do movimento subversivo no âmbito da FAB foram afastados com o expediente da Portaria 1.103. Porém, o Comando da Aeronáutica não se contentou. E, ante a impossibilidade de conseguir provas que incriminassem os cabos em massa, e visando completar o projeto de “limpeza” iniciado antes mesmo do 31 de março de 1964, decidiu-se que para prevenir, era melhor modificar. Então, foi editada a Portaria 16-GM1, que tinha como objetivo:

Constituir um Grupo de Trabalho para rever e atualizar as disposições das Portarias nº 570GM3, de 23 de novembro de 1954, alterada pelas de números 315GM3, de 18 de maio de 1955 e 148GM3, de 20 de março de 1956 (Instruções para Permanência em Serviço Ativo das Praças do Corpo do Pessoal Subalterno da Aeronáutica), sugerindo as modificações necessárias a respeito da citada legislação;72

Nota-se, que a Aeronáutica além de excluir aqueles que foram partícipes dos movimentos através das previsões normativas vigentes ou de autorizações especiais, também buscou alterar normas e regulamentos militares para punir aqueles que não participaram diretamente de tais movimentos.

 

2.3 – A extensão da perseguição: a Portaria 1.104-GM3, de 12 de outubro de 1964

 

No ano de 1964, o Decreto-Lei n.º 9.500, de 24 de julho de 1946, alterado pela Lei n.º 1.585, de 28 de março de 1952, regulava o serviço militar. Do § 3º, do artigo 86 da referida legislação, constava que o engajamento73 e o reengajamento74 dos praças seriam concedidos nos termos daquela lei, nos prazos e condições estabelecidos na sua regulamentação e instruções dos respectivos Ministérios, aos que solicitassem e tivessem robustez física, reconhecida em inspeção de saúde; comprovada capacidade de trabalho; boa conduta civil e militar; e menos de vinte e cinco anos de idade, em se tratando de engajamento.

Conforme citado no item anterior, foi a Portaria 570-GM3/54, vigente em abril de 1964, que baixou as instruções para a permanência em serviço ativo de praças do Corpo do Pessoal Subalterno da Aeronáutica. Nela permitia-se o engajamento de cabos por três anos, e reengajamentos sucessivos, também por três anos cada.

1 – Da concessão

1.1 – Os Sargentos, Cabos, Soldados e Taifeiros do Corpo do Pessoal Subalterno da Aeronáutica, que completarem o tempo de serviço, poderão obter prorrogação desse tempo mediante requerimento dirigido à autoridade competente (art. 15 do RCPSAer), 30 (trinta) dias antes de seu término, obedecidas as disposições legais.

1.2 – A prorrogação do tempo de serviço é feita por engajamento ou reengajamento:

1.2.1 – Engajamento – é a prorrogação do tempo inicial, concedida aos Sargentos e Cabos pelo prazo de 3 (três) anos; […]

1.2.2 – Reengajamento – é a prorrogação de permanência em serviço ativo concedida às praças anteriormente engajadas:

1.2.2.1 – 1º Reengajamento – de Sargentos, Cabos e Soldados de 1ª Classe, pelo prazo de 3 (três) anos exigindo-se destes soldados estarem em função qualificada ou possuírem curso que os habilite à promoção a Cabo. […]

1.2.2.2 – 2º e posteriores reengajamentos – Sargentos e Cabos, pelo prazo de 3 (três) anos se possuírem curso que lhes assegure promoção à graduação superior […]75 [grifos meus]

Insta salientar que, nessa portaria, não havia nenhum impedimento quanto ao número de reengajamentos e, de acordo com o artigo 162, da Lei do Serviço Militar vigente, cabos com mais de nove anos de serviço teriam estabilidade e poderiam continuar na ativa até a idade limite, qual seja 44 (quarenta e quatro) anos de idade.76

Contudo, somente em outubro de 1964 é que os resultados das revisões e atualizações propostas pela Portaria 16-GM1 foram encaminhadas ao Ministério da Aeronáutica sob o registro de Ofício Reservado n.º 04. Tal Ofício tratou com especial atenção os praças militares que contavam com 8 (oito) anos ou mais de tempo de serviço.

IV- No exame da permanência de praças no serviço ativo, o Grupo de Trabalho dedicou especial atenção à situação dos cabos com mais de 08 (oito) anos de serviço e, em consequência propõe providências que possam estimulá-los ao ingresso na Escola de Especialistas, mediante uma tolerância de idade, a vigorar nos próximos 02 (dois) anos.

[…]

VI – O denominado “problema dos cabos” não decorre do número existente, porque este é previsto nos Quadros de Distribuição de Pessoal (QDP), organizados pelo Estado-Maior e aprovado pelo Ministro. Também, nada há de ilegal no fato de haver cabos com muitos anos de serviço.

Quando o número destes tende a aumentar, ou quando não há uma renovação contínua desses graduados é que surgem as pretensões descabidas.77

Do documento acima merece destaque a afirmação de incentivar os cabos a ingressar na Escola de Especialistas, e o real fator que deu origem ao que se convencionou denominar “problema dos cabos”.

Há uma seção no referido ofício que trata especificamente do “problema dos cabos”. Nela consta que o aludido “problema” não era devido à quantidade, ao número de cabos, vez que sequer existia um cabo para cada sargento. Apresenta ainda, que os serviços dos cabos eram econômicos, pois eles não eram transferidos, não recebiam ajuda de custo, não ocupavam imóveis da União, e chegavam a substituir em alguns casos os claros de sargentos. E por fim, conclui que o fator número um do “problema dos cabos” deve-se à “demagogia aliada aos interesses escusos”.78

Assim, sem sombra de dúvida quanto à motivação política, em 12 de outubro de 1964, foi editada a Portaria 1.104-GM3, que reduziu os prazos de engajamentos e reengajamentos para dois anos cada e limitou o número de reengajamentos para o máximo de três, o que resultou no estabelecimento do limite de oito anos de permanência na patente de cabo.

1-    Prorrogações do Tempo de Serviço

1.1 – As praças da Força Aérea Brasileira que completarem o tempo de serviço inicial pelo qual se obrigarem a servir poderão obter prorrogação desse tempo, obedecidas as disposições destas Instruções.

1.2 – Tempo de serviço inicial é o período de permanência obrigatória contado a partir da inclusão nas fileiras da FAB na situação considerada ou da graduação como 3º Sargento.

1.3 – As prorrogações do tempo de serviço são feitas por engajamento e reengajamentos.

1.4 – Engajamento é prorrogação do tempo de serviço inicial concedida por 2 (dois) anos.

1.5      – Reengajamento é a prorrogação do engajamento concedida por períodos de

2 (dois) anos.

[…]

1.7 – As prorrogações de tempo de serviço se concederão na seguinte sequência: um engajamento e, conforme o caso, um 1º, um 2º e um 3º reengajamento.

[…]

4- Engajamentos e Reengajamentos.

4.1 – Terminado o período inicial poderão ser concedidos um engajamento e até três reengajamentos (1º, 2º e 3º) sucessivos.

[…]

4.5 – O tempo de serviço do Cabo se prorrogará no máximo até que decorram 8 (oito) anos ininterruptos de efetivo serviço, desde sua inclusão nas fileiras da FAB, […]79

Conforme observado, completado o período, caso o cabo não houvesse conseguido a promoção à patente de sargento, por meio de aprovação em concurso e ida para a Escola de Especialistas da Aeronáutica, era obrigado a dar baixa na corporação.

Um dos casos emblemáticos de desligamento é o do cabo Edy Medanha de Paula, que ingressou na Aeronáutica em 21 de julho de 1957 e foi obrigado a dar baixa em 10 de janeiro de 1967. Com efeito, Medanha havia servido 9 anos, 5 meses e 11 dias e, com a edição da Portaria 1.104 foi impedido de seguir carreira e atingir postos superiores.80

Assim, a Aeronáutica livrou-se de uma grande quantidade de cabos que depois de sucessivos reengajamentos já dominavam sua dinâmica institucional e eram considerados problemas.

 

2.4- O recomeço da vida no mundo civil

 

Com a edição da Portaria 1.104, foi visto que as regras do jogo foram modificadas, e aqueles que não conseguiram ingressar nas escolas de especialistas foram obrigados a sair da FAB e a recomeçar a vida no mundo civil. Para Júlio César, o momento de dar baixa na Aeronáutica foi triste:

Fomos pra rua, foi um momento muito difícil que a gente saiu com uma mão na frente e outra atrás – como se diz – sem aquela expectativa de arrumar um emprego na época condizente com aquilo que a gente ganhava nos quarteis, e foi muito triste. Todo nós, que já tinham mais de 5 anos na FAB, a gente tinha vontade de seguir carreira. Então, nós fomos cerceados daqueles nossos objetivos. Foi muito ruim […]81

Esses homens saíram da Aeronáutica sem um fundo reserva, muitos deles eram casados e tinham dois, três filhos, e tiveram que buscar emprego para garantir a sobrevivência. Para a maioria, as portas foram fechadas várias vezes, mesmo tendo a desenvoltura e a cordialidade aprendidas com a convivência militar, segundo a fala de Fagundes e corroborada por outro ex-cabo:

E aqui fora, aqui fora, nós tivemos problemas para arrumar emprego, a gente ia procurar o emprego, ‘ah, o que você fazia?’, ‘ah, eu era militar da Aeronáutica’, ‘e por quê você saiu?’; então eles já olhava pra gente com olhar desconfiado. Mas a gente tocou a vida, tocamos a vida, cada um no seu caminho.82

[…] a pior coisa que aconteceu após a Portaria 1.104, foi com vários colegas meus que quando foram licenciados da Força Aérea Brasileira não conseguiram arrumar emprego; quando eles chegavam em uma firma para poder arrumar emprego, o patrão perguntava assim ‘você trabalhava onde?’, ele respondia o seguinte ‘ah, eu era cabo da Aeronáutica’; ‘mas você saiu da Aeronáutica?’, ‘não, é que por força de uma lei, 1.104, nós tivemos que sair da Aeronáutica como cabos’. Só que esse patrão não acreditava nisso, entendeu? Sair da Aeronáutica, força de lei, cabo? Então, nós fomos assim… suspeitos. Ou melhor dizendo, quase que marginalizados, né? Porque as pessoas não acreditavam na gente. Poxa, um camarada cabo, não continuar na Força Aérea Brasileira, diz que por uma lei tiraram ele de lá… as pessoas não acreditavam direito, então, era difícil arrumar emprego.83

A partir desses relatos percebe-se o quanto a Portaria 1.104 afetou a vida dos ex-cabos e de seus familiares.

 

Capítulo 3 – A luta dos ex-cabos da FAB pela declaração de anistiado político

 

Foi visto no capítulo anterior que o regime militar brasileiro buscou legitimar suas ações para implementar seu projeto de dominação. Como E. P. Thompson afirma, “mesmo os dominantes têm necessidades de legitimar seu poder, moralizar suas funções, sentir-se úteis e justos […]”84. Assim que toda a maquinaria do Executivo foi assumida, os ditos revolucionários passaram a fazer uso de uma legislação de emergência suspensiva dos procedimentos legais para realizar expurgos no serviço público, na área militar e entre os ocupantes de cargos eletivos em todos os níveis.

Deste modo, um modus operandi capaz de agir legitimamente perante a sociedade, excluindo os possíveis inimigos internos, sejam civis ou militares, foi criado. Com os cabos da Aeronáutica não foi diferente.

Com efeito, a Força Aérea Brasileira além de punir, identificando e excluindo cada um dos envolvidos em movimentos considerados subversivos, optou também por prevenir, evitando que novos movimentos pudessem subverter a ordem dentro e fora da caserna.

Visto isso, buscar-se-á mostrar neste capítulo a luta dos ex-cabos da Força Aérea Brasileira pela obtenção da declaração de anistiado político. Isso está associado ao reconhecimento de que o expediente denominado Portaria 1.104, que os desligou da Aeronáutica, foi um ato de exceção de natureza exclusivamente política.

