No último dia (16/12/2021) na Quinta Turma do TRF1, o Desembargador Federal ANTONIO DE SOUZA PRUDENTE, nos autos da AP 1064000-11.2020.4.01.3400, em sua decisão restaurou a anistia política, post mortem, do ex-Cabo da FAB – CARLOS FERNANDES FILHO em favor do viúva Silvina de Almeida Fernandes.
DECISÃO: (…) Com estas considerações, dou provimento à apelação da autora para anular a sentença monocrática e decidir, de logo, nos termos do § 4º do art. 1.013 do CPC vigente , julgando procedente o pedido inicial, para condenar a promovida a conceder anistia política ao falecido marido da autora, determinando que proceda sua integração nos quadros da Força Aérea Brasileira, na qualidade de inativo (reservista), na graduação de Segundo-Tenente, sob a forma de prestação mensal, permanente e continuada, bem como o direito de usufruir vantagens indiretas, assim como para condenar a União Federal a pagar à autora valores retroativos decorrentes de período, em que, durante a presente ação, eventualmente permaneceu fora da folha de pagamento da Aeronáutica, acrescidos de juros de mora e correção monetária, (…)
★ – A Portaria ANISTIADORA do ex-Cabo da FAB (Pré64) CARLOS FERNANDES FILHO referenciada nos autos do Processo AP 1064000-11.2020.4.01.3400 que foi publicada no D.O.U. nº 252, Seção 1, da terça-feira, dia 31 de dezembro de 2002, Página 74. veja abaixo:
PORTARIA N° 2.876, DE 30 DE DEZEMBRO DE 2002
O MINISTRO DE ESTADO DA JUSTIÇA, no uso de suas atribuições legais, com fulcro no artigo 10 da Medida Provisória n° 65, de 28 de agosto de 2002, publicada no Diário Oficial de 29 de agosto de 2002 e considerando o resultado do julgamento proferido pela Terceira Câmara da Comissão de Anistia na sessão realizada no dia 14 de novembro de 2002, no Requerimento de Anistia n° 2001.01.05426, resolve: Declarar CARLOS FERNANDES FILHO anistiado político, reconhecendo a contagem de tempo de serviço, para todos os efeitos, até a idade limite da permanência na ativa, assegurando as promoções à graduação de Suboficial com os proventos do posto de SegundoTenente e as respectivas vantagens, concedendo-lhe reparação econômica em prestação mensal, permanente e continuada no valor de R$ 3.375,00 (três mil, trezentos e setenta e cinco reais), com efeitos financeiros retroativos a partir de 21.12.1996 até a data do julgamento em 14.11.2002, totalizando 70 (setenta) meses e 25 (vinte e cinco) dias, perfazendo um total de R$ 239.017,50 (duzentos e trinta e nove mil, dezessete reais e cinqüenta centavos), nos termos do artigo 1°, incisos I e II, da Medida Provisória n° 65, de 28 de agosto de 2002
PAULO DE TARSO RAMOS RIBEIRO
Tribunal Regional Federal da 1ª Região
PROCESSO: 1064000-11.2020.4.01.3400
PROCESSO REFERÊNCIA: 1064000-11.2020.4.01.3400
CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198)
POLO ATIVO: SILVINA DE ALMEIDA FERNANDES
REPRESENTANTE(S)
POLO ATIVO: EDMUNDO STARLING LOUREIRO FRANCA – DF20252-A
POLO PASSIVO: União Federal
RELATOR(A): ANTONIO DE SOUZA PRUDENTE
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1064000-11.2020.4.01.3400
Processo de origem: 1064000-11.2020.4.01.3400
RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE
APELANTE: SILVINA DE ALMEIDA FERNANDES
Advogado da APELANTE: EDMUNDO STARLING LOUREIRO FRANCA – DF20252-A
APELADA: UNIÃO FEDERAL
RELATÓRIO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE (RELATOR):
Cuida-se de apelação interposta contra sentença proferida pelo juízo da 21ª Vara Federal da Seção Judiciária do Distrito Federal, nos autos da ação ajuizada por SILVINA DE ALMEIDA FERNANDES em desfavor da União Federal, objetivando “o reconhecimento da condição de anistiado político do seu falecido marido, que era ex-Cabo da Aeronáutica, na patente de Suboficial com proventos de Segundo-Tenente e demais vantagens do cargo, sob a forma de prestação mensal, haja vista ter sido licenciado das Forças Armadas por ato de exceção, qual seja a Portaria nº 1.104/1964-GM3 do Ministério da Aeronáutica.”
