VOTO-VENCIDO
O que entende o Ministro Celso de Mello, "decano" do Supremo Tribunal Federal, sobre o "voto-vencido".
 
Sua declaração, neste vídeo abaixo, é uma lição para os "algozes" dos ex-Cabos da FAB, em especial os incorporados após a edição da Portaria 1.104GM3/64, que tiveram suas portarias de anistias anuladas pelo Ministro da Justiça sob a influência direta, em 2003, do Comando da Aeronáutica.
 
Assistam o vídeo para entenderem o que disse o ministro Celso de Mello:

Não há processo administrativo.

 
Caros FABIANOS e leitores em geral,
 
Nos autos do Mandado de Segurança nº 9862-DF, entendeu o Ministro Paulo Medina, acompanhado pelo Ministro Nilson Naves, quando proferiu o seguinte VOTO-VENCIDO com relação ao indevido “Processo Anulatório”, decorrente da Portaria 594/MJ, de 16.02.2004, contra 495 ex-Cabos da F.A.B. Pós 1964, que tiveram suas Portarias de Anistias ANULADAS pelo ex-Ministro de Estado da Justiça do Governo Lula da Silva, neste caso Dr. Márcio Thomaz Bastos, o seguinte, verbis:

"Se são 495 equívocos, serão 495 equívocos corrigidos."
(Ministro Paulo Medina – STJ )

Ex-Ministro Paulo Medina (STJ)

“(…)

O EXMO. SR. MINISTRO PAULO MEDINA:

Sr. Presidente, quando cheguei, já havia sido feitos o Relatório e a sustentação oral. Todavia, estou em condições de votar.

A matéria, reiteradas vezes, já foi objeto de debate nesta Casa. Há praticamente um pensamento unânime no sentido de se afastar  a obstaculização à razão de se lhe dar a anulação da anistia.

Tenho, no entanto, o dever de mais uma vez expressar-me nesta Corte. Vi o eminente Relator destacar, e já o houvera feito o Subprocurador-Geral da República, que não há que se discutir os motivos da falsidade agora e, sim,  a razão da falsidade ter existido ou não quando da concessão da anistia.

O procurador, várias vezes, insistiu nesse ponto de vista, insistiu nessa tese há muito tempo, inclusive, mudando os rumos da jurisprudência da Casa. 

Antes vinha caminhando normalmente e o mandado de segurança era concedido e mantidas as anistias. Depois de uma observação feita por ele, é verdade, alterou-se o rumo, e reexaminou a matéria;  e hoje, o pensamento do Subprocurador-Geral da República é diferente.

Mas penso que há equívoco dos que pensam majoritariamente de modo diverso.

Neste caso,  não se discute se é falso ou não é falso o motivo que concedeu ou não anistia. Aqui não tem que se discutir se,  ao tempo da concessão da anistia, foram falsos os motivos que a concederam. Não se discute em mandado de segurança. Cumpriria ao governo, à União, ao Estado, à quem concedeu a anistia, verificar na época a existência do erro de fato.

O que se discute aqui é o fato de estarmos anulando o ato que anulou a anistia sem processo.

O advogado sustentou muito bem. Ou seja, a anistia foi texto em falso e mal concedida. Diante disso, não cabe mandado de segurança.

Mas não é isso que se discute. Tem que se respeitar a lei, tem que se respeitar o Direito, tem que se respeitar o sagrado e elementar direito de cada um e exigir, conforme previa a Constituição de 1988, a procedimentalização, a observação à fidelidade e ao princípio da confiança e da boa-fé. Se o governo, se a administração concedeu anistia, a partir de então, há que se presumir a veracidade desse ato, ou seja, a legitimidade e a boa-fé da autoridade pública  têm que se presumir verdadeira.

Se depois, a própria administração, o próprio Ministro, anula, por intermédio de portaria, sem processo, sem procedimento, a anistia, não se discute mais, anistia e, sim, o motivo que V. Exa destacou. Isso está tudo superado. Não se pode transferir esse dever para aquele que for anistiado.

O anistiado não tem esse dever. Ele só tem o dever de manifestar que se anulara a portaria que lhe concedia anistia, sem ensejar-lhe a oportunidade de se defender, ainda mais em matéria de fato, ou seja, se é subversivo, se não é subversivo, se é política ou não é política.

O Procurador, o Ministro da Justiça, usou matéria de fato concedendo anistia. Agora não usando matéria de fato, informa que o servidor deve voltar ao seu tempo, para provar se o motivo da anistia era verdadeiro ou falso. Se fizermos isso, estaremos invertendo totalmente o sistema jurídico. Este mandado de segurança consta de apenas dois argumentos, Sr. Ministro-Relator. O argumento é único. Não há processo administrativo.

Sr. Ministro José Arnaldo da Fonseca, verifiquei essa portaria em sessão anterior e destaquei que a portaria genérica não se faz sem que se enseje a notificações individual a cada, se anistiado, apesar de serem 495 deles. Poderia ser um, ou dois, ou 4.950, a notificação deve existir. Não tem a validade genérica essa portaria.

Esse documento não facilitou o contraditório, não facilitou a defesa. A portaria foi uma notícia da anulação e basta. Isso não basta no processo administrativo. O processo administrativo tem que ser instaurado contra cada um dos anistiados. Deve-se averiguar o motivo pelo qual foi ou não foi anistiado. Que se instaure os 495 processos. Que a defesa se faça. Do contrário, o que acontece é a generalização.

O que está acontecer — e V. Exa.  insiste na idéia, louvável,  e toda a Casa insiste  —, e o procurador bate firme na idéia, é que estamos querendo responder de forma pragmática ao problema da anistia, isto é, se o cabo era subversivo, se não era subversivo, se o cabo era corrupto, se não era corrupto, se não tinha condições de cabo, qualquer que seja o fato.  Diante disso, foi indiciado equivocadamente.

Não estou discutindo isso.

Discuto que no momento da anistia, presume verdadeiro que o cabo merecia anistia. Somente. Ao se querer modificar isso não o será pela diligência ou pela investigação particular ou  oficial pelo Ministério Público, como se fez pela Procuradoria. Deve-se ensejar efetivamente à parte, ao servidor, o direito – isso é  irrecusável – ao devido processo legal, no sentido de ser intimado para se defender de tal fato concretamente. Não genericamente, revogando a anistia.

Se a parte cometeu um certo erro, aponte-se qual o erro, para que haja a defesa desse erro. Isso é que tem que ser feito. Se são 495 equívocos, serão 495 equívocos corrigidos. É mais grave deixar passar isso do que rever 495 processos. Mais grave é a  exceção que estamos fazendo aqui, admitindo que se rompa o direito de defesa do servidor sem o processo legal.

Estamos admitindo a correção de rumo da política afrontando a Constituição Federal. Isso é grave, o precedente é grave.

É nesse sentido que voto, concedendo a ordem em mandado de segurança.”

 

 

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Postado por Gilvan VANDERLEI
Ex-Cabo da FAB – Vítima da Portaria 1.104GM3/64
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