 

3.1 – O dissenso institucional a respeito da natureza da Portaria 1.104

 

Para os ex-cabos da Força Aérea Brasileira, o primeiro sopro de esperança veio com a aprovação da Lei n.º 6.683 em 1979. O artigo 1º da referida lei previa que:

Art. 1º É concedida anistia a todos quantos, no período compreendido entre 02 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979, cometeram crimes políticos ou conexo com estes, crimes eleitorais, aos que tiveram seus direitos políticos suspensos e aos servidores da Administração Direta e Indireta, de fundações vinculadas ao poder público, aos Servidores dos Poderes Legislativo e Judiciário, aos Militares e aos dirigentes e representantes sindicais, punidos com fundamento em Atos Institucionais e Complementares.

Ocorre que, embora a Lei de Anistia tenha sido amplamente divulgada na sociedade, já que fora a bandeira de luta travada por setores civis, como OAB, CNBB, ABI, etc., os cabos não tomaram o real conhecimento do benefício, e os que assim fizeram não conseguiram reunir documentos, que provassem a perseguição da Aeronáutica, em tempo hábil para requerer a anistia.

[…] então quem conseguiu, quem era amigo do rei e que conseguiu saber desse detalhe, bebeu água limpa. Quem não era… eu mesmo quando fiquei sabendo e consegui juntar alguns documentos e tentar a minha anistia em 79, já havia passado o tempo. Então não teve condições.85

  • cediço que, apesar da Constituição de 1988 prever no seu artigo 8º do ADCT a concessão de anistia aos que, no período de 18 de setembro de 1946 até 5 de outubro de 1988, foram atingidos, em decorrência de motivação exclusivamente política, por atos de exceção, a sua regulamentação só veio a acontecer 14 anos depois, em 13 de novembro de 2002, quando foi sancionada a Lei n.º 10.559.

Ao longo das tentativas de regulamentação dos direitos concedidos no referido dispositivo constitucional, foram propostas medidas provisórias e emendas. Dentre elas, na Medida Provisória n.º 2.151/01, consta a instalação em 28 de agosto de 2001 da primeira Comissão de Anistia do Ministério da Justiça. Logo nos primeiros meses de atividade da Comissão de Anistia, inúmeros foram os requerimentos de anistia formulados por cabos, que foram desligados ex officio do quadro da Força Aérea Brasileira por força da Portaria 1.104-GM3, de 12 de outubro de 1964.

Em virtude dessa intensa demanda, em julho de 2002, o Conselheiro Presidente da Comissão de Anistia José Alves Paulino submeteu o caso do ex-cabos da FAB ao Plenário, que se pautando em um conjunto harmônico de provas, editou a Súmula Administrativa n.º 2002.07.000386, classificando a famigerada87 Portaria como ato de exceção, de natureza exclusivamente política.88

Com base na referida Súmula, centenas de ex-cabos da FAB foram declarados anistiados políticos e passaram a ter direito à reparação econômica. A despeito disso, milhares de requerimentos da mesma natureza ainda aguardavam análise.

Sucede que, em maio de 2003, por meio do Aviso n.º 797, o Ministro da Justiça requisitou análise à Advocacia-Geral da União (AGU) sobre as seguintes questões: 1) se a Súmula Administrativa é instrumento hábil para declarar ato de exceção, de natureza exclusivamente política, Portaria editada pelo Ministro da Aeronáutica; e 2) se a referida Súmula vincularia o Ministro da Justiça.

Essas questões foram apreciadas pela Consultoria-Geral da União (CGU) inicialmente na NOTA PRELIMINAR N. AGU/JD-3/2003, a qual foi posteriormente renomeada por tratar-se entendimento definitivo, passando a ser denominada NOTA N. AGU/JD-10/2003.89

Quanto à primeira indagação, a CGU respondeu que a Portaria 1.104, por si só, não parecia configurar ato de exceção, especialmente em relação àqueles que ingressaram no serviço ativo da Força Aérea Brasileira após a sua edição. E, que para a configuração dessa espécie de ato, haveria de concorrer outros elementos externos, aptos a comprovar tratamento discriminatório, com motivação exclusivamente política. Então, somente após a análise acurada de cada caso concreto, é que a Comissão de Anistia poderia se manifestar com segurança por meio da Súmula Administrativa.

Quanto ao segundo ponto, restou afirmado que o Ministro da Justiça é quem é competente para a prática do ato de concessão de anistia, e, portanto, não estaria vinculado às decisões sumuladas da Comissão de Anistia. Veja trechos importantes dessa Nota:

  1. Assim, da análise do Boletim em questão, não se pode excluir a possibilidade de que, no momento do engajamento ou dos reengajamentos dos Cabos cujos nomes constavam do relatório do Inquérito Policial Militar referido, possam ter sido praticados atos de exceção de natureza política.
  1. De qualquer sorte, somente após a análise de cada caso concreto, observadas suas peculiaridades, é que a Comissão de Anistia pode se manifestar com segurança.

[…]

  1. Além disso, ainda que a aplicação da Portaria pudesse dar ensejo a algum tipo de discriminação, tendente a violar direitos das Praças que já haviam ingressado no serviço ativo da Força Aérea Brasileira ao tempo de sua edição, jamais poderia fazê-lo em relação àquelas que ingressaram após a sua edição.
  1. Ocorre que as Praças que ingressaram na Força Aérea após a edição da Portaria n.º 1.104, a ela se submetem originariamente de forma genérica e impessoal. A Portaria, em relação a essas Praças, é ato administrativo pré-existente destinado a regular a permanência no serviço militar. Não há como considerá-lo ato de exceção nessa hipótese.

[…]

  1. Por outro lado, é de se notar que a manifestação da Comissão de Anistia, nos termos do art. 12, da Lei nº 10.559, de 13 de novembro de 2002, que “regulamenta o art.   8º    do   Ato   das    Disposições    Constitucionais   Transitórias    e    dá   outras providencias”, deve ser entendida como ato de assessoramento do Ministro do Estado da Justiça, a quem foi atribuída competência para decidir a respeito dos requerimentos dos interessados, a teor do disposto no art. 10 da mesma Lei.
  1. Assim, a adoção da Súmula Administrativa pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça jamais teria o condão de vincular a decisão do Ministro de Estado, que pode, inclusive, diante de dúvidas recorrentes da interpretação dos fatos ou do direito, devolver a questão para que a referida Comissão, a quem incumbe assessorá-lo, possa complementar a análise do requerimento.
  1. Nada impede, portanto, que os casos analisados à luz da Súmula Administrativa nº 2002.07.0003, da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, sejam submetidos a exame complementar visando a apuração da ocorrência de eventual ato de exceção, sendo certo que a Portaria nº 1.1.04-GM3, de 12 de outubro de 1964, do Ministro da Aeronáutica, por si só, não configura ato da espécie, especialmente em relação àqueles que ingressaram no serviço ativo da Força Aérea Brasileira após a sua edição.

Com fulcro em interpretação conferida aos parágrafos acima colacionados, passou-se a negar os pedidos de anistia pautados na Portaria 1.104, cujos interessados tenham ingressado na Aeronáutica em período posterior a sua edição. E, o Ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos editou a Portaria n.º 594, de 12 de fevereiro de 2004, determinando a instauração de 495 (quatrocentos e noventa e cinco) processos de anulação de portarias em que foram reconhecidas as condições de anistiados políticos e concedidas as respectivas reparações econômicas em favor dos cabos que foram licenciados com fundamento na Portaria 1.104, mas ingressaram em data posterior a sua edição.

Vê-se que, em relação aos cabos que ingressaram na FAB em data anterior a da edição da portaria, qual seja 12 de outubro de 1964, entendeu a Comissão de Anistia que eles têm direito à anistia política, independentemente das pormenoridades do caso concreto. Nesse sentido, todo e qualquer ato de licenciamento com fundamento na referida portaria, decorrente da mera conclusão de tempo de serviço, é considerado automaticamente um ato de exceção, com motivação exclusivamente política, e enseja, portanto, anistia política.

Irresignada com essa interpretação e consequente atuação da Comissão de Anistia, a Consultoria-Geral da União elaborou a NOTA N. AGU/JD/1-2006, na qual elucidou-se que a NOTA N. AGU/JD-10/2003 apontava a necessidade de os requerimentos de declaração de anistia política serem analisados, um a um, para a aferição das circunstâncias que teriam dado ensejo ao licenciamento dos ex-cabos da FAB. Afirmou-se com veemência que, ao contrário do que propunha a Comissão de Anistia, a Portaria 1.104, tem caráter genérico e impessoal, não havendo razão para ser considerada ato de exceção de natureza política; que a circunstância do ingresso nos quadros da Força Aérea Brasileira ser anterior ou posterior à Portaria 1.104 não pode ser tomada como parâmetro para o fim de classificar-se o ato de licenciamento    como   ato   de   exceção   de   natureza   exclusivamente    política,   ou    não. Expressamente esclareceu:

  1. Apenas para lembrar, a NOTA Nº AGU/JD-10/2003, em nenhum momento, considerou a Portaria em questão como sendo ato de exceção, seja de natureza exclusivamente política, seja de qualquer outra natureza. Até porque ela não configura exceção à regra. Ao contrário, estabelece a regra geral, ela mesma.

Nessa senda, a AGU entendeu por adequada, legítima e justa a reavaliação dos pedidos já analisados com base apenas na data de ingresso nos quadros da Força Aérea Brasileira, sob pena de manter, supostamente, decisões administrativas carentes de fundamentação, calcadas em análises superficiais, que poderiam gerar inconformidades e sobrecarregar o Poder Judiciário; e das penalidades previstas na Lei n.º 8.112 e na Lei de Improbidade Administrativa.

Mesmo após a emissão da referida nota, a Comissão de Anistia não efetuou a revisão das anistias concedidas aos ex-cabos que ingressaram na força em data anterior a da edição da portaria.

Então, o Ministério da Defesa provocou a AGU e solicitou que a NOTA N.º AGU/JD/1-2006 fosse submetida ao Presidente da República para aprovação, de maneira a adquirir caráter vinculante e obrigar, também, a Comissão de Anistia.

Em resposta, a AGU elaborou a NOTA DECOR/CGU/AGU N.º 296/2009-PGO, de 01 de dezembro de 2009, da qual consta o entendimento que a submissão da NOTA N. AGU/JD/1-2006 ao Presidente da República não se revelaria como instrumento imprescindível para o alcance dos efeitos almejados pelo órgão consulente, fundamentalmente, a celeridade na apreciação das revisões dos atos de concessão de anistia política, a ser realizada pelo Ministro de Estado da Justiça.

Irredutível com a situação, a Consultoria Jurídica do Ministério da Defesa encaminhou a AGU, a NOTA N.º 112/2010/CONJUR/MD, destacando que nenhuma solicitação de revisão de anistia política de casos fundamentados apenas na disposição genérica da Portaria 1.104, sem apreciação do caso concreto, foi efetivada. E, informou que, em Aviso, de 03 de fevereiro de 2010, enviado pelo Ministro da Justiça ao Ministro da Defesa, sobre o tema, foi afirmado:

O Ministro da Justiça reconhece que os ex-cabos da Força Aérea Brasileira licenciados por motivação exclusivamente política em razão da conclusão do tempo de serviço com base na Portaria n.º 1.104/64 e outras legislações militares ordinárias, incorporados anteriormente à sua edição tem direito a anistia política nos termos da Lei n.º 10.559/2002.

Deste modo, o Ministério da Defesa questionou em que pé estaria a orientação ao Ministro da Justiça quanto à revisão das anistias, a partir de 2006, quando da prolação da NOTA N. AGU/JD 01/2006.

Assim que a AGU recebeu os questionamentos do Ministério da Defesa, informações foram solicitadas à Comissão de Anistia, que, em apertada síntese, esclareceu primeiramente que entende que não deve ser feita a revisão das anistias aos ex-cabos que ingressaram em data anterior a da edição da Portaria, e que todas as anulações, consideradas devidas, já haviam sido feitas. Sustentou que, em razão do princípio da segurança jurídica, não é cabível a instauração desses processos de revisão, vez que a questão não envolve ilegalidade, mas sim nova interpretação, alheia a da Comissão, que, portanto, não pode retroagir. Além disso, tendo em vista que as anistias em questão foram concedidas no período de 2002 a 2005, alegou decadência. Por fim, afirmou que ela e o Ministro da Justiça não estariam vinculados às manifestações de outros órgãos, tais como AGU e o TCU, e sugeriu que a Advocacia-Geral da União se pronunciasse acerca da legalidade da instauração desses processos revisionais.