Após regular instrução do feito, o juízo monocrático julgou extinto o processo, sem resolução do mérito, por entender que a promovente carece de interesse processual, uma vez que, embora seja objeto de processo administrativo revisional, não houve ainda a revogação do referido benefício de reparação econômica.
Condenou-se a autora ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, § 2º e § 6º do CPC vigente.
Em suas razões recursais, a autor a insiste na existência de interesse processual, a justificar o julgamento de mérito da demanda, notadamente porque o reconhecimento administrativo da condição de anistiado política, com a consequente concessão do benefício da prestação mensal, não se encontra resguardado pela coisa julgada.
Com as contrarrazões, subiram os autos a este egrégio Tribunal, manifestando-se a douta Procuradoria Regional da República pelo desprovimento do recurso.
Este é o relatório.
VOTO – VENCEDOR
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1064000-11.2020.4.01.3400
Processo de origem: 1064000-11.2020.4.01.3400
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1064000-11.2020.4.01.3400
RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE
APELANTE: SILVINA DE ALMEIDA FERNANDES
Advogado da APELANTE: EDMUNDO STARLING LOUREIRO FRANCA – DF20252-A APELADA: UNIÃO FEDERAL
VOTO
O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE (RELATOR):
Inicialmente, há que se consignar a inafastabilidade constitucional da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV), bem como “a independência das instâncias administrativa e judicial, não exigem o acionamento e/ou esgotamento das vias administrativas para que o anistiado político pleiteie em juízo valores que entende devidos” (AC 0026647- 86.1999.4.01.3400 / DF, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, QUINTA TURMA, e-DJF1 de 26/04/2017).
Nesse mesmo sentido, é a jurisprudência pacífica deste egrégio Tribunal Regional, conforme se verifica dos seguintes julgados:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. ANISTIA POLÍTICA. DANO MORAL DECORRENTE DO BANIMENTO DO GENITOR PRATICADO PELO ESTADO DURANTE O REGIME MILITAR. PRIVAÇÃO DA CONVIVÊNCIA FAMILIAR. DANOS MORAIS. EXISTÊNCIA. REVISÃO DO VALOR ARBITRADO, PARA ADEQUAÇÃO AO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.
I – Preliminar de ausência de interesse de agir afastada, porque, consoante o art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito", motivo pelo qual não se faz necessário o esgotamento das instâncias administrativas para revisar o valor estipulado a título de prestação única concedido pela Comissão de Anistia.
II – Autora foi beneficiada por prestação fixada em parcela única pela Comissão de Anistia, que se baseou em atos estatais praticados durante a ditadura militar diversos daqueles pelos quais realizou seu pleito de indenização por dano moral.
III – A responsabilidade da União pelos danos causados em razão de atividades políticas é objetiva, a teor do art. 37, § 6 º, do CF, sendo necessária somente a demonstração do nexo de causalidade entre o fato e o evento danoso.
IV – A privação da convivência familiar em razão de banimento do genitor decretado durante o estado de exceção é ato estatal que por si só mostra-se apto a causar danos morais à autora submetida a tal ausência.
V – Caracterizado o dano moral sofrido pela autora, surge o dever do Estado de indenizá-la, uma vez configurados os pressupostos da responsabilidade objetiva da Administração Pública (CF, art. 37, §6º), à luz da teoria do risco administrativo, adotada pelo direito brasileiro, que prevê a obrigação da Administração de reparar os danos causados a terceiros, pelos seus agentes, no exercício de suas funções, independentemente da existência de culpa. Exige-se, como é por demais sabido, tão-somente a comprovação do dano e do nexo causal entre ele e a atuação do agente público, o que, sem dúvida, acha-se plenamente demonstrado pelas provas produzidas, motivo pelo qual não merece reparos a sentença neste ponto.
