Juiz Federal Substituto Gustavo Henrique Teixeira de Oliveira

 

0010943-12.2012.4.05.8300  Classe: 29 – AÇÃO ORDINÁRIA (PROCEDIMENTO COMUM ORDINÁRIO)

Última Observação informada: Juntada Automática pelos Avisos da Movimentação. (08/07/2014 12:25)

 Última alteração: FHBO

        Localização Atual: 7a. VARA FEDERAL

        Autuado em 01/06/2012  –  Consulta Realizada em: 17/10/2014 às 13:50

        AUTOR     : UNIAO FEDERAL

        PROCURADOR: EMILIA CORREA DE ARAUJO OLIVEIRA

        RÉU       : ANTONIO ROLIM PEREIRA SOBRINHO

        ADVOGADO  : JACINTA DE FATIMA COUTINHO MOURA

        7a. VARA FEDERAL –  Juiz Substituto

        Objetos: 02.19.02.03 – Pagamento indevido – Atos unilaterais – Obrigações – Civil

        Existem Petições/Expedientes Vinculados Ainda Não Juntados

(…)

SENTENÇA

I – RELATÓRIO

          Trata-se de ação ordinária ajuizada pela União em face de Antônio Rolim Pereira Sobrinho, objetivando o ressarcimento de valores recebidos indevidamente, no importe de R$ 304.069,26, atualizado até agosto/2011.  

         Narra, em síntese, a parte autora que, em razão de decisão judicial – proferida nos autos da ação ordinária nº 2007.83.00.010751-2, que tramitou perante a 21ª Vara Federal -, a parte ré passou a perceber valores mensais a título de reparação econômica. Relata que a decisão liminar que havia determinado o pagamento foi cassada, tendo em vista a improcedência do pedido. Alega que, embora a sentença ainda não tenha transitado em julgado, não há que se falar em ajuizamento precoce da presente demanda, haja vista que os recursos pendentes não possuem efeito suspensivo. Juntou cópia do processo administrativo nº 258/II COMAR/2010.

          O réu apresentou contestação, sustentando a irrepetibilidade dos valores, tendo vista a natureza alimentar das verbas recebidas e a boa-fé quanto ao seu recebimento.

          A União ofereceu réplica, reiterando os termos da exordial.

          Não houve produção de novas provas.

          Vieram-me conclusos. 

          É o relatório. Decido.

II – FUNDAMENTAÇÃO

     Resume-se o pleito inicial à restituição ao erário de valores pagos, em razão de decisão liminar substitutiva, no AGRT nº 81012/PE, que determinou fosse efetuado o pagamento da reparação econômica mensal, permanente e continuada, tendo sido posteriormente revogada em razão da improcedência da pretensão.

      Inicialmente, em consulta ao sítio do STF, constato que a ação ordinária nº 2007.83.00.010751-2 teve o seu trânsito em julgado em 27/08/2014, na ocasião da negativa de seguimento do Recurso Extraordinário, interposto pelo autor daquele processo.

      In casu, o Réu percebeu, em sede de tutela antecipatória substitutiva, nos autos acima mencionados, valores concernentes à prestação pecuniária mensais, de caráter indenizatório, de forma permanente e continuada, relativamente à condição de anistiado político, até a cassação do pleito antecipatório. Tais valores corresponderam ao período de maio/2004 a outubro/2009.

          Objetivando o deslinde da controvérsia, transcrevo o parágrafo 4º, do art. 273 (CPC): "A tutela antecipada poderá ser revogada ou modificada a qualquer tempo, em decisão fundamentada", o que traduz o caráter precário das decisões judiciais liminares.

          Não obstante a precariedade que norteia as decisões liminares, esta não implica, de per si, na obrigatoriedade de se recompor os prejuízos que possivelmente tenham advindos em desfavor da parte adversa, em virtude dos efeitos do Decisum. Fosse assim, em sua generalidade, estar-se-ia diante de uma forma indireta de cerceamento do acesso à Justiça, sendo este um direito fundamental, garantido constitucionalmente (CF, Art.5º, XXXV). Antes, porém, denota a vulnerabilidade do próprio direito provisoriamente satisfeito, ainda que em parte, gerando uma mera expectativa de sua definitividade.