Foi por meio do Parecer n.º 106/2010/DECOR/CGU/AGU, que a quaestio juris foi analisada. Nele restou consignado que a NOTA N. AGU/JD/1-2006 possui todas as características necessárias e suficientes para obstar a decadência do direito da Administração Pública de anular os atos eivados de vícios, e que, portanto, seria plenamente legal a revisão dos atos de concessão de anistia decorrentes de decisão genérica baseada na Súmula Administrativa n.º 2002.07.0003, da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça.

Por fim, a Advocacia Geral da União exarou a NOTA AGU/CGU/ASNG Nº 01/2011, em 15 de fevereiro de 2011, recomendando à criação de Grupo de Trabalho (GT), o qual veio a ser efetivamente instituído com a edição da Portaria Interministerial n.º 134, de 15 de fevereiro de 2011. Caberia ao aludido Grupo de Trabalho, composto por 5 (cinco) membros do Ministério da Justiça e 4 (quatro) da GCU, instaurar procedimento de revisão das portarias e promover todo e qualquer ato relacionado à execução da Portaria 1.104.

Segundo um do ex-cabos da aeronáutica, o GT seguiu anulando todas as portarias concessivas de anistia política, pois No meu caso, eles ‘falou’ assim (sic.) ‘oh, eu fui licenciado por tempo de serviço’; isso ‘tá’ lá no finalzinho do meu processo. Mas antes ‘tá’ falando que eu fui, ‘de acordo com a portaria 1.104, eu fui desligado’; só que eles não estão lendo isso não.

1.104, 1.104, não tem direito; eles não consideraram como ato de exceção mais, por isso que eles estão anulando.90

Ao ser questionado sobre qual justificativa o GT apresentava para tais anulações, o ex-cabo é enfático

Eles não estão justificando […] O que acontece é o seguinte: é que nós estamos, eu, Diniz, Dutra, analisando… e o que acontece é o seguinte: eles vão anular todo mundo. Os 2.500; quem quiser, entra na justiça. Se der bem, se não der, tudo bem. Eles fizeram o papel deles de anular […] A ideia que se tem é porque: quem fez o pedido para revisão das portarias, foi a Aeronáutica, e em todos eles, eles têm um atrasado para receber desde a época que eles foram desligados até hoje; tanto que até hoje eles não pagaram e se você for ver, 2.500 pessoas para pagar – com juros, correção monetária – é um dinheiro muito grande. Então, tem-se a ideia de que […], mas isso não se justifica […] Esse dinheiro foi disponibilizado há muitos anos.91

Atualmente, as atividades do Grupo de Trabalho Interministerial estão suspensas e sem previsão de renovação, uma vez que o Superior Tribunal de Justiça reconheceu a decadência do direito da Administração Pública em anular as anistias concedidas com fundamento na Portaria 1.104, e, ainda, não há decisão final do Supremo Tribunal Federal.92

Assim, a Comissão de Anistia prosseguiu apreciando o caso dos ex-cabos da FAB e encaminhando parecer ao Ministro da Justiça.

No dia 24 de fevereiro de 2017, esses anistiandos foram surpreendidos com publicação no Diário Oficial da União de cinquenta indeferimentos de pedidos de anistia de cabos que ingressaram na FAB antes da edição da Portaria 1.104.93

Todas as portarias de indeferimento foram assinadas pelo Ministro Interino da Justiça e Segurança Pública José Levi Mello do Amaral Júnior, responsável pela pasta até que fosse nomeado o titular desse cargo. O que mais chama atenção é que, a Comissão de Anistia havia proferido acórdãos favoráveis aos respectivos pedidos. Não obstante, o Ministro da Justiça, para tentar justificar a utilização de entendimento contrário àquele recomendado pela Comissão de Anistia, lançou mão do jurássico parecer da AGU de 2006.

O que fica clarividente de todo esse relato é que não há um consenso institucional a respeito da natureza jurídica da Portaria 1.104. Nos tópicos seguintes serão analisados os principais aspectos jurídicos que envolvem esse dissenso institucional.

 

3.2 – Exorbitância de competências

 

Em que pese a Advocacia Geral da União tenha competência para “fixar a interpretação da Constituição, das leis, dos tratados e demais atos normativos, a ser uniformemente seguida pelos órgãos e entidades da Administração Federal” e “unificar a jurisprudência administrativa, garantir a correta aplicação das leis, prevenir e dirimir as controvérsias entre os órgãos jurídicos da Administração Federal”94, estabelece o artigo 10 da Lei n.º 10.559/2002 que a atribuição exclusiva para reconhecer a condição de anistiado político, conceder os benefícios dela decorrentes, bem como exercer o controle de legalidade prévio de tais atos, é da autoridade do Ministro da Justiça.

Nesse contexto, compete à Comissão de Anistia, como órgão de assessoramento do Ministro da Justiça, examinar os requerimentos, buscando os elementos necessários à comprovação, ou não, da condição de anistiado político do interessado. Para isso, a Comissão possui notáveis poderes instrutórios, a propósito, veja-se o teor dos §§ 3º e 5º, do artigo 12 da Lei n.º 10.559/2002:

  • 3º Para os fins desta Lei, a Comissão de Anistia poderá realizar diligências, requerer informações e documentos, ouvir testemunhas e emitir pareceres técnicos com o objetivo de instruir os processos e requerimentos, bem como arbitrar, com base nas provas obtidas, o valor das indenizações previstas nos arts. 4o e 5o nos casos que não for possível identificar o tempo exato de punição do interessado.

[…]

  • 5º Para a finalidade de bem desempenhar suas atribuições legais, a Comissão de

Anistia poderá requisitar das empresas públicas, privadas ou de economia mista, no período abrangido pela anistia, os documentos e registros funcionais do postulante à anistia que tenha pertencido aos seus quadros funcionais, não podendo essas empresas recusar-se à devida exibição dos referidos documentos, desde que oficialmente solicitado por expediente administrativo da Comissão e requisitar, quando julgar necessário, informações e assessoria das associações dos anistiados.

Somado a isso, no § 1º, do artigo 12 da Lei de Anistia, buscou-se dar composição bastante heterogênea à Comissão, prevendo a participação da Administração Pública, bem como da sociedade civil, maior interessada neste processo de acerto de contas.

A composição da Comissão e o seu poder instrutório revelam a nítida vontade governamental de conceder anistia àqueles que, de fato, foram prejudicados pelo período de exceção.

Como uma iniciativa política fundamental para a “reconciliação nacional”, a instituição dessa Comissão objetiva simplificar o trâmite processual ao qual seriam submetidas as vítimas de atos de exceção na medida em que muitas das provas das violações foram destruídas ou restam ocultadas por órgãos do próprio Estado. É preciso ter em mente que a celeridade processual é um imperativo, haja vista que as violações a serem reparadas ocorreram em um passado remoto.

Outro aspecto que merece consideração é quanto aos seus conselheiros, que contam com uma razoável percepção histórica para avaliar os casos, que extrapolam questões técnicas. E, sobretudo, possuem a compreensão que as violações ao Estado de Direito e, mais gravemente, aos direitos individuais, ocorreram em contexto massivo, e nem sempre individualizado. A análise individualizada pelo Poder Judiciário, conduziria a resultados assimétricos e não teria o fundamental condão de reaproximar as vítimas ao Estado que as violou originalmente. É neste mesmo sentido que se manifesta Pablo Greiff:

[…] um programa de reparações não pode reproduzir os resultados que seriam obtidos no sistema jurídico, porque todos os sistemas jurídicos operam sob o pressuposto de que o comportamento de violação das normas é relativamente excepcional. Esse não é o caso em relação aos programas de reparações, pois tais programas tentam responder a violações que, longe de terem sido pouco frequentes e excepcionais, foram massivas e sistemáticas. As normas do sistema jurídico típico não estão concebidas para essa classe de situação.95

Tudo isso denota a importante missão que foi atribuída à Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, qual seja, instruir adequadamente o processo administrativo e emitir parecer acerca do enquadramento dos fatos narrados pelo cidadão às hipóteses legais previstas.

Por seu turno, a legislação atribuiu ao Ministro do Planejamento, Orçamento e Gestão o pagamento das reparações econômicas referentes às anistias concedidas a civis. Tratando-se de anistias concedidas aos militares, as reparações econômicas são efetuadas pelo Ministro da Defesa.

A partir da delimitação das competências acima, vê-se que a atuação da Advocacia-Geral da União deveria restringir-se a analisar aspectos de legalidade, não lhe competindo, tendo em vista a necessária análise dos aspectos políticos que envolvem a questão dos ex-cabos da FAB, afirmar o que deve ou não ser considerado ato de exceção por motivação exclusivamente política.

De certa forma a NOTA N. AGU/JD-10/2003 é contraditória, tendo em vista que, ao mesmo tempo que afasta a competência da Comissão de Anistia para decidir o que é ato de exceção, determina que a Portaria 1.104, por si só, não pode ser considerada ato de exceção.

Já a NOTA N. AGU/JD-1/2006 é carente de idoneidade, uma vez que, extrapolando o limite das suas competências, faz um apanhado simplório e legalista para afirmar que a Portaria 1.104 não introduziu regime de exceção jurídica. Não há uma linha sequer da mencionada manifestação que analise a existência, à época, de desnecessidade de permanência dos cabos no serviço ativo. E não existiria, pois, como exposto no segundo capítulo, consta do Ofício n.º 04 que o “problema dos cabos” não era devido à quantidade, ao número de cabos; ou à economia, mas, sim à “demagogia aliada aos interesses escusos”.

Em contrapartida, as conclusões da Comissão de Anistia pela perseguição perpetrada contra os ex-cabos, estão balizadas na análise de documentos sigilosos da Aeronáutica, os quais demonstram que a cúpula golpista da FAB, temendo que resquícios das lutas dos subalternos de 1963 sobrevivessem, elaborou um plano para expulsar os cabos, concretizado com a edição da Portaria 1.104. Portanto, os aspectos políticos e históricos que envolve o caso dos ex-cabos não podem ser preteridos.

Ademais, não há possibilidade de se falar em normalidade jurídica em período de exceção política.

Após anos de luta por reparação, tal postura da AGU implica em quebra do processo gradativo de reconciliação nacional e de resgate da confiança pública daqueles que viram seus próprios pares agirem para destruir seus projetos de vida.

  • incompreensível e injustificável para os ex-cabos, a negativa de conotação eminentemente política à Portaria 1.104. Foi visto que os acontecimentos que estão na gênese dessa Portaria até precipitaram a queda João Goulart. Essa resistência institucional ignora a realidade e a história, e acaba por ampliar a flagrante violação ínsita na morosidade do Estado em cumprir com o seu dever de reparar.

Por essas razões, isto é, tendo em vista o caráter eminentemente político e histórico e não jurídico que envolve o caso dos ex-cabos da FAB, é impróprio a AGU adentrar nesses aspectos.

 

3.2.1 – O posicionamento do Tribunal de Contas

 

Ainda a respeito da delimitação de competências, importa mencionar o posicionamento do Tribunal de Contas da União.96

Essa Corte entende que, embora da concessão de anistia decorram efeitos financeiros, a decisão do Ministro da Justiça sobre a concessão ou não de anistia é ato eminentemente político, que segue procedimento administrativo próprio e que não se sujeita ao controle da legalidade, tanto pelo controle interno quanto pelo controle externo.

Insta destacar que foi à própria manifestação da AGU, que hoje escrutina mérito decisório sobre caracterizar ato enquanto de exceção ou não, que convenceu a Corte de Contas do equívoco de imiscuir-se em questões de mérito quanto aos atos de anistia, invadindo esfera de competência exclusiva do Ministro da Justiça. A respeito disso confira trecho do voto do Ministro Relator:

Após ouvir atentamente a sustentação oral do Representante da Advocacia-Geral da União convenci-me que falece competência a esta Corte para deliberar sobre o mérito  das  anistias  concedidas  pelo  Governo  Federal,  por  meio  de  decisão  do Ministro de Estado da Justiça, assessorado pela comissão de anistia. Entendo tratar-se de matéria de cunho eminentemente político, não sujeita à revisão desta Corte, que não pode se substituir ao juízo formulado pelo Ministro da Justiça, ainda que dele resulte despesa pública.