VI – Inexistente parâmetro legal definido para a fixação do valor da indenização por dano moral, devendo ser quantificado segundo os critérios de proporcionalidade, moderação e razoabilidade, submetidos ao prudente arbítrio judicial, com observância das peculiaridades inerentes aos fatos e circunstâncias que envolvem o caso em exame.
VII – Embora os danos sofridos pela autora sejam imensuráveis, o valor de R$ 500.000,00 arbitrado pelo magistrado a quo mostra-se excessivo à luz dos parâmetros jurisprudenciais, devendo ser reduzido para R$ 100.000,00, com base no art. 944, parágrafo único do Código Civil.
VIII – Apelação da União e remessa oficial tida por interposta a que se dá parcial provimento, apenas para adequar o valor da indenização por danos morais. (AC 0063856-69.2011.4.01.3400 / DF, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL JIRAIR ARAM MEGUERIAN, SEXTA TURMA, e-DJF1 de 18/12/2015) (grifo nosso)
CONSTITUCIONAL. ANISTIA POLÍTICA. PERÍODO DA DITADURA MILITAR. RECONHECIMENTO ADMINISTRATIVO. PRESTAÇÃO MENSAL, PERMANENTE E CONTINUADA. FORMA DE CÁLCULO. LEI Nº 10.559/2002, ART. 6º, §1º. INFORMAÇÕES TRAZIDAS PELA PARTE AUTORA. DECLARAÇÕES DO SINDICATO DOS METALÚRGICOS DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS E REGIÃO. PESQUISA DE MERCADO. CARÁTER RESIDUAL.
I – Na hipótese, não há que se falar em impossibilidade jurídica do pedido tendo em vista a inafastabilidade constitucional da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV), bem como "a independência das instâncias administrativa e judicial, não exigem o acionamento e/ou esgotamento das vias administrativas para que o anistiado político pleiteie em juízo valores que entende devidos" (AC 0026647- 86.1999.4.01.3400 / DF, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, QUINTA TURMA, e-DJF1 de 26/04/2017).
II – Nos termos do art. 6º, §1º, da Lei nº 10.559/2002, o valor da prestação mensal será determinado em função dos elementos de prova apresentados pelo requerente, que poderão ser informações de órgãos oficiais, bem como de fundações, empresas públicas ou privadas, ou empresas mistas sob controle estatal, ordens, sindicatos ou conselhos profissionais a que o anistiado político estava vinculado ao sofrer a punição, sendo que a pesquisa de mercado será utilizada residualmente, nos casos em que resta inviável a obtenção do valor da remuneração do anistiado a partir do acervo documental dos autos em exame. Precedentes deste TRF1ª Região.
III – Na espécie, não há que se falar em fixação do valor da prestação mensal com base em pesquisa de mercado, uma vez que devem ser prestigiados os documentos trazidos aos autos pela parte autora, em especial as informações fornecidas pelo Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e Região, sendo que a alegada falta de "plano de progressão funcional" da empresa General Motors S/A não implica a obrigatória utilização da pesquisa de mercado para definição do montante a ser pago mensalmente aos autores.
IV – Apelação provida para condenar a União Federal a pagar aos promoventes a prestação mensal, permanente e continuada, de acordo com os valores apresentados pelo Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos e Região, devidamente atualizados em conformidade com os acréscimos e vantagens legais da categoria de cada um dos autores, bem como a pagar as diferenças resultantes do novo cálculo em relação aos valores já pagos, acrescidas de juros de mora e correção monetária, segundo os índices seguintes: (a) até dezembro/2002: juros de mora de 0,5% ao mês; correção monetária de acordo com os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001; (b) no período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora correspondentes à taxa Selic, vedada a cumulação com qualquer outro índice; (c) período posterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança; correção monetária com base no IPCA-E. (AC 0066130-06.2011.4.01.3400, DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, TRF1 – QUINTA TURMA, e-DJF1 14/03/2019 PAG.) (grifo nosso)
Com efeito, embora o Poder Público possua a faculdade de rever seus atos, em especial no que tange à concessão de anistia política com base na Portaria nº 1.104/GM-3/1964 (RE nº 817.338, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe 31/07/2020), não há que se falar em falta de interesse processual em razão do reconhecimento administrativo da condição de anistiado político, na medida que somente a sentença de mérito produz coisa julgada formal e material, na espécie.