          No que se refere às verbas recebidas, a título de reparação econômica a anistiado político, não obstante o seu caráter indenizatório, têm-se defendido a sua natureza alimentar, para justificar o seu cabimento liminarmente. Veja-se:

"ADMINISTRATIVO. ANISTIA POLÍTICA. ANULAÇÃO DO ATO CONCESSÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. DECADÊNCIA CONFIGURADA. RESTABELECIMENTO DO PAGAMENTO DE REPARAÇÃO ECONÔMICA MENSAL, PERMANENTE E CONTINUADA. CABIMENTO.

1. O cerne da presente controvérsia consiste em verificar se a UNIÃO, por meio da Portaria nº 867/12, poderia anular reparação econômica em prestação mensal, permanente e continuada, conferida ao recorrido em decorrência da Portaria nº 2.415/02, por força de anistia política.

2. Embora a Administração Pública detenha o poder-dever de anular seus próprios atos, quando maculados por ilegalidade, ou de revogá-los quando inoportunos ou inconvenientes, tal atuação fica sujeita ao prazo decadencial de cinco anos, contados da percepção do primeiro pagamento, na hipótese de efeitos patrimoniais contínuos, nos precisos termos do parágrafo 1º, do 54, da Lei nº 9.784/1999.

3. (…)

4. Por sua vez, não se sustenta a alegação de impossibilidade de manutenção da decisão recorrida em razão exclusivamente das disposições dos arts. 1º e 2º-B, ambos da Lei 9.494/97. É que, embora tais dispositivos contenham comando para vedar a concessão de liminar e ou antecipação de tutela contra a Fazenda Pública, estes devem ser interpretados em conjunto com o sistema de normas que disciplinam a matéria. Nessa linha, da leitura dos dispositivos neles referidos (arts. 5º e 7º da Lei nº 4.348/64, art. 1º da Lei nº 5.021/66 e arts. 1º e 3º da Lei nº 8.437/92), tem-se que a proibição de concessão de medidas liminares contra a Fazenda Pública apenas se aplicaria caso a lide envolvesse reclassificação, equiparação entre servidores, concessão de aumentos e concessão ou extensão de vantagens. Na realidade, o pretenso direito buscado na ação originária não contempla nenhuma destas hipóteses, cingindo-se tão somente ao restabelecimento do pagamento da reparação econômica em prestação mensal, permanente e continuada, conferida ao ora agravado por meio da Portaria nº 2.415/02, não se tratando, portanto, de concessão de vantagem pecuniária nova. Tal situação, pela mesma razão, afasta a aplicação da vedação contida nos parágrafos 2º e 5º, do art. 7º, da Lei nº 12.016/09.

5. Por outro lado, não se há de falar que a decisão guerreada tenha afrontado o disposto no art. 273 do CPC. Primeiro, porque se apresentam verossímeis as alegações do ora recorrido, lançadas na inicial da Ação Ordinária nº 0801364-07.2012.4.05.8300. Segundo, porque se mostra inegável o receio de lesão irreparável ou de difícil reparação para o agravado, uma vez que a suspensão dos pagamentos mensais relacionados à reparação econômica colocou em risco a própria subsistência do agravado, dada a natureza alimentar da verba em comento. (…). Ademais, deve ser assegurada a proteção do direito social à alimentação, previsto no art. 6º da CF/88, o que, por si só, já seria suficiente para temperar, se fosse a hipótese, o disposto no parágrafo 2º, do art. 273, do CPC.

6. Precedentes desta Corte e do TRF da 1ª Região: AGTR124756; APELREEX/PE – Pje 08013810920134058300; AC/RN – PJe 08000857420124058400; AG94642/CE e AG0045382-02.2010.4.01.0000/BA. 7. Agravo de instrumento improvido."  

(TRF5ª Região. AG 08005295320134050000. Segunda Turma. Rel. Des. Federal Fernando Braga. Decisão UNÂNIME. Data 18/02/2014). 