[…]

E a razão é muito simples: o juízo acerca da existência ou não de ato de exceção é juízo eminentemente político, como indica o próprio nome: anistia política. A conotação política do ato não se cinge apenas à concessão de anistia, mas antecede. O cunho político da decisão do Ministro da Justiça reside na declaração da existência de ato de exceção. O que daí advém é a reparação do dano causado ao perseguido.97

De igual monta, tentar restringir a aplicação do art. 8º do ADCT por meio da submissão do juízo político formulado pelo Ministro da Justiça ao controle de “legalidade” a ser exercido pelo TCU viola o objetivo da norma e cria procedimento não previsto em lei.

 

3.3 – O posicionamento do Poder Judiciário

 

  • importante consignar que o entendimento da Comissão de Anistia e do Ministério da Justiça à época ao deferir requerimentos de anistia de ex-cabos da Aeronáutica licenciados pela Portaria 1.104 estava em consonância com decisões adotadas pelo Poder Judiciário.

Especialmente em 2002, quando do reconhecimento pela Comissão de Anistia da excepcionalidade e motivação política da Portaria 1.104, já vigoravam jurisprudências devidamente assentadas sobre o tema, como por exemplo, a Apelação Cível n.º 93.02.10938/RJ. Nesse julgado, a Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por unanimidade, em 29 de fevereiro de 2000, acompanhou a Relatora Desembargadora Federal Tanyra Vargas de Almeida Magalhães, a qual declarou que o ato administrativo referente ao licenciamento está submetido ao princípio da legalidade, com imprescindível motivação, ou seja, à demonstração de que a desnecessidade de permanência no serviço ativo existia, sob pena de se convolar em ato arbitrário. Valendo-se de uma interpretação sistemática, a magistrada concluiu que a Portaria 1.104 possui evidente desiderato punitivo e teve como motor a perseguição daqueles considerados suspeitos de práticas revolucionárias.

No mesmíssimo sentido é o acórdão proferido pela Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, quase uma década antes do posicionamento da Comissão de Anistia, em 04 de agosto de 1993, na Apelação Cível n.º 92.02.10759-9/RJ. Neste processo, em razão da Portaria 1.104, cabos foram excluídos dos quadros da FAB, em 10 de janeiro de 1967, quando contavam com 10 (dez) anos de serviços prestados.

A amostra da jurisprudência acima diz respeito a decisões anteriores à feitura da súmula administrativa sobre a matéria pela Comissão de Anistia, e do início do acolhimento de pareceres consultivos do órgão pelo Ministro da Justiça, o que demonstra a linha que o judiciário poderia a adotar sobre a matéria.

Agora, as questões submetidas ao Poder Judiciário tratam, em geral, da revisão das anistias daqueles que ingressaram em data posterior a da edição da Portaria 1.104, e da formalizada pela Portaria Interministerial n.º 134. No primeiro caso, entende-se que não há que se falar em ato de exceção, tampouco em perseguição política, visto que a norma se reveste de conteúdo genérico e impessoal, apenas regulando o licenciamento por conclusão do tempo de serviço permitido. Já no tocante ao segundo, o Judiciário tem reconhecido a ocorrência de decadência quanto à possibilidade de anulação do benefício da anistia concedido, e entende que os cabos incorporados anteriormente à vigência da Portaria 1.104 fazem jus à anistia, pois teriam sido prejudicados com a restrição de direito anteriormente concedido, sendo certo que a motivação do ato teria sido exclusivamente política.98

 

3.4 – Portaria n.º 134/11, Grupo de Trabalho Interministerial: cauda de legalidade autoritária

 

A Advocacia-Geral da União subverte o direito ao evocar a Lei n.º 9.784, de 29 de janeiro de 1999, que regula processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, para recomendar a criação de um Grupo de Trabalho para instaurar procedimento de revisão das portarias.

Cabe à Comissão de Anistia rever os próprios atos quando identifica erros de fato ou de direito em seus julgamentos. Ocorre que, no caso dos ex-cabos da Aeronáutica, a Comissão recusou-se a proceder à revisão das anistias, vez que tem firme convicção do direito dos ex-cabos à anistia.

Não obstante a isso, como relatado, um Grupo de Trabalho, composto por membros da Advocacia-Geral da União e do Ministério da Justiça, mas não por membros da Comissão, foi criado para revisar as anistias.

O mesmo argumento de legalidade, outrora usado na repressão, retorna aos tempos democráticos.99 A criação do GT pela Portaria n.º 134/11 mostra-se como um ato de exceção às regras adotadas pelo Estado brasileiro para conceder anistias e eventualmente revisá-las.

 

Considerações finais

 

Formalmente este é o fim desta pesquisa, mas não parece apropriado concluir ou realizar considerações finais se discursos continuarão a disputar o sentido da anistia. O embate travado na concessão da anistia política aos ex-cabos da Força Aérea Brasileira continuará nas ações propostas ante o Judiciário, nas análises da Comissão de Anistia, nas ingerências do Ministério da Defesa e da Advocacia Geral da União, nas políticas de memória e etc. Não é possível, seguramente, apontar um sentido definitivo para a anistia política desses ex-cabos, haja vista que toda hegemonia é provisória, não tendo como não ser superada. Assim, as pretensões dogmáticas dos estudos jurídicos não prosperam, vez que são constantemente alvejadas pelos embates sociais, tendo que atender a novas demandas, e consequentemente alterar-se para o oferecimento de outra resposta jurisdicional. Por isso, ao menos espera ter-se aproximado do “fim”.

O desenvolvimento desta pesquisa levou a uma reflexão sobre o próprio ofício de pesquisar, nas opções tomadas para atribuir coesão ao texto, nos cortes que inevitavelmente subtraem sentidos e caminhos de pesquisa, na utilização das palavras enunciativas e nas relações de poder que elas encerram.

A análise realizada no terceiro capítulo alijada da densa narrativa empreendida no segundo cria um campo tenso, um espaço de disputa ideológica em que os discursos se contrapõem diretamente, buscando o expurgo do outro, pondo as instituições como inimigas, como um outro que está destituído do discurso de verdade. Assim, redobrada foi a responsabilidade com a análise desses discursos que estão em busca de uma dominação.

Este trabalho foi envolto em grandes dificuldades. Uma, que de início pode ser citada, decorre de uma qualidade do caso: sua nevralgia. O fato de o caso em análise ter ficado no centro de acirradas discussões institucionais trouxe um excedente de dados que mereceram atenção. Além do mais, o contorno surpreendente dado a questão pelo Ministro Interino da Justiça em fevereiro deste ano, mostrou que o tema estava em constante movimentação, demandando o acompanhamento de seus eventuais desdobramentos, assim como atualização constante por meio de novas leituras. Desta feita, a nevralgia e atualidade do caso dos ex-cabos da FAB, ao mesmo tempo em que justificaram a realização da pesquisa, carregaram consigo dificuldades de difícil superação.

Ainda, vale ressaltar que o cenário da pesquisa tornou-se mais embaraçoso devido ao desmonte que tem sofrido a Comissão de Anistia. Desde a sua criação no governo FHC, a Comissão é composta por conselheiros e conselheiras com grande histórico de atuação na área dos direitos humanos, mantendo-se, ao longo do tempo, a integralidade dos seus membros e as composições advindas de tempos anteriores. Os eventuais desligamentos de conselheiros sempre ocorreram por iniciativas pessoais dos próprios membros, sendo substituídos gradativamente. Além disso, novas nomeações sempre foram precedidas por um processo de escuta social. Acontece que, recentemente, e pela primeira vez, foram nomeados novos membros sem nenhuma consulta à sociedade civil e exonerados coletivamente membros que não solicitaram desligamento. Ao fazer isso, o governo Temer coloca a perder quase uma década de memória e de expertise na interpretação e aplicação da legislação de anistia no Brasil. Tal iniciativa afeta a continuidade da agenda pendente do processo de transição, referida nesta pesquisa, e, inevitavelmente reflete no caso em questão.

Em nenhum momento, neste trabalho, partiu-se de uma suposta neutralidade, buscou-se sempre deixar claro quem falava e de onde se falava. Os trechos de entrevistas aqui colacionados não são à toa, pois o que é pronunciado ou escutado é “a palavra carregada de um conteúdo ou de um sentido ideológico ou vivencial”.100

Dito isso, algumas considerações “finais” podem ser feitas a respeito dessa pesquisa.

Embates em favor da anistia estiveram presentes desde o início do regime imposto em 1964. Tiveram início com uns poucos expoentes do meio político e intelectual, passaram por uma trajetória ascendente dentro da sociedade, e ao final envolveram boa parte dos brasileiros. Protestavam por uma “anistia ampla, geral e irrestrita”, mas a anistia possível foi parcial e restrita. Como reza a tradição autoritária, praticamente não houve troca de ideias com a sociedade, tampouco com os potenciais beneficiários da legislação. A escassa disposição para o diálogo tornou-se evidente quando da apreciação das emendas ao projeto, no Congresso Nacional.

Embora de grande significância para o processo de redemocratização do Brasil, a anistia de 1979 ficou restrita aos limites estabelecidos pelo regime militar, e não fez justiça a todos aqueles que foram afetados pelas arbitrariedades. Assim, embora não aceitas naquele primeiro momento, diversas iniciativas foram tomadas visando ampliar esse benefício. Somente em 1985, o Executivo tomou a iniciativa de mexer na anistia, a conjuntura era de governo civil, o primeiro após 21 anos de ditadura militar, mas os militares ainda retinham muito poder. Então, a anistia de 1985 se manteve muito próxima à original. Foi com a Constituição de 1988 e com a Lei n.º 10.559/02 que a dimensão da anistia foi ampliada, contudo, acredita-se que ainda há muito a se fazer e que, portanto, a luta pela anistia é um processo inconcluso.

Nesse âmbito de inconclusão, pendências, mostrou-se oportuno trazer à baila o caso dos ex-cabos da FAB. Primeiramente, analisou-se a memória criada em torno dos fatos pré-golpe por aqueles que viriam engendrar os desligamentos dos cabos da Aeronáutica. A perspectiva do alto escalão das Forças Armadas foi confrontada com a historiografia sobre o caso. “O problema dos cabos” surge com as reivindicações por direitos, como o de casar, de ter o corte de cabelo menos rígido, de andar à paisana, de votar. Essas reivindicações, somadas a outras ações tidas como subversivas, contrariavam à hierarquia e disciplina castrenses. Em decorrência do momento político do Brasil, tudo isso tornou-se motivo de grande preocupação entre os oficiais. Com a finalidade de afastar os organizadores do movimento e esfriar os ânimos dos praças elaborou-se a Portaria 1.104 que, ao limitar o tempo de serviço dos cabos em oito anos de serviço, impediu-os de alcançarem a estabilidade aos dez anos de serviço, tolhendo sua permanência nos quadros da Aeronáutica.

Do trabalho empreendido no terceiro capítulo, percebe-se uma conexão entre o modo operante do regime autoritário e algumas práticas institucionais pós redemocratização. Acredita-se que a transição política propalada como acordada e consensuada, foi uma transição controlada pelos militares que não queriam abdicar do poder sem antes garantir um largo espaço de influência e a certeza de que não haveria retaliações posteriores. Se assim foi na criação da anistia, de igual modo foi na sua implementação. Além disso, viu-se que os militares permanecem exercendo um papel de influência nas instituições, o que se identifica como sendo um legado autoritário do regime de exceção de 1964.

Nesse trabalho interessou a temática da anistia política, instrumento que, dentre outras coisas, serve para compensar os danos que a vida nua do perseguido político sofreu, sendo descabido as posições institucionais do Ministério da Defesa e da AGU que vão de encontro ao labor da Comissão de Anistia e, principalmente, à Constituição.

Por fim, uma última consideração que merece ser feita é que ao que tudo indica, a Justiça de Transição brasileira parece trabalhar em um tempo próprio, ignorando a exata razão de sua existência e se esquecendo da própria temporalidade da vida, em afrontoso descaso quanto à finitude existencial do ser humano. O caso tratado aqui atravessa gerações sem alcançar uma decisão segura juridicamente e que promova a paz social.

De forma diversa do que se pode apressadamente concluir, não são propriamente as pessoas que têm pressa. É a essência da própria vida que determina uma existência humana extremamente curta e, portanto, completamente incompatível com o tempo da Justiça.

Foi nessas águas obscuras que se lançou este estudo.