Nesse sentido, verifica-se que, não obstante o recebimento da respectiva prestação mensal desde 2002, a promovente foi surpreendida em 2019 com a possibilidade de revogação do benefício, diante da regular instauração de procedimento administrativo de revisão de anistias concedidas com fundamento na Portaria nº 1.104/GM-3/1964, sendo que a simples garantia do contraditório e da ampla defesa, nem mesmo a “plausibilidade” de seu direito (ou seja, a improbabilidade da efetiva revogação do benefício), são suficientes para afastar seu justo e evidente interesse na resolução definitiva do assunto em juízo. Em sendo assim, há de ser anulada a sentença recorrida, em face da caracterização do interesse processual da parte autora quanto ao provimento jurisdicional requerido, avançando-se, contudo, no exame de mérito da causa, uma vez que se encontra madura para tanto, nos termos do art. 1.013, § 3º, inciso II, do CPC vigente.
***
Posta a questão nestes termos, a controvérsia instaurada nos autos refere-se à confirmação do reconhecimento administrativo da condição de asilado político do falecido marido da autora, assim como a ratificação da correspondente prestação mensal, permanente e continuada.
Nesse sentido, peço vênia para colacionar os fundamentos da sentença recorrida, que, em verdade, constituem argumentação de mérito em favor da manutenção do benefício recebido pela promovente, nas letras seguintes: In casu, pugna a requerente pela concessão de anistia política ao seu falecido marido, consequentemente, determinando que a União, postumamente, proceda à sua “(…) integração nos quadros da Força Aérea Brasileira, na qualidade de inativo (reservista), na graduação de suboficial, com os proventos da graduação de Segundo-Tenente, sob a forma de prestação mensal, permanente e continuada, bem como o direito de usufruir das vantagens indiretas (art.14 da Lei 10.559/2002)”.
Aparentemente, a proposição desta ação foi motivada pela publicação da Portaria nº 3.076, de 16/12/2019, de iniciativa da Ministra de Estado da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, destinada à instauração de procedimento administrativo de revisão das anistias concedidas com fundamento na Portaria nº 1.104/GM-3/1964, da qual a requerente foi notificada por meio do ofício nº 1575/2020/DGTI/CCP/CGP/CA para exercício do contraditório e de ampla defesa.
Nos moldes da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, firmou-se no julgamento do RE nº 817338 a tese de que os atos de anistia, com base na Portaria n.º 1.104/64- GM3, podem ser revistos depois de decorrido o prazo de 05 (cinco) anos de sua concessão.
Logo, não existe óbice ao prosseguimento do processo administrativo revisional já instaurado pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. O art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, regulamentado pela Lei nº 10.559/2002, reconheceu o direito de anistia àqueles que, no período de 18/09/1946 até a data da promulgação da Constituição de 1988, foram atingidos por atos de exceção, em decorrência de motivação exclusivamente política, deixando asseguradas as promoções, na inatividade, ao cargo, emprego, posto ou graduação a que teriam direito se estivessem em serviço ativo, obedecidos os prazos de permanência em atividade previstos nas leis e regulamentos vigentes e respeitadas as características e peculiaridades das carreiras dos servidores públicos.
Ao que interessa à solução da lide, é firme o entendimento fixado pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ no sentido de que a Portaria n.º 1.104/1964 do Ministério da Aeronáutica, cujo conteúdo era genérico e impessoal, somente tem natureza de ato de exceção (motivação política) contra os militares da Aeronáutica que ostentavam a patente de Cabo na data de sua edição (12/10/1964), já que foram os únicos a serem alcançados pelos efeitos da referida norma (AgRg no REsp 1055841/PE, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Quinta Turma, julgado em 25/06/2013, DJe 01/07/2013). Compulsando os autos, especialmente do histórico militar e folhas de alterações (Id 376402435, pág. 12), verifica-se que o falecido esposo da autora, CARLOS FERNANDES FILHO, ingressou como recruta da Aeronáutica em dezembro de 1957 para prestar serviço militar obrigatório, foi reengajado sucessivamente e ostentava a patente de Cabo na data da edição da Portaria nº 1.104/GM3-64, que determinou a limitação do tempo de permanência dos Cabos da Aeronáutica na corporação para 8 (oito) anos, quando passaram a ser licenciados automaticamente.
