Repetição do indébito em dobro na relação consumerista
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Marcos Sena
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A incoerência Jurisprudencial.
Atualmente, nas relações consumeristas onde há a cobrança indevida de valores, o judiciário de forma equivocada tem exigido do consumidor a demonstração da má-fé do fornecedor, seja de produto ou serviço, para a aplicação do parágrafo único do art. 42 do Código de Defesa do Consumidor. Devemos nos lembrar de que o CDC tem como pressuposto a vulnerabilidade do consumidor, sendo imposto ao Estado, por meio do art. 5º, XXXII, da Constituição Federal, o dever de promover sua defesa.
Partindo dessa premissa, sob o aspecto ontológico, a razão de ser do CDC é apenas uma: a proteção do consumidor frente aos fornecedores e, extensivamente, ao mercado.
Nesse trilhar, a jurisprudência tem admitido, especialmente nas relações de consumo, na fixação do quantum indenizatório de danos morais, o viés punitivo da condenação, isto é, reconhece que a simples reparação moral por aquele viola o direito do consumidor não é suficiente, assim, devendo a condenação ser majorada para o desestimulo daquela conduta.
Feita a contextualização necessária, passemos especificamente a análise do artigo 42, parágrafo único, do aludido diploma.
Como dito anteriormente, na contramão dos direitos arduamente conquistados até aqui, bem como do próprio entendimento da jurisprudência no que diz respeito à inclusão do viés punitivo na fixação dos danos morais, resolveu a jurisprudência exigir do consumidor a comprovação da má-fé da cobrança dos valores indevidos para a condenação dobrada.
Ora, no que diz respeito aos danos morais a jurisprudência constrói um entendimento para desestimular a conduta dos fornecedores, majorando a condenação a título de desencorajamento, por outro lado, onde a lei é expressa e positiva o viés da punição na cobrança indevida, vem o mesmo judiciário e afasta sua aplicação automática impondo o requisito má-fé.
Devemos observar que o art. 42 é claro quanto à aplicação da repetição em dobro, não havendo margem para qualquer interpretação, muito menos em desfavor do consumidor, vejamos:
Art. 42. […]
Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.
Podemos observar que a única exceção para a não aplicação imediata da repetição em dobro já está positivada, taxativamente, no parágrafo único, qual seja, o engano justificável. Além disso, fica claro que, se tratando de engano do fornecedor, cabe a ele o ônus da comprovação e não ao consumidor.
É certo que a mera devolução do valor cobrado indevidamente de modo simples fomentará a prática dessa conduta fazendo com que as empresas não se preocupem em aprimorar seus sistemas para que não haja tal falha.
Ademais, é evidente que a inserção de qualquer requisito não previsto no referido artigo só poderá ser realizada mediante o devido processo legislativo, e não pelo Judiciário.
Há decisões mais absurdas, no sentido de reconhecer a inversão do ônus da prova em favor do consumidor e, na mesma decisão, exigir desse a comprovação da má-fé do fornecedor para a repetição em dobro.
No mínimo, apesar da sua patente ilegalidade, caso o entendimento seja no sentido da necessidade de demonstração da má-fé da cobrança para a restituição em dobro, esta deve recair no fornecedor e não no consumidor.
Nesse caso, a demonstração da má-fé pelo consumidor é impor a produção de prova diabólica, como faria um correntista de uma instituição financeira para demonstrar a má-fé do banco na inclusão de uma tarifa não contratada?
Diante disso, é cristalina a irrelevância da análise da presença da boa-fé subjetiva na cobrança pelo fornecedor. A proteção previsto no CDC é matéria de ordem pública e interesse social, com critérios objetivos da aplicação da teoria da qualidade.
Ex-Cabo da FAB – Vítima da Portaria 1.104GM3/64
E-mail gvlima@terra.com.br
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