 

Referências Bibliográficas

 

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Anexo

 

1 – Fundamentação do voto condutor da edição da Súmula Administrativa n.º 2002.07.0003 da Comissão de Anistia;

2 – NOTA N. AGU/JD/1-2006.

A FUNDAMENTAÇÃO DO VOTO CONDUTOR DA EDIÇÃO DA SÚMULA ADMINISTRATIVA FAZ A DEMONSTRAÇÃO HISTÓRICA DA PORTARIA Nº 1.104-GM3/FAB.

A PROPOSTA DE ENUNCIADO ADMINISTRATIVO

 

PROCEDIMENTO DIVERSO N.º 2002.07.0003 – CA

 

PROPONENTE CONSELHEIRO PRESIDENTE DA COMISSÃO DE ANISTIA O  CONSELHEIRO  JOSÉ  ALVES PAULINO  (PRESIDENTE): Senhores Conselheiros.  Tratam-se  de  inúmeros  Requerimentos  de  Anistia formulados  por  anistiandos,  que  foram  desligados  e  excluídos ex officio do quadro de graduados da Força Aérea Brasileira – Cabo – por força da Portaria n.º 1.104/GM-3, de 12 de outubro de 1964, que tiveram como motivação o OFÍCIO RESERVADO n.º 4, de 4 de setembro de 1964 – elaborado pelo Grupo de Trabalho, constituído  pela  Portaria  n.º  16,  de  14  de  janeiro  de  1964, modificada pela Portaria n.º 140, de 25 de fevereiro de 1964, encaminhado ao Sr. Ministro da Aeronáutica, por intermédio do Estado-Maior  do  Ministério  da  Aeronáutica  –,  e  o  Boletim Reservado  n.º  21,  de  11  de  maio  de  1965,  publicado  pela Diretora de Pessoal do Ministério da Aeronáutica, por força do Ofício Reservado  n.º 14/GM-2/S-070/R,  de  9 de abril  de  1965, expedido  por  determinação  do  Exmo.  Sr.  Chefe  do  Gabinete  do Ministro  da  Aeronáutica,  pelo  qual  remeteu  os  autos  do Inquérito  Policial  Militar  instaurado  na  Associação  de  Cabos da Força Aérea Brasileira.

  1. Todos os requerentes alegam a natureza exclusivamente política da Portaria nº 1.104, pois estava sob a égide da Portaria nº 570/GM, de 23 de novembro de 1954, editada com base na Lei do Serviço Militar nº 1.585, de 28 de março de 1952, que regulamentava a Permanência dos Praças no Serviço Ativo, concedendo reengajamentos sucessivos até que os mesmos atingissem a conclusão do tempo, passando para a reserva ou inatividade remunerada. Solicitam a esta Comissão de Anistia os direitos previstos no Regime do Anistiado Político, instituídos pela Media Provisória n.º 2.151-3, de 24 de agosto de 2001.
  1. Em face disso submeto à deliberação do Plenário a seguinte fundamentação.
  2. Esclareça-se que na pasta de registros da Comissão de Anistia podem ser manuseados os documentos e legislação pertinentes mencionados neste trabalho.
  3. A Portaria n.º 1.103/GM-2, de 8 de outubro de 1964, expulsou cabos e taifeiros da Fileiras da Força Aérea Brasileira, com base no que foi apurado pelas investigações sumárias de que trata o Decreto n.º 53.897, de 27 de abril de 1964.
  1. A Portaria n.º 1.104/GM-3, de 12 de outubro de 1964, aprovou novas instruções para as prorrogações do Serviço Militar das Praças da Ativa da Força Aérea Brasileira, desligando ex officio os cabos da Força Aérea Brasileira, revogando expressamente em seu art. 2.º a Portaria n.º 570/GM-3, de 23 de novembro de 1954, bem como “todos os atos” que colidam com essas novas instruções.
  2. Em 23 de novembro de 1954, o Sr. Ministro da Aeronáutica editou Portaria n.º 570/GM-3, que regulava a permanência em serviço ativo dos Sargentos, Cabos, Soldados e Taifeiros do Corpo de Pessoal Subalterno da Aeronáutica, de acordo com o estabelecido nos arts. 82, 86, 87, 88 e 89 do Decreto-Lei n.º 9.500, de 23 de julho de 1946, alterados pela Lei n.º 1.585, de 28 de março de 1952.
  1. A Portaria n.º 570/GM-3 permitia o engajamento, ou seja, prorrogação do tempo inicial, concedida aos sargentos e cabos pelo prazo de 3 (três) anos e o reengajamento, prorrogação de permanência em serviço ativo concedida às praças anteriormente engajadas.
  1. Esclareça-se que a Portaria n.º 570 previa os reengajamentos sucessivos aos cabos, sargentos e taifeiros, até que os mesmos atingissem a conclusão de tempo de serviço para a reserva ou a inatividade remunerada, desde de que obedecidos os requisitos da legislação militar pertinente.
  1. Com a deflagração do Movimento Revolucionário de 1964 a Portaria n.º 570 foi revogada com a edição da Portaria n.º 1.104, que teve como motivação os termos contidos na PROPOSTA – Ofício Reservado n.º 4, de setembro de 1964.
  2. O Ofício Reservado n.º 4 foi encaminhado ao Senhor Ministro da Aeronáutica, por intermédio do Estado-Maior da Aeronáutica que, por determinação, apresentou estudo para rever e atualizar as instruções que estavam estabelecidas pela Portaria n.º 570/GM-3, de 23 de novembro de 1954.
  3. O conteúdo deste Ofício Reservado é um dos elementos que inicia e compõe o conjunto harmônico de provas que evidenciam efetivamente a motivação exclusivamente política na expulsão, desligamentos e licenciamentos ex officio de cabos com base nas Portarias 1.103 e 1.104, dando efeitos retroativos ao revogar expressamente a Portaria n.º 570.
  4. Depreende-se da leitura do Ofício Reservado n.º 4 que a idéia era renovar a corporação como estratégia militar, evitando-se que a homogênea mobilização de cabos eclodisse em movimentos considerados subversivos, pois  havia descontentamento  dentro   da  corporação  da   FAB  com   os acontecimentos políticos do país.
  1. Cabos da Força Aérea Brasileira, teve participação direta no movimento popular que culminou com o confronto de policiais e civis no Sindicato de Metalúrgicos do Rio de Janeiro, nos dias 25, 26 e 27 de março de 1964, tendo sido instaurado inquérito policial contra todos os militares que foram presos, conforme fls. 181, letra f, do Boletim Reservado n.º 21.
  1. A principal questão preliminar de mérito que deve envolver a Comissão na análise dos requerimentos de anistia é a aferição se as Portarias 1.103 e 1.104 foram editadas, por “motivação exclusivamente política”, como meio de se atingir os cabos que se encontravam na Força Aérea Brasileira pelos fundamentos que passa a expor.
  1. Não obstante, várias outras questões jurídicas, primordialmente, pudessem ser levantadas e discutidas quanto a análise do mérito da edição das referidas Portarias, estar-se-
  • nos afastando do tema principal, face a legitimidade as quais foi conferida pelo Regimento Interno da Comissão de Anistia, aprovado pela Portaria n.º 671, de 2 de agosto de 2001 do Sr. Ministro da Justiça, qual seja apreciação dos requerimentos de anistia quanto a motivação exclusivamente política.
  1. Contudo, não se pode se furtar a uma análise mais profunda, sob pena de se fragilizar o estudo, pois as questões poderão formar o livre convencimento do Colendo Colegiado, com ponderações e argumentações imparciais, consubstanciados com elementos probatórios.
  1. Assim, prima facie, cumpre esclarecer que quando da expedição da Portaria n.º 1.104/64-GM-3, os cabos estavam amparados pela Portaria n.º 570/54, que lhes assegurava reengajamentos sucessivos até que fosse implementado o tempo de serviço, com o qual estaria garantida a permanência na carreira militar definitivamente, por estarem no cumprimento sucessivo de engajamento e reengajamento.
  2. A Portaria n.º 1.104 não deveria atingir os cabos que já estavam na corporação, dando efeitos retroativos a uma medida tão drástica, uma vez que os direitos dos mesmos se encontravam assegurados em razão dos reengajamentos previstos na Portaria n.º 570. Poderia, talvez, referida portaria atingir aqueles que entraram na graduação de cabos após a edição da Portaria n.º 1.104 e que não se encontravam sob a égide da Portaria n.º 570, pois os sucessivos engajamentos e reengajamentos não lhe dariam condições de implementar os 8 (oito) anos exigidos.
  1. As ponderações acima se fazem necessárias a fim de se evidenciar, neste momento, que os motivos que levaram a edição das referidas Portarias era atingir, principalmente, os cabos que já se encontravam na corporação da Força Aérea Brasileira.
  2. Caso contrário, o Comando Superior da Força Aérea Brasileira teria adotado até regras de transição, resguardando as praças – no caso em análise os cabos –, dos enormes prejuízos evidenciados, ou ainda, não teria sequer dado eficácia a restrições aos reengajamentos que atingissem turmas anteriores a publicação da Portaria n.º 1.104.
  1. A título de ilustração, cabe transcrever trecho do Ofício Reservado n.º 4 em que o próprio Grupo de Trabalho constituído para buscar soluções adequadas ao problema dos cabos, assim menciona naqueles documentos, dispõe sobre os evidentes prejuízos sobre as restrições às prorrogações dos cabos na FAB, in verbis:

Evitar que outros cabos com muitos anos de serviço sem possibilidade de acesso.

A providência pode ser alcançada de duas maneiras. Uma delas é estabelecer, por exemplo, que tem mais de x anos de serviço e menos que x não reengajará.

A outra é obter o desejo, permitindo uma fase de transição. A primeira é drástica e, embora legal, acarretará prejuízos, porque muitos obtiveram prorrogações de tempo na suposição de que poderiam servir até os tempos limites. Essa solução drástica não

  • aconselhável quando, entre outros motivos, por exigir uma previsão numérica proporcionalizada e por acarretar aceleração nem sempre possível do recompletamento através dos cursos de cabo (…).
  1. Observa-se, nitidamente, da análise das disposições da Portaria n.º 1.104 que as prorrogações de tempo de serviço, licenciamentos dependiam de requerimento dos interessados, ou seja, havia apenas uma possibilidade ilusória, pois que ficava na faculdade exclusiva das autoridades da Aeronáutica e concessão dos mesmos, muitas vezes, a sua denegação ficava sem a menor justificativa plausível.
  1. Não se deve falar que a Portaria n.º 1.104 tratou-se de ato discricionário, pois no momento em que se instalou o regime ditatorial o liame que os separa dos atos arbitrário se torna tênue o suficiente para evidenciar flagrantes injustiças, mais ainda quando o rompimento democrático do país se deu justamente pelas forças das autoridades responsáveis pelos atos tidos como discricionários, mas de evidentes arbitrariedades.
  1. Para elucidar o momento histórico permite-se consultar o site mural da história/atos institucionais, onde se tem com riquezas de informações o sofrimento vivido pelos brasileiros.
  1. Momento que indagamos na atualidade se ocorreu no Brasil, diante das injustiças e atrocidades cometidas por nossas autoridades, que tinha o dever legal e constitucional de zelar pela segurança da população.
  1. Falar em ato discricionário de forma isolada como definição legal causa aberração jurídica. Tem-se que analisar todos os atos de forma sistêmica, conjugados com elementos de provas, capazes de chegar em um processo por ilação.
  1. Cabe, indubitavelmente à Comissão de Anistia analisar de maneira profunda a motivação exclusivamente política, sob pena de se olvidar da competência que foi atribuída pela Medida Provisória n.º 2.151-3. A título de argumentação cabe frisar algumas colocações históricas, a fim de situar-se o momento em que se deve prender para analisar os atos que resultaram na edição de referidas Portarias.
  2.  

promoveu-se a segurança para o Estado”, à custa de sangue e lágrimas para milhares de famílias brasileiras.