No mencionado documento consta, ainda, de forma expressa e inequívoca, que o de cujus foi licenciado do serviço ativo da Força Aérea Brasileira em janeiro de 1967 por força da Portaria nº 1.104/GM3, de 12/10/1964 e da Portaria nº 240/GM3, de 06/06/1966, que revogaram a Portaria nº 570/GM3, então vigente, a qual não previa limitação temporal para reengajamentos sucessivos.
Nesse contexto, tendo em vista que a aplicação da Portaria n.º 1.104-GM3, de 12/10/1964, de fato, constituiu ato de exceção determinante para o licenciamento do militar em questão, não vislumbro haver qualquer hipótese para a anulação do ato de anistia fundado em argumento em sentido contrário. Sobre a matéria, a título exemplificativo, confiram-se os entendimentos jurisprudenciais firmados pelo Superior Tribunal de Justiça e pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. ANISTIA POLÍTICA. MILITAR LICENCIADO DA AERONÁUTICA. INGRESSO ANTERIOR À PORTARIA Nº 1.104/GM3-64. CARACTERIZAÇÃO DE PERSEGUIÇÃO POLÍTICA. NATUREZA DE EXCEÇÃO DO ATO.
1. Os cabos incorporados anteriormente à vigência da Portaria nº 1.104/GM3-64 do Ministério da Aeronáutica fazem jus à anistia, porquanto o mencionado instrumento normativo não só prejudicou direitos outrora concedidos, mas foi editado com motivação exclusivamente política, a evidenciar a natureza de exceção do ato.
2. Situação diversa daquelas dos cabos que ingressaram na Aeronáutica após a edição da Portaria nº 1.104/GM3-64, em que a anistia política não é reconhecida, visto que em relação a estes a norma era preexistente, ou seja, tinha conteúdo genérico e impessoal, não podendo ser atribuído conteúdo político aos atos que determinaram os licenciamentos por conclusão do tempo de serviço permitido, na forma da legislação então vigente.
3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp 1055841/PE, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 25/06/2013, DJe 01/07/2013).
ADMINISTRATIVO. MILITAR. ANISTIA. INCORPORAÇÃO AO SERVIÇO ATIVO DA AERONÁUTICA APÓS EDIÇÃO DA PORTARIA N. 1.104-GM3/1964. ATO DE LICENCIAMENTO. PERSEGUIÇÃO POLÍTICA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. REVISÃO DE ANISTIA. POSSIBILIDADE DE ANULAÇÃO DA PORTARIA QUE RECONHECEU A CONDIÇÃO DE ANISTIADO POLÍTICO A CABO DA FORÇA AÉREA BRASILEIRA. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. POSSIBILIDADE DE REVISÃO OU ANULAÇÃO DOS PRÓPRIOS ATOS. SÚMULA 473/STF. OBSERVÃNCIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL.
1. Não há que se falar em decadência do direito de anular a portaria que declarou o autor anistiado político. O ato de declaração de anistia data do ano de 2002 (Portaria n° 2.469/2002) e o procedimento administrativo de anulação ocorreu no ano de 2004 (Portaria n° 594/2004), dentro, portanto, do prazo decadencial de 5 (cinco) anos previsto na Lei 9.784/99.
2. O art. 8° do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, regulamentado pela Lei 10.559/2002, concedeu anistia aos que, no período de 18 de setembro de 1946 até a data da promulgação da Constituição, foram atingidos, em decorrência de motivação exclusivamente política, por atos de exceção, institucionais ou complementares.
3. O autor teve a sua condição de anistiado político declarada por ato do Ministro de Estado da Justiça. Entretanto, sua anistia foi revista e anulada, com o fundamento de que, à época da edição da Portaria n° 1.104/64, do Ministério da Aeronáutica, o autor não alçava a condição de Cabo da Força Aérea Brasileira. A referida portaria é considerada norma anterior, de cunho geral e impessoal, da qual havia prévio conhecimento, não estando configurada a motivação política ensejadora da anistia.
