“NÃO IMPORTA O TAMANHO DA MONTANHA, ELA NÃO PODE ESCONDER O SOL.”

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AÇÃO DIRETA COM O PERÍODO DITATORIAL.

Toda ação provoca uma reação de mesma força em sentido contrário.

A principal lei da mecânica se aplica facilmente, também, à História.

O período do Regime Militar no Brasil (1964 até 1984) foi duro em relação às liberdades individuais, aos militares que serviam ao sistema, à repressão a seus opositores, o que incluía torturas e mortes nos porões da ditadura.

Isso provocou igual reação de quem não concordava com o Governo. Muitos se articulavam clandestinamente e promoviam até lutas armadas, guerrilhas urbanas, seqüestros e assaltos para financiar o movimento.

Toda essa articulação teve também, seu lado poético, de reação pela música, por exemplo.

Surgiram as músicas de protesto, feitas para transmitir mensagens de liberdade e tentar inflamar o povo pela causa da Democracia.

Pela própria repressão, que censurava tudo o que se referisse à liberdade (desde novelas, revistas, jornais, livros, canções, peças de teatro e até homilias de padres em suas igrejas), os compositores, escritores e dramaturgos, foram obrigados a buscar alternativas que, de forma inteligente, driblassem a censura.

Era uma situação de opressão e vergonha.

O período foi duro e crítico, não apenas para os músicos, mas para qualquer um que se mostrasse inclinado a produzir pensamento próprio.

Peças teatrais foram duramente combatidas, Teatros, como o RUTH ESCOBAR, chegaram a ser depredados pelo COMANDO DE CAÇA AOS COMUNISTAS (CCC) e, atores, espancados em pleno palco.

O espetáculo RODA VIVA, de Chico Buarque, que tinha a música de mesmo nome e era uma clara crítica ao Regime Militar, foi um grande exemplo.

Atrizes e atores, como Marília Pêra e Walkiria Mamberti, foram agredidos com cacetetes e tiveram que ser hospitalizados.

O escritor Paulo Coelho ficou um mês preso depois de ter feito discurso a favor da anarquia em um show com seu parceiro Raul Seixas.

A cantora Nara Leão declarou, em uma entrevista, que os militares podiam entender de canhões e metralhadoras, mas não sabiam nada sobre política.

Também Geraldo Vandré, responsável pelo maior hino de resistência (Pra Não Dizer que Não Falei de Flores), compôs, em 1980, a canção FABIANA, numa homenagem à FORÇA AÉREA BRASILEIRA, e iniciou assim, um período de lua-de-mel com os militares.

Depois do AI-5, em dezembro de 1968, que dava ao Governo o poder de reprimir tentativas de críticas, o protesto ficou mais brando. Muitos trabalhadores perderam seus empregos, militares foram presos, torturados e expulsos da caserna. A maioria teve a carreira militar truncada e mesmo na vida civil, muitos não conseguiram empregos, pois seus conceitos não eram favoráveis por denúncias dos seus superiores.

Ostensivamente, fomos obrigados a aceitar toda sorte de infortúnios decorrentes da situação porque passávamos.

Se não vicejássemos além dos limites naturais de uma democracia plena, diria que a ANISTIA AMPLA, GERAL e IRRESTRITA, está com seus dias contados, na medida em que o GOVERNO (MJ e Comissão de Anistia) e AERONÁUTICA nos submete a uma tortura psicológica sem precedentes.

O pior legado da ditadura, além da TORTURA, está na questão moral e isso ultrapassa o limite do aceitável.

Novos acontecimentos estão surgindo apontando para mais um engodo da COMISSÃO DE ANISTIA atual, no sentido de que nos Requerimentos e Recursos contenham comprovações de fatos políticos ocorridos com os militares e que estejam inseridos em seus históricos.

A bem da verdade, a época em que vivíamos na caserna, com toda TRUCULÊNCIA, MAZELAS e HORRORES impostos por nossos superiores, era prática comum, esconder suas maldades vis.

Os subterfúgios usados para INDEFERIR Recursos e Processos, pela ausência de motivação exclusivamente política para o desligamento, além daquelas relativas à Portaria 1.104GM3/64 é exigência DESCABIDA e uma AFRONTA à Lei de Anistia Política.

Ademais, é importante frisar que nem todas as barbáries que ocorriam conosco, nos Quartéis, eram registradas em nossos históricos. Tudo era CAMUFLADO. A mesma exigência, então, deveria se estender aos processos das Primeira e Segunda Câmaras, ou seja, comprovação das circunstâncias em que milhares de desaparecidos políticos foram TORTURADOS, ESPANCADOS e HUMILHADOS até a morte e cujas famílias estão até hoje sem saber onde se encontram seus CADÁVERES.

Onde estão os documentos comprobatórios das TORTURAS, ESPANCAMENTOS E BARBÁRIES, sofridos pelo sindicalista LUIZ INÁCIO DA SILVA, praticados pela repressão ?

E a cópia de exame de corpo de delito, todos com as devidas assinaturas dos órgãos responsáveis e suas respectivas autenticações ?

Só podemos esclarecer fatos que presenciamos ou que foram relatados por amigos e jornalistas, à época.

Como exemplo, ainda em 1968, durante a prisão do ex-presidente Jânio Quadros, fui obrigado a permanecer, por mais de 24 horas, sem comer, a tomar conta da aeronave que o levaria ao confinamento, em Mato Grosso.

Desesperado e com fome e, na ausência do rondante, fui compelido a adentrar a aeronave e a retirar do frigo-bar existente na cabine dos pilotos, um sanduíche e uma garrafa dágua para saciar minha fome e sede.

Sabia que se fosse surpreendido por meus superiores, certamente seria punido exemplarmente por essa atitude.

“QUANDO VI O SOLDADO FUSTIGAR O PEITO DO DEPUTADO DAVID LERER COM A PONTA DA BAIONETA E EXCLAMAR, ROSTO PÁLIDO E GRITO ESTRIDENTE, – SE TENTAR PASSAR COME FOGO!”.

Longe estava de imaginar que, em seus dias de confinamento, o ex-presidente Jânio Quadros recebesse tratamento tão humilhante como o sofrido pelo parlamentar.

Eram 7 horas da manhã do dia 30 de julho e acabara de chegar à Base Aérea de Santos, vindo da residência de Jânio Quadros, na Rua São Paulo, no Guarujá.

O acontecimento narrado acima, ilustra uma passagem truculenta da nossa história registrada no livro “DIÁRIO DE UM CONFINADO”, em que figurei como testemunha ocular.

A atitude do soldado era determinação que deveria ser cumprida à risca, pois se assim não o fizesse, certamente estaria preso incomunicável e o fato nunca seria inserido em seu histórico.

A maioria dos fatos acontecidos só estão registrados em nossas memórias e fazem parte de NOSSOS PESADELOS.

Por tudo isso e mais um pouco, é que não concordamos com a exigência dessa atuall Comissão de Anistia, julgando-a ATENTATÓRIA e IMORAL.

“NÃO IMPORTA O TAMANHO DA MONTANHA, ELA NÃO PODE ESCONDER O SOL.”

Hidelberto MILANÊS.

EX/APM/ASANE.

milartbusiness@terra.com.br