  1. O preço foi alto, lares brasileiros, foram rompidos pelos “atos desumanos de autoritarismo e repressão: as publicações censuradas, as contestações armadas reprimidas com torturas e execuções, políticos cassados”.
  1.  
  1. Vê-se, que o momento histórico vivido, impossibilitava os cidadãos de recorrer ao Judiciário para ver ao menos questionadas as suas pretensões, em face das suspensões dos direitos e garantias individuais.
  1. Imaginem ao se tratar de questionamentos de atos administrativos emanados de autoridades militares!
  2. Não resta dúvida sobre a análise profunda a que se deve curvar, tomando-se relevo o nascedouro de tais medidas, ou de tais portarias.
  1. Assim, outro documento de grande importância para o desfecho e caracterização da motivação exclusivamente política dos atos que antecederem a Portaria n.º 1.104, é o Boletim Reservado n.º 21, de 11 de maio de 1965, emanado por ato do Sr. Ministro da Aeronáutica Eduardo Gomes.
  1. Tal Boletim teve origem no Ofício Reservado n.º 14/GM-2/S-070/R, de 9 de abril ele 1965, em que o Sr. Chefe elo Gabinete do Ministro, encaminhou à Diretoria ele Pessoal os autos do inquérito Policial Militar instaurado na Associação dos Cabos da Força Aérea Brasileira, do qual foi encarregado inicialmente o Cap. Av. Marialdo Rodrigues Moreira, e posteriormente o Exmo. Sr. Marechal do Ar Hugo da Cunha Machado, que apurou atividades subversivas.
  1. É incontroversa a motivação exclusivamente política verificada naquele documento.
  2. A título de ilustração transcreve-se trechos daquele Boletim, in verbis:

Neste Inquérito Policial Militar, instaurado por solicitação do Comando da Base Aérea de Santa Cruz, foram apuradas  as  atividades  subversivas  da     entidade denominada  'ASSOCIAÇÃO  DOS  CABOS   DA  FORÇA  AÉREA BRASILEIRA' (ACAFAB).

E os fatos apurados atestam que a entidade foi criada sem autorização do Ministério da Aeronáutica:

  • vem utilizando indevidamente o nome da Força Aérea Brasileira;
  • que sua Diretoria tomava parte ativa em reuniões e atividades subversivas;
  • que desenvolve atividades ilícitas, contrárias ao bem público e a própria segurança nacional;
  • que, através de reuniões subversivas na entidade era tramada a deposição do ex-Presidente da República e seguidas, in totem, as teses contrárias ao regime, do então deputado Leonel Brizola;
  • que teve participação direta nos acontecimentos subversivos, que foram levados a efeito no Sindicato dos Metalúrgicos (…).
  1. Vê-se, principalmente neste último item, que a perseguição política teve início no movimento popular no Sindicato dos Metalúrgicos, onde Associação dos Cabos da Força Aérea Brasileira teve participação direta, conforme anterior-mente mencionado.
  2. Golpe Militar de 1964 teve como força a perseguição política aos cabos da FAB, que eram suspeitos de atividades revolucionárias, tendo culminado com as edições das Portarias 1.103 e 1.104, bem como a própria suspensão das atividades e posterior extinção da referida Associação.
  1. Ainda, transcreve-se do Boletim Reservado n.º 21:

(…) conclui o encarregado deste Inquérito Policial Militar (…) que a ASSOCIAÇÃO DOS CABOS DA FORÇA AÉREA BRASILEIRA, registrada sob esse título, contrariando as Autoridades do Ministério da Aeronáutica, uma vez que essa denominação – ‘DE CABOS DA FORÇA AÉREA BRASILEIRA’ – envolve o nome da corporação e se presta a explorações política. É recomendável que sejam tomadas medidas para prevenir que se organizem outras entidades, de caráter tendencioso e no a 'ACAFAB' e a 'CASA DOS CABOS DA AERONÁUTICA DE SÃO PAULO' (fls.538),  associação  de  caráter  civil  organizada por graduados  da  Força  Aérea  Brasileira,  que devem ser mantidas sob vigilância  para  evitar que se degenerem

(…).

(…) ditos militares são referidos no relatório de fls. 574 e terão que ser, quando em engajamento ou reengajamento, objeto de exame cuidadoso, primordialmente no que se relaciona com o comportamento militar e civil.

Também atendendo, ao sugerido no relatório de fls. 574, resolvo proibir, expressamente, sejam feitos, em folhas de pagamento, desconto em favor da ASSOCIAÇÃO DOS CABOS  DA  FORÇA  AÉREA  BRASILEIRA,  da  CASA  DOS  CABOS  DA AERONÁUTICA  DE   SÃO   PAULO      e   de   qualquer      outras associações  de  caráter  civil,     organizadas  por     Cabos pertencentes a Aeronáutica.

(…) DETERMINO aos Senhores Comandantes de unidades procedam ao fechamento sumário e imediato de todas as sucursais da denominada ASSOCIAÇÃO DOS CABOS DA FORÇA AÉREA BRASILEIRA, que, por ventura, ainda estejam em atividades.

(…) RESOLVO sejam pedidos informações ao Excelentíssimo Senhor Comandante da 4ª Zona Aérea a respeito das atividades da denominada CASA DOS CABOS DA AERONÁUTICA DE SÃO PAULO’, devendo ser ao meu Gabinete remetidas Estatutos e relatados todos os fatos atinentes à mesma.

(…)  a     ‘ASSOCIAÇÃO  DOS  CABOS  DA  FORÇA  AÉREA BRASILEIRA’, já tendo suas atividades suspensas por seis meses, pelo Decreto Presidencial n.º 55.629, publicado no Diário Oficial de 28 de janeiro de 1965, deve, face à sua periculosidade, ser extinta, como o foi sua congênere ASSOCIAÇÃO DOS CABOS E MARINHEIROS.

A extinção completará a série de medidas adotadas pelas autoridades federais para erradicar do meio social e sobretudo das classe militares dos organismos subversivos.

Impõe-se a medida contra a ‘ASSOCIAÇÃO DOS CABOS DA FORÇA AÉREA BRASILEIRA’, que, valendo-se das garantias constitucionais que asseguram a liberdade de associação de palavra, de imprensa e das demais que caracterizam o regime democrático em que vivemos, pretendeu fazer letra morta das disposições que condicionam tais liberdades a licitude das suas finalidades.

(…) Solicito, também, que os Senhores Comandantes de Unidades da Força Aérea Brasileira esclareçam com brevidade se outras entidades de cabos da Força Aérea Brasileira têm presentemente atividade.

(…) Envie-se este IPM na observância do § 1.º do art. 117 do Código de Justiça Militar à Diretoria-Geral de Pessoal da Aeronáutica, para que providencie a respeito de todas as determinações ora feitas e para que promova a efetivação das punições disciplinares.

Recomendo, ainda, que a Diretoria-Geral do Pessoal da Aeronáutica ponha  em    execução todas as  ordens    ora expedidas, apresentado com  toda a  brevidade sugestões para Avisos, ou outras medidas, caso sejam necessários e imprescindíveis(…).

  1. Portanto, pode-se deduzir que a principal finalidade da Portaria n.º 1.103 e 1.104 era punir de forma arbitrária, com um ato de aparente legalidade, ou discricionariedade, motivada por questão exclusivamente política, os cabos que se encontravam na corporação, principalmente aqueles que mantinham ligações com referidas Associações.
  1. Corroborando as ponderações acima transcritas traz-se a colação Declaração onde consta um testemunho voluntário do Major Brigadeiro Rui B. Moreira Lima, de 23 de outubro de 2001, dirigido a esta Comissão de Anistia, onde expõe de forma clara o sentimento que levou a edição da Portaria n.º 1.104.
  1. Nestes termos:

Tomo a liberdade de dirigir-me a V. Sas. como testemunha voluntária, visando, a bem da justiça, citar alguns   fatos  que  antecederam a  31  de março  de    1964, diretamente  ligados  a  Associação  de  Cabos  da  FAB  – ACAFAB  que,  ao  meu  juízo,  promoveram  em  menor  escala, manifestações de natureza política, semelhantes às promovidas pela Associação de Marinheiros e Fuzileiros Navais.

Justamente por se envolverem nesses tipos de manifestações, a Revolução de 31 de março os puniu drasticamente e sem direito de defesa, com prisões, seguidas de exclusões e desligamentos, mascarando a punição que deveria ser imposta através dos Atos Revolucionários de Exceção, em simples punições administrativas. Comprovando o que ora afirmo, cito o Expediente Reservado n.º 4, de setembro de 1964, do Estado-Maior da Aeronáutica ao Ministro da Pasta e a Portaria n.º 1.104/GM-3, de 12 de outubro de 1964 – também do Ministério da Aeronáutica – fixando aos punidos, arbitrariamente, prazo para licenciamentos, ao arrepio do direito de continuarem na Força Aérea, direito que lhes fora garantido pela Portaria n.º 570/54. Tal providência depurativa e sem direito a apelação, imposta pela Portaria em questão – 1.104/GM-3 – teve como objetivo principal, produzir uma limpação política nos quadros de praças da Força Aérea Brasileira, visando diretamente os Cabos. Estes, pela primeira vez, criaram naquele ano, sua própria associação – a ACAFAB – constando em seus Estatutos, além dos itens relativos ao lazer, também aqueles que lhes garantia a estabilidade, o direito ao casamento e outros essenciais, aos direitos do cidadão.

Finalizando, Senhor Presidente e Ilustres conselheiros, cito a conclusão dada pelo presidente do IPM a que foram submetidos nossos Cabos:

                                                       ‘A ACAFAB é uma Associação que promove reuniões subversivas contrárias  ao bem público e a própria Segurança Nacional’.

Com essa conclusão, é estranho que os membros das Associações de Cabos da FAB – ACAFAB, hajam sido punidos por motivo administrativo e não o político.

  • o meu testemunho. Na época, era o Comandante da Base Aérea de Santa Cruz – Rio de Janeiro/RJ.
  1. A prova testemunhal coadunando as demais provas aqui apresentadas é de suma importância para fortalecer a solução dos requerimentos de anistia dos cabos, pois formam um conjunto harmônico e autêntico.
  2. Não obstante tal testemunho emitir talvez um “juízo de valor”, o qual não poderia haver. Deve-se levar, entretanto, e principalmente, o fato de se tratar de oficial general de alto posto no qual, certamente, tenha vencido os limites militares os quais fora condicionado, para dar testemunho de grande valia e importância, com prejuízos, muitas vezes, em suas relações particulares e sociais militares.

 

  1. Caso a Comissão de Anistia queria a oitiva da Testemunha, proceder-se-á a esta faculdade, nos termos do art. 3º, inciso III, do Regimento Interno desta Comissão.
  2.  

critérios  que  norteiam  os  processos  de  requerimentos  de anistia, quais  sejam:  simplicidade, informalidade,    economia processual e  celeridade    (art.  14  do  Regimento  Interno    da Comissão de Anistia).

 

  1. Os Requerentes foram licenciados ex officio por “motivação exclusivamente política” na graduação de Cabo, os quais se na ativa estivesse, “obedecidos os prazos de permanência em atividade” atingiriam a graduação de Suboficial.
  1. Em face disso, ao atingirem a graduação de Suboficial, os Requerentes passariam para a reserva remunerada com “a percepção de remuneração correspondente ao grau hierárquico superior” – art. 50, inciso II, da Lei n.º 6.880/80, ou seja, com a remuneração do posto de 2.º Tenente, cujo dispositivo tem a seguinte redação:

Art. 50. São direitos dos militares:

(…)

  • – a percepção de remuneração correspondente ao grau hierárquico superior ou melhoria da mesma quando, ao ser transferido para inatividade, contar mais de 30 (trinta) anos de serviços.
  1. O § 1.º do art. 50 traz uma ressalva nos seguintes termos:
  • 1º. A percepção da remuneração correspondente ao grau hierárquico superior ou melhoria da mesma, a que se refere o item II deste artigo, obedecerá às seguintes condições:

(…)

b) os subtenentes e suboficiais, quando transferidos para a inatividade, terão os proventos calculados sobre o soldo correspondente ao posto de segundo-tenente, desde que contem mais de 30 (trinta) anos de serviço; e

c) as demais praças que contem mais de 30 (trinta) anos de serviço, ao serem transferidas para a inatividade, terão os proventos calculados sobre o soldo correspondente à graduação imediatamente superior”.