4. A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial (Súmula 473/STF).
5. Houve observância aos princípios do devido processo legal e do contraditório, pois instaurado o processo administrativo mediante portaria publicada no Diário Oficial, assegurando-se aos interessados a regular apresentação de ampla defesa.
6. Apelação do autor não provida. (AC 0002342-47.2013.4.01.3400, DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS AUGUSTO PIRES BRANDÃO, TRF1 – PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 21/02/2020 PAG.)
ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. SERVIDOR PÚBLICO MILITAR. AERONÁUTICA. RECONHECIMENTO DA CONDIÇÃO DE ANISTIADO POLÍTICO. ART. 8º DO ADCT. GRADUAÇÃO DE SOLDADO À ÉPOCA DA EDIÇÃO DA PORTARIA Nº 1.104-GM3. INEXISTÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE ATO DE EXCEÇÃO NO LICENCIAMENTO.
1. A concessão da anistia prevista no art. 8º do ADCT, regulamentado pela Lei n. 10.559/2002, pressupõe a comprovação de dois requisitos: a) ter sido o interessado atingido por ato de exceção, b) em decorrência de motivação exclusivamente política.
2. O Superior Tribunal de Justiça tem jurisprudência firmada no sentido de que, "consoante o entendimento da Terceira Seção deste Superior Tribunal de Justiça, os militares que não ostentavam a condição de Cabo da Força Aérea quando da edição da Portaria nº 1.104/GM3-64 não têm direito a anistia, uma vez que não foram alcançados pela norma" (AgRg no REsp 1055841/PE, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Quinta Turma, julgado em 25/06/2013, DJe 01/07/2013).
3. No presente caso, o autor ingressou na FAB antes da edição da Portaria nº 1.104-GM3, de 12/10/1964, no entanto, os assentamentos funcionais juntados aos autos falham em demonstrar que o autor ostentava o status de cabo à época da edição daquela norma.
4. "Ainda que incorporado antes de 1964, ao militar que não alcançou a graduação de Cabo até 1964 não se aplica a presunção de que foi colhido por ato de exceção. Assim, necessariamente deveria comprovar que sofreu perseguição política no período em que prestou serviço militar ativo, como condição para reconhecimento do direito de obter o benefício de que trata o art. 8º do ADCT c/c Lei 10.559/2002" (AC 0016456- 35.2006.4.01.3400 / DF, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO DE ASSIS BETTI, Rel. Conv. JUIZ FEDERAL CLEBERSON JOSÉ ROCHA (CONV.), SEGUNDA TURMA, e-DJF1 de 26/01/2016).
5. Ausentes provas quanto à ocorrência de fatos que indiquem a existência de perseguição política em seu desfavor, e não tendo o autor se desincumbido desse ônus, a teor do art. 333, I, do CPC/1973, vigente à época da prolação da sentença, não resta demonstrado qualquer ato de ilegalidade no seu licenciamento. 6. Apelação da parte autora desprovida. (AC 0025274-73.2006.4.01.3400, JUÍZA FEDERAL OLÍVIA MÉRLIN SILVA (CONV.), TRF1 – PRIMEIRA TURMA, e-DJF1 19/02/2020 PAG.)
Temos que, com base no entendimento de que a Portaria nº 1.104/64-GM3 significou ato de exceção para os Cabos da Aeronáutica na data de sua edição, em 21/12/2001, o militar requereu à Comissão de Anistia do Ministério da Justiça o reconhecimento da sua condição de anistiado (Requerimento nº 20010105426), o que restou reconhecido por intermédio da Portaria MJ nº 2.876, de 30/12/2002. Destaco ainda que o art. 13º da Lei nº 10.559/02, em caso de falecimento do anistiado, confere aos seus dependentes econômicos o direito de percepção da reparação econômica já concedida, o que, no caso dos autos, trata-se de prestação mensal, permanente e continuada de, aproximadamente, R$ 11.235,00 (onze mil duzentos e trinta e cinco reais), que continua sendo pago (Id 376402421). Como visto, segundo documentação acostada aos autos, o falecido esposo da autora, CARLOS FERNANDES FILHO, ostentava a patente de Cabo da Aeronáutica na data da edição da Portaria nº 1.104/GM3-64, configurando, assim, tal ato normativo como ato de exceção a justificar o reconhecimento de sua condição de asilado político, bem como a autorizar a confirmação do direito da promovente à percepção de reparação econômica tal como concedida administrativamente (Portaria nº 2876, de 30 de dezembro de 2002 – ID 148227036), o que, no caso dos autos, trata-se de prestação mensal, permanente e continuada de, aproximadamente, R$ 11.235,00 (onze mil duzentos e trinta e cinco reais).