          Ademais, o art. 6º da Lei Lei nº 10.559/2002, que regulamenta o art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, equipara o valor da reparação econômica em prestação, permanente e continuada, ao quantum remuneratório que o anistiado político receberia se na ativa estivesse, respeitadas as características e peculiaridades dos regimes jurídicos dos servidores públicos civis e dos militares. Percebe-se a nítida natureza alimentar de tais verbas, quando mensuradas em consideração ao paradigma e acrescidas à remuneração do beneficiário.

          Com efeito, a devolução de verbas alimentares indevidamente percebidas em decorrência de decisão judicial posteriormente modificada, a jurisprudência pátria é firme no sentido de que, quando se tratam de verbas dessa natureza, a comprovação da existência de má-fé é condição determinante para autorizar a exigência de seu ressarcimento. 

          É forçoso ressaltar que os valores recebidos pelo Réu, na ocasião, foram por consequência de Decisão judicial, de instância superior, inclusive, presumindo-se a boa-fé do beneficiário, ante ao acertamento do julgamento, pelo Órgão julgador correspondente, na ocasião, mostrando-se inviável impor a restituição das verbas auferidas, tão somente por haver a reforma da Decisão, inexistindo a comprovação de má-fé.

          Nesse sentido, trago à colação o seguinte precedente da Corte Especial, do Col. STJ:

"PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. SENTENÇA QUE DETERMINA O RESTABELECIMENTO DE PENSÃO POR MORTE. CONFIRMAÇÃO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. DECISÃO REFORMADA NO JULGAMENTO DO RECURSO ESPECIAL. DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ.

1. A dupla conformidade entre a sentença e o acórdão gera a estabilização da decisão de primeira instância, de sorte que, de um lado, limita a possibilidade de recurso do vencido, tornando estável a relação jurídica submetida a julgamento; e, de outro, cria no vencedor a legítima expectativa de que é titular do direito reconhecido na sentença e confirmado pelo Tribunal de segunda instância.

2. Essa expectativa legítima de titularidade do direito, advinda de ordem judicial com força definitiva, é suficiente para caracterizar a boa-fé exigida de quem recebe a verba de natureza alimentar posteriormente cassada, porque, no mínimo, confia – e, de fato, deve confiar – no acerto do duplo julgamento.

3. Por meio da edição da súm. 34/AGU, a própria União reconhece a irrepetibilidade da verba recebida de boa-fé, por servidor público, em virtude de interpretação errônea ou inadequada da Lei pela Administração. Desse modo, e com maior razão, assim também deve ser entendido na hipótese em que o restabelecimento do benefício previdenciário dá-se por ordem judicial posteriormente reformada.

4. Na hipótese, impor ao embargado a obrigação de devolver a verba que por anos recebeu de boa-fé, em virtude de ordem judicial com força definitiva, não se mostra razoável, na medida em que, justamente pela natureza alimentar do benefício então restabelecido, pressupõe-se que os valores correspondentes foram por ele utilizados para a manutenção da própria subsistência e de sua família. Assim, a ordem de restituição de tudo o que foi recebido, seguida à perda do respectivo benefício, fere a dignidade da pessoa humana e abala a confiança que se espera haver dos jurisdicionados nas decisões judiciais.

5. Embargos de divergência no recurso especial conhecidos e desprovidos.

(STJ. Corte Especial. ERESP – EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL – 1086154 – Rel. Min. Nancy Andrigh – DJE 19/03/2014). 

          Dessa forma, ausente qualquer indício de que o demandado tenha agido de má-fé no recebimento dos mencionados valores, imperioso o afastamento da pretensão da Administração de buscar o ressarcimento de tais valores.

III – DISPOSITIVO 

          Isto posto, julgo improcedente o pedido inicial, extingo o processo com resolução de mérito, nos termos do art. 269, I, do CPC.

          Fixo em R$ 2.000,00 (dois mil reais) os honorários advocatícios a serem suportados pela UNIÃO2 (art. 20, §4º, do CPC)3.

          Custas na forma da lei.

          Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

          Recife (PE), 02 de setembro de 2014.

  

GUSTAVO HENRIQUE TEIXEIRA DE OLIVEIRA
Juiz Federal Substituto em Exercício na 7ª Vara/PE.

 

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Postado por Gilvan VANDERLEI
Ex-Cabo da FAB – Vítima da Portaria 1.104GM3/64
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