  1. A teor de tais dispositivos os militares da presente questão, atingiriam no máximo, a graduação de Suboficial e seriam “transferidos para a inatividade” ou para a “reserva remunerada” com “os proventos calculados sobre o soldo correspondente à graduação imediatamente superior”, ou seja com o “soldo correspondente ao posto de segundo-tenente”.
  1. Por outro lado, o art. 98, inciso I, alínea c, da Lei n.º 6.880, de 1980, estabelece que “a transferência para a reserva remunerada, ex officio, verificar-se-á sempre que o militar” atingir idades-limite para cada posto ou graduação no caso de cabos de que cuida o presente feito:

– Suboficial e Subtenente …………………….  52 anos

– Primeiro-Sargento e Taifeiro-Mor …………….  50 anos

– Segundo-Sargento e Taifeiro-de-Primeira Classe…  48 anos

– Terceiro-Sargento e Taifeiro-de-Segunda Classe…  47 anos

– Cabo ……………………………………..  45 anos

– Marinheiro, Soldado e Soldado de Primeira Classe.  44 anos

  1. Os Cabos da Força Aérea Brasileira atingiram ou alcançariam, no máximo, a graduação de Suboficial, que ao “serem transferidos para a inatividade ou reserva remunerada”, passariam a ter “os proventos calculados sobre o soldo correspondente à graduação imediatamente superior”, a qual seja a de 2.º Tenente.
  1. Assim, concluo que os cabos que se encontravam já nessa graduação na Força Aérea Brasileira, sob a égide da Portaria n.º 570 e foram surpreendidos com expulsões, desligamentos e licenciamento ex officio, por força da Portaria n.º 1.104, especialmente sem terem pedido desligamentos voluntários, deverão ser declarados anistiados políticos.

 

  1. Os atos que motivaram as expulsões, desligamentos ou licenciamentos ex officio são os que definem a motivação exclusivamente política, quais sejam: o Ofício Reservado n.º 4 e o Boletim Reservado n.º 21, pois revelam os verdadeiros anseios das autoridades militares.

 

  1. Diante de tais fundamentos considero por submeter ao Plenário da Comissão de Anistia o seguinte enunciado administrativo:

A Portaria n.º 1.104, de 12 de outubro de 1964, expedida pelo Senhor Ministro de Estado da Aeronáutica, é ato de exceção, de natureza exclusivamente política.

  1. É a proposta que submeto à deliberação do Plenário. Brasília/DF, 16 de julho de 2002. Conselheiro Presidente José Alves Paulino – Relator.

Da leitura do voto do então Presidente da Comissão de Anistia verifica-se que o mesmo ainda não considerou outros documentos eficazes que demonstrariam a natureza política da edição da Portaria nº 1.104-GM3/FAB, quais sejam:

I – o Aviso nº S-5/GM1, de 24.09.163reservado – que o então Ministro da Aeronáutica encaminhou ao Presidente da República com pedido de “antecipar por maior prazo o licenciamento dos Cabos e Soldados” – v. cf. doc 8;

  • – o despacho do Presidente da República autorizando esse esdrúxulo “licenciamento antecipado dos Cabos e Soldados” -= v. cf. doc 8;

 

  • – o Aviso nº S-20/GM1, de 24.09.1963, expedido pelo então Ministro da Aeronáutica ao Diretor-Geral do Pessoal da Aeronáutica, com o teor de que deveriam ser “licenciados os cabos e soldados engajados em 1962 e 1963” – cf. doc 8;

IV – e depois mais um Aviso nº S-24/GM1, de 03.10.1963, expedido pelo então Ministro da Aeronáutica o ao Diretor-Geral do Pessoal da Aeronáutica, com o teor de que deveriam ser “licenciados os cabos e soldados engajados em 1961” – cf. doc 8.

E mais ainda, o voto condutor da proposição da Súmula Administrativo não levou em conta os aspectos históricos demonstrados acima.

Portanto, resta evidenciado que está presente a motivação politica da Portaria nº 1.104/GM3-FAB, devendo estes autos serem arquivados e mantido o ato declaratório da anistia política do ex-marido da Requerente.

(Final do assunto)

 

BIBLIOGRAFIA

1ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. Mutações do conceito de anistia na Justiça de Transição brasileira: a terceira fase da luta pela anistia. In: SILVA FILHO, José Carlos Moreira da; ABRÃO, Paulo; TORELLY,  Marcelo D. (Coord.) Justiça de Transição nas Américas: olhares interdisciplinares, fundamentos e padrões de efetivação.  Belo Horizonte: Fórum, 2013. p. 358.

2MARTINS, Roberto Ribeiro. Liberdade para os brasileiros: anistia ontem e hoje. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978. p. 122. Ibidem. p. 123.

4RODEGHERO, Carla Simone. A anistia entre a memória e o esquecimento. História Unisinos. São Leopoldo, 13, n. 2, mai./ago. 2009. Disponível em: <http://revistas.unisinos.br/index.php/historia/article/view/5081>. Acesso em: 01 abr. 2017.

5MACEDO, Sandro. Frente Ampla une Lacerda, Jango e JK contra a ditadura e por volta da democracia. 2016. Disponível em: <http://acervo.oglobo.globo.com/em-destaque/frente-ampla-une-lacerda-jango-jk-contra-ditadura-por-volta-da-democracia-20345714>. Acesso em: 01 abr. 2017.

6GRECO, Heloisa. Direito à memória, à verdade e à justiça: a luta pela anistia ampla, geral e irrestrita. In: SOUSA JUNIOR, José Geraldo de; SILVA FILHO, José Carlos Moreira da; PAIXÃO, Cristiano; FONSECA, Lívia Gimenes Dias da; RAMPIN, Talita Tatiana Dias (Org.). O Direito Achado na Rua: introdução crítica à justiça de transição na América Latina. Brasília, v. 7, mai. 2014. p. 297.

7ZERBINI, Therezinha Godoy. Anistia: a semente da liberdade. São Paulo: Gráfica das Escolas Profissionais Salesianas, 1979. p. 27.

8MARTINS, Roberto Ribeiro. Anistia: um balanço. Encontros com a Civilização Brasileira. Rio de Janeiro, n. 8, 1979. p. 193.

6GRECO, Heloisa. Direito à memória, à verdade e à justiça: a luta pela anistia ampla, geral e irrestrita. In: SOUSA JUNIOR, José Geraldo de; SILVA FILHO, José Carlos Moreira da; PAIXÃO, Cristiano; FONSECA, Lívia Gimenes Dias da; RAMPIN, Talita Tatiana Dias (Org.). O Direito Achado na Rua: introdução crítica à justiça de transição na América Latina. Brasília, v. 7, mai. 2014. p. 297.

7ZERBINI, Therezinha Godoy. Anistia: a semente da liberdade. São Paulo: Gráfica das Escolas Profissionais Salesianas, 1979. p. 27.

8MARTINS, Roberto Ribeiro. Anistia: um balanço. Encontros com a Civilização Brasileira. Rio de Janeiro, n. 8, 1979. p. 193.

9MEZAROBBA, Glenda. Um acerto de contas com o futuro: a anistia e suas consequências – um estudo do caso brasileiro. Dissertação (mestrado), Curso de Ciência Política, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo. São Paulo, 2003. p. 19.

10Ibidem. p. 21.

11COMITÊ BRASILEIRO PELA ANISTIA. Carta de princípios e programa mínimo de ação. São Paulo, 1978. Disponível em: <http://novo.fpabramo.org.br/content/carta-de-principios-e-programa-minimo-de-acao-cbasp>. Acesso em: 03 abr. 2017.

12SKIDMORE, Thomas. Brasil: de Castelo Branco a Tancredo. 7. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2000. p. 391.

13RELAÇÃO das principais greves de fome. 2006. Disponível em: <https://fpabramo.org.br/2006/04/23/relacao-das-principais-greves-de-fome/>. Acesso em: 03 abr. 2017.

14ASSOCIAÇÃO DE MULHERES. Nós, mulheres. n. 8. São Paulo, 1978. Disponível em: <http://fcc.org.br/conteudosespeciais/nosmulheres/arquivos/NosMulheresno.pdf>. Acesso em: 03 abr. 2017.

15ENCONTRO  NACIONAL  DE  MOVIMENTOS  PELA  ANISTIA. Carta de Salvador. Salvador,  1978. Disponível em: <http://novo.fpabramo.org.br/content/carta-de-salvador>. Acesso em: 03 abr. 2017.

16GREENHALGH, Luiz Eduardo. Abertura do I Congresso Nacional pela Anistia: discurso de Luiz Eduardo Greenhalgh. São Paulo, 1978. Disponível em: <http://novo.fpabramo.org.br/content/movimentos-pela-anistia>. Acesso em: 03 abr. 2017

17A Emenda Constitucional n.º 11, de 13 de outubro de 1978, no seu artigo 3º, revogou os atos institucionais e complementares, no que contrariavam a Constituição Federal.

18LYNCH, Christian Edward Cyril. O Poder Moderador na Constituição de 1824 e no anteprojeto Borges de Medeiros  de 1933: um  estudo de  direito comparado. Disponível em:<www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/198714/000901836.pdf?sequence=1>. Acesso em: 05 abr. 2017.

 

19“Dispor” não significa necessariamente ter iniciativa de projetos de lei sobre. Ocorre que, mesmo em projetos de lei cuja iniciativa é constitucionalmente reservada ao Presidente da República, o Congresso Nacional dispõe do poder de emenda, de alteração, nos termos em que esse poder é dado pela Constituição.

20MEZAROBBA, Glenda. Um acerto de contas com o futuro: a anistia e suas consequências – um estudo do caso brasileiro. Dissertação (mestrado), Curso de Ciência Política, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo. São Paulo, 2003. p. 24.

21Ibidem. p. 25.

22A FESTA da  anistia. Veja. São Paulo, jul. 1979. p. 15. Disponível  em:  <http://www.arqanalagoa.ufscar.br/pdf/recortes/R04037.pdf>. Acesso em: 05 abr. 2017.

  1. Ibidem. p. 16.

24BRASIL. Congresso  Nacional.  Anistia.  Brasília, v.1,1982. p. 450. Disponível em: <https://www.marxists.org/portugues/tematica/livros/diversos/anistia.pdf>. Acesso em: 05 abr. 2017.

25Ibidem. p. 450v.

26A FESTA da anistia. Op. cit. p. 14.

27STM calcula que 320 pessoas estão fora da anistia. Jornal do Brasil.  Rio de Janeiro, 7 ago. 1979.

28A FESTA da anistia. Op. cit.  p. 15.

29FICO, Carlos. A negociação parlamentar da anistia de 1979 e o chamado "perdão aos torturadores". Revista Anistia Política e Justiça de Transição. Brasília, n. 4, 2010. p. 328.

30BRASIL.Congresso Nacional. Anistia. Brasília,  v.1,  1982.  p. 402-404. Disponível em: <https://www.marxists.org/portugues/tematica/livros/diversos/anistia.pdf>. Acesso em: 05 abr. 2017.

31BRASIL. Lei nº 6.683, de 28 de agosto de 1979. Concede anistia e dá outras providências. Art. 3º. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6683.htm>. Acesso em: 05 abr. 2017.

32BRASIL. Lei nº 6.683, de 28 de agosto de 1979. Concede anistia e dá outras providências. Art. 11. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6683.htm>. Acesso em: 05 abr. 2017.

33ANISTIA só reintegra 34 militares dos 7 mil 488 que foram punidos. Jornal do Brasil. Rio de Janeiro, 28 ago.1980. Disponível em: <http://docvirt.com/docreader.net/DocReader.aspx?bib=docbnm_completo&pagfis=95333>. Acesso em: 06 abr.2017.

34CINCO anos depois da anistia, excluídos lutam por seus direitos. Folha de São Paulo. São Paulo, 29 ago.1984.

35A CONSTELAÇÃO  da crise.  Veja. São  Paulo, out. 1985.  p. 37. Disponível em: <http://www.arqanalagoa.ufscar.br/pdf/recortes/r01532.pdf>. Acesso em: 06 abr. 2017.

36Ibidem. p. 38.

37BRASIL.  Assembleia  Nacional  Constituinte.  Diário  da Assembleia  Nacional Constituinte.  Brasília,  15 jun.1988. p. 11.271. Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/legislacao/Constituicoes_Brasileiras/constituicao-cidada/publicacoes/anais-da-assembleia-nacional-constituinte>. Acesso em: 07 abr. 2017.

38Ibidem, p. 11.273.

39Ibidem. p. 11.292.

40Ibidem. p. 11.364.

41Ibidem. p. 35.245.