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Com estas considerações, dou provimento à apelação da autora para anular a sentença monocrática e decidir, de logo, nos termos do § 4º do art. 1.013 do CPC vigente , julgando procedente o pedido inicial, para condenar a promovida a conceder anistia política ao falecido marido da autora, determinando que proceda sua integração nos quadros da Força Aérea Brasileira, na qualidade de inativo (reservista), na graduação de Segundo-Tenente, sob a forma de prestação mensal, permanente e continuada, bem como o direito de usufruir vantagens indiretas, assim como para condenar a União Federal a pagar à autora valores retroativos decorrentes de período, em que, durante a presente ação, eventualmente permaneceu fora da folha de pagamento da Aeronáutica, acrescidos de juros de mora e correção monetária, segundo os índices seguintes:
(a) até dezembro/2002: juros de mora de 0,5% ao mês; correção monetária de acordo com os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001;
(b) no período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora correspondentes à taxa Selic, vedada a cumulação com qualquer outro índice;
(c) período posterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança; correção monetária com base no IPCA-E.
Condeno a promovida ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o proveito econômico obtido, a teor do art. 85, § § 2º e 3º, do CPC vigente .
Este é meu voto.
DEMAIS VOTOS
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1064000-11.2020.4.01.3400
Processo de origem: 1064000-11.2020.4.01.3400
APELAÇÃO CÍVEL (198) 1064000-11.2020.4.01.3400
RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE
APELANTE: SILVINA DE ALMEIDA FERNANDES
Advogado da APELANTE: EDMUNDO STARLING LOUREIRO FRANCA – DF20252-A
APELADA: UNIÃO FEDERAL
EMENTA
PROCESSUAL CIVIL, CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. ANISTIA POLÍTICA. PERÍODO DA DITADURA MILITAR. SERVIDOR MILITAR DA AERONÁUTICA. PORTARIA Nº 1.104/GM-3/1964 . ATO DE EXCEÇÃO. CONFIRMAÇÃO DA CONDIÇÃO DE ANISTIADO POLÍTICO E DO CABIMENTO DA REPARAÇÃO ECONÔMICA. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. INTERESSE PROCESSUAL. RECONHECIMENTO ADMINISTRATIVO. PRESTAÇÃO MENSAL, PERMANENTE E CONTINUADA. INSTAURAÇÃO DE PROCEDIMENTO DE REVISÃO DO BENEFÍCIO. INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO (CF, ART. 5º, XXXV). COISA JULGADA FORMAL E MATERIAL. QUESTÃO SUBMETIDA A JUÍZO. SENTENÇA ANULADA. CAUSA MADURA. AVANÇO NO MÉRITO. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO INICIAL.
I – A inafastabilidade constitucional da jurisdição (CF, art. 5º, XXXV), bem como “a independência das instâncias administrativa e judicial, não exigem o acionamento e/ou esgotamento das vias administrativas para que o anistiado político pleiteie em juízo valores que entende devidos” (AC 0026647-86.1999.4.01.3400 / DF, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, QUINTA TURMA, e-DJF1 de 26/04/2017).
II – Embora o Poder Público possua a faculdade de rever seus atos, em especial no que tange à concessão de anistia política com base na Portaria nº 1.104/GM-3/1964 (RE nº 817.338, Rel. Min. Dias Toffoli, DJe 31/07/2020), não há que se falar em falta de interesse processual em razão do reconhecimento administrativo da condição de anistiado político, na medida que somente a sentença de mérito produz coisa julgada formal e material. Assim, não obstante o recebimento da respectiva prestação mensal desde 2002, a promovente foi surpreendida em 2019 com a possibilidade de revogação do benefício, diante da regular instauração de procedimento administrativo de revisão de anistias concedidas com fundamento na Portaria nº 1.104/GM-3/1964, sendo que a simples garantia do contraditório e da ampla defesa, nem mesmo a “plausibilidade” de seu direito (ou seja, a improbabilidade da efetiva revogação do benefício), não são suficientes para afastar seu justo e evidente interesse na resolução definitiva do assunto em juízo. Sentença anulada.