42FRANÇA, William. FHC concede anistia política a militares. Folha de São Paulo. Caderno Brasil, jun. 2001.

p. 9. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc0106200125.htm>. Acesso em: 07 abr. 2017.

43MENDES, Sâmia. Anistiados políticos reivindicam mais direitos. Brasília: Agência Câmara, mai. 2002. p.16.

44CAETANO, Valderez. Acordo garante aprovação da lei orçamentária. O Globo. Rio de Janeiro, jul. 2002. p.10.

45SETE mil anistiados serão atendidos com MP aprovada. p. 3.Jornal da Câmara. Brasília, a. 4, n. 883, nov. 2002.

46RODEGHERO, Carla; DIENSTMANN, Gabriel; TRINDADE, Tatiana. Anistia ampla, geral e irrestrita: história de uma luta inconclusa. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2011. p. 110.

47ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. As dimensões da justiça de transição no Brasil, a eficácia da Lei de Anistia e as alternativas para a verdade e justiça. In: PAYNE, Leigh A.; ABRÃO, Paulo; TORELLY, Marcelo D. (Org.). A anistia na era da responsabilização: o Brasil em perspectiva internacional e comparada. Brasília: Ministério da Justiça. Comissão de Anistia; Oxford: Oxford University, Latin American Centre, 2011. p. 215.

48COIMBRA, Cecília Maria Bouças. Reparação e  memória.  2008. Disponível em: <https://www.ifch.unicamp.br/ojs/index.php/ael/article/view/2549/1959>. Acesso em: 03 mai. 2017.

49CONCEIÇÃO, Júlio César. Júlio César Conceição: trecho de entrevista.   [02   de   abril    de   2014]. Entrevistadora: Esther Itaborahy Costa. Trecho disponível   em: <www.ufjf.br/ppghistoria/files/2014/01/ESTHER-ITABORAHY-COSTA.pdf>. Acesso em: 03 mai. 2017.

50PARLAMENTARISMO já:  Jango   assume,  mas  sem  poderes. Disponível  em: <http://www.pitoresco.com/historia/republ310.htm>. Acesso em: 04 mai. 2017.

52ATASSIO, Aline Prado. A batalha pela memória: os militares e o golpe de 1964. Dissertação (mestrado), Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, Universidade de São Carlos. São Carlos, 2009. p. 47.

53Ibidem. p. 48.

54MILITARES da democracia. Direção de Silvio Tendler. Produção de Ana Rosa Tendler. 2014. P&B.

55ATASSIO, Aline Prado. Op. cit. p. 50.

56MOTTA, Aricildes de Moraes (Coordenação Geral). 1964 31 de março: o movimento revolucionário e a sua história. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército Editora, 2003. 10 T. p. 56.

57GORENDER apud FICO, Carlos. Além de 1964: versões e controvérsias sobre 1964 e a ditadura militar: Rio de Janeiro: Record, 2004. p. 25.

58TOLEDO, Caio Navarro. O governo de Goulart e o golpe de 64. São Paulo: Brasiliense, 2004. p. 68.

59LAMARÃO, Sérgio. A revolta dos sargentos. Disponível em: <http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/Jango/artigos/AConjunturaRadicalizacao/A_revolta_dos_sargentos>.

Acesso em: 05 mai. 2017.

  1. VILLA apud ATASSIO, Aline Prado. A batalha pela memória: os militares e o golpe de 1964. Dissertação (mestrado), Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, Universidade de São Carlos. São Carlos, 2009. p.
  1. CARAVELLI, Eustáquio. Eustáquio Caravelli: trecho de entrevista. [02 de abril de 2014]. Entrevistadora: Esther Itaborahy Costa. Trecho disponível em: <www.ufjf.br/ppghistoria/files/2014/01/ESTHER-ITABORAHY-COSTA.pdf>. Acesso em: 05 mai. 2017.

62GOULART, João. Discurso de Jango na Central do Brasil em 1964. Disponível em: <http://www.ebc.com.br/cidadania/2014/03/discurso-de-jango-na-central-do-brasil-em-1964>. Acesso em: 16 mai. 2017.

63ATASSIO, Aline Prado. A batalha pela memória: os militares e o golpe de 1964. Dissertação (mestrado), Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, Universidade de São Carlos. São Carlos, 2009. p. 84.

64LAMARÃO, Sérgio. A revolta dos marinheiros. Disponível em: <http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/Jango/artigos/AConjunturaRadicalizacao/A_revolta_dos_marinheiros>. Acesso em: 05 mai. 2017. ATASSIO, Aline Prado. Op. cit. p. 82.

67Três inquéritos foram abertos, contudo, somente um foi encerrado antes de março de 1964.

68BRASIL: NUNCA MAIS. 9ª Edição. Petrópolis: Editora Vozes, 1985. p. 118.

69BRASIL. Ministério da Aeronáutica. Boletim Reservado 08. Disponível em: <http://www.militarpos64.com.br/sitev2/wp-content/uploads/2009/10/2.Boletim-Reservado-nº-08-de-06.05.1964-Abertura-de-IPM-contra-membros-da-ASCAFAB.pdf>. Acesso em: 17 mai. 2017.

70BRASIL. Ministério da Aeronáutica. Boletim Reservado 21. Disponível em: <http://www.militarpos64.com.br/wp-content/uploads/2008/09/14boletim-reservado-nc2ba-021-de-11051964-ipm-acafab-solucao-final-e-providencias-tomadas.pdf>. Acesso em: 17 mai. 2017.

  1.  

72BRASIL. Ministério da Aeronáutica. Portaria 16-GM1. Disponível em: <www.militarpos64.com.br/sitev2/wp-content/uploads/2012/03/Portaria64-16GM1.pdf>. Acesso em: 17 mai. 2017.

73O artigo 86 do Decreto-Lei n.º 9.500/46 definia engajamento como a prorrogação do tempo de serviço inicial do incorporado.

74Nos termos do subitem 1.2.2 da Portaria 570GM3/54, reengajamento seria a prorrogação de permanência em serviço ativo concedida às praças anteriormente engajadas.

75BRASIL. Ministério da Aeronáutica. Portaria 570-GM3. Disponível em: <http://www.militarpos64.com.br/sitev2/wp-content/uploads/2012/02/Portaria-n%C2%BA-570GM3-de-23.11.pdf>. Acesso em: 17 mai. 2017.

  1. BRASIL. Lei n.º 2.370, de 09 de dezembro de 1954. Regula a inatividade dos militares. Art. 16, I, alínea “b”. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1950-1969/L2370.htm>. Acesso em: 17 mai. 2017.

77BRASIL.  Ministério  da Aeronáutica. Ofício 04. Disponível   em: <https://gvlima.files.wordpress.com/2011/03/a-histc3b3ria-da-portaria-1-104gm3.pdf>.  Acesso   em: 17  mai.2017.

78Ibidem.

79BRASIL. Ministério da Aeronáutica. Portaria 1.104-GM3.

80COSTA, Esther Itaborahy. Do banimento à luta pela anistia: história e memória da Associação dos Anistiados Políticos Militares da Aeronáutica – GEUAr. Dissertação (mestrado), Departamento de História do Instituto de Ciências Humanas, Universidade Federal de Juiz de Fora. Juiz de Fora, 2014. p. 112.

81OLIVEIRA, Júlio César Conceição de. Júlio César: trecho de entrevista. [02 de abril de 2014]. Entrevistadora: Esther     Itaborahy     Costa.     Trecho     disponível     em:      <www.ufjf.br/ppghistoria/files/2014/01/ESTHER-ITABORAHY-COSTA.pdf>. Acesso em: 17 mai. 2017.

82OLIVEIRA, Antônio Fagundes de. Fagundes: trecho de entrevista. [08 de maio de 2013]. Entrevistadora: Esther     Itaborahy     Costa.     Trecho     disponível     em:      <www.ufjf.br/ppghistoria/files/2014/01/ESTHER-ITABORAHY-COSTA.pdf>. Acesso em: 17 mai. 2017.

83PRIMO, José de Brito. Costa. Trecho disponível Acesso em: 17 mai. 2017. José. trecho de entrevista. [06 de maio de 2013]. Entrevistadora: Esther Itaborahy em:  <www.ufjf.br/ppghistoria/files/2014/01/ESTHER-ITABORAHY-COSTA.pdf>.

84THOMPSON, E. P. Senhores e Caçadores. Rio de Janeiro: Ed. Paz e Terra. 1987. p.354.

85SILVA,  Fernando  Diniz  e.  Diniz:  trecho  de  entrevista.  [18  de  agosto  de  2013].  Entrevistadora:  Esther Itaborahy  Costa.    Trecho   disponível   em:   <www.ufjf.br/ppghistoria/files/2014/01/ESTHER-ITABORAHY-COSTA.pdf>. Acesso em: 20 mai. 2017.

86A mencionada súmula continua vigente.

87Como costumeiramente os ex-cabos da FAB chamam a Portaria 1.104.

88A fundamentação do voto condutor da edição da Súmula Administrativa n.º 2002.07.0003 encontra-se anexa.

89A NOTA N. AGU/JD-10/2003 foi integralmente transcrita no bojo da NOTA N. AGU/JD/1-2006, a qual encontra-se anexa.

90M.A.O. M.A.O.: trecho de entrevista. [07 de maio de 2013]. Entrevistadora: Esther Itaborahy Costa. Trecho disponível em: <www.ufjf.br/ppghistoria/files/2014/01/ESTHER-ITABORAHY-COSTA.pdf>. Acesso em: 21 mai. 2017.

91Ibidem.

92O Recurso Extraordinário 817.338 – DF, com repercussão geral reconhecida, foi interposto contra acórdão em que a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça concedeu a segurança para declarar a decadência de ato da Administração por meio do qual se anulou portaria anistiadora de cabo da Aeronáutica, excluído dessa força, com fundamento na Portaria 1.104/64.

93TORREÃO, Marcelo Pires; MACHADO, Daniel Fernandes. O Direito dos Cabos à Concessão de Anistia Política e Reparação Econômica. 2017. Disponível em: <http://www.tmld.com.br/publicacoes/o-direito-dos-cabos-concessao-de-anistia-politica-e-reparacao-economica/>. Acesso em: 21 mai. 2017.

94BRASIL. Lei Complementar n.º 73, de 10 de fevereiro de 1993. Institui a Lei Orgânica da Advocacia-Geral da       União        e        dá       outras        providências.        Art.         4º,        X        e        XI.         Disponível        em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/LCP/Lcp73.htm>. Acesso em: 21 mai. 2017.

95GREIFF, Pablo de. Justiça e Reparações. Revista Anistia Política e Justiça de Transição. Ministério da Justiça, n. 3, 2010. p. 29.

96O TC 026848/2006, atinente ao caso do ex-cabos da FAB, trata-se de um dos quatro apartados constituídos a partir do TC 011.627/2006-4, esse referente a relatório de auditoria realizada com vistas a verificar a regularidade de indenizações concedidas pelo Ministério da Justiça a anistiados políticos com fundamento na Lei n.º 10.559/02.

97BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança n.º 28022. Relator: Ministra Cármen Lúcia.

Brasília, DF, 09 de setembro de 2011. Diário Oficial da União.

98Insta citar que, por unanimidade de votos, o Plenário do STF decidiu que é constitucional a determinação de pagamento imediato de reparação econômica aos anistiados políticos, nos termos do que prevê o parágrafo 4º do artigo 12 da Lei de Anistia. A decisão foi tomada no julgamento do Recurso Extraordinário 553.710 – DF, em que a União questionava determinação do Superior Tribunal de Justiça de pagamento imediato de reparação devida a Gilson de Azevedo Souto, que foi desligado da Aeronáutica, com fundamento na Portaria 1.104/64.

99PEREIRA, Anthony W. Ditadura e repressão: o autoritarismo e o estado de direito no Brasil, no Chile e na Argentina. Tradução de Patrícia de Queiroz Carvalho Zimbres. São Paulo: Paz e Terra, 2010.

100BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1988. p. 95.

 

Fica aqui a sugestão !

Abraço a todos.
 


Odair Aparecido Pereira SOARES
Ex-Cabo da FAB – Atingido pela Portaria 1.104GM3/64

Email: soares1104gm3@bol.com.br

 

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Postado por Gilvan VANDERLEI
Ex-Cabo da FAB – Atingido pela Portaria 1.104GM3/64
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