III – Segundo entendimento jurisprudencial do colendo Superior Tribunal de Justiça , a Portaria n.º 1.104/1964 do Ministério da Aeronáutica, cujo conteúdo era genérico e impessoal, somente tem natureza de ato de exceção (motivação política) contra os militares da Aeronáutica que ostentavam a patente de Cabo na data de sua edição (12/10/1964), já que foram os únicos a serem alcançados pelos efeitos da referida norma (AgRg no REsp 1055841/PE, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Quinta Turma, julgado em 25/06/2013, DJe 01/07/2013).
IV – Na espécie, o falecido esposo da autora ostentava a patente de Cabo da Aeronáutica na data da edição da Portaria nº 1.104/GM3-64, configurando, assim, tal ato normativo como ato de exceção, a justificar o reconhecimento de sua condição de asilado político, bem como a confirmar o direito da promovente à percepção de reparação econômica tal como concedida administrativamente (Portaria do Ministério da Justiça nº 2876, de 30 de dezembro de 2002), o que, no caso dos autos, trata-se de prestação mensal, permanente e continuada de, aproximadamente, R$ 11.235,00 (onze mil duzentos e trinta e cinco reais).
V – Apelação da autora provida, para anular a sentença recorrida e decidir, de logo, o mérito da demanda, nos termos do § 3º, inciso II, do art. 1.013 do CPC vigente, julgando procedente o pedido inicial, para condenar a promovida a conceder anistia política ao falecido marido da autora, determinando que proceda sua integração nos quadros da Força Aérea Brasileira, na qualidade de inativo (reservista), na graduação de SegundoTenente, sob a forma de prestação mensal, permanente e continuada, bem como o direito de usufruir vantagens indiretas, assim como para condenar a União Federal a pagar à autora valores retroativos decorrentes de período, em que, durante a presente ação, eventualmente permaneceu fora da folha de pagamento da Aeronáutica, acrescidos de juros de mora e correção monetária, segundo os índices seguintes:
(a) até dezembro/2002: juros de mora de 0,5% ao mês; correção monetária de acordo com os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001;
(b) no período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora correspondentes à taxa Selic, vedada a cumulação com qualquer outro índice;
(c) período posterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança; correção monetária com base no IPCA-E.
Condenou-se a promovida ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o proveito econômico obtido, a teor do art. 85, §§ 2º e 3º, do CPC vigente.
ACÓRDÃO
Decide a Turma, à unanimidade, dar provimento à apelação da autora, nos termos do voto do Relator. Quinta Turma do Tribunal Regional Federal – 1ª Região, em 15/1 2/2021.
Desembargador Federal SOUZA PRUDENTE
Relator
Desembargador Federal ANTONIO PRUDENTE SOUZA do TRF1.
Para ler ou baixar o Inteiro teor (original) da Decisão do Desembargador Federal Antonio Prudente Souza, do TRF1, nos autos do AP 1064000-11.2020.4.01.3400/DF. Clique no Link seguinte: PROCESSO_ 1064000-11.2020.4.01.3400 – APELAÇÃO CÍVEL
Postado por Gilvan VANDERLEI
Ex-Cabo da FAB – Atingido pela Portaria 1.104GM3/64
E-mail gvlima@terra.com.br
Sem Comentários do post " À quem interessar possa conhecer e divulgar para viúvas e outros patronos… Da decisão na AP 1064000-11.2020.4.01.3400 concedida dia (16/12/2021) no TRF1 pelo Desembargador Federal ANTONIO DE SOUZA PRUDENTE à Silvina de Almeida Fernandes, viúva do ex-Cabo (Pré/64) CARLOS FERNANDES FILHO restaurando sua condição de anistiado político "
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