Sexta, 01 de julho de 2011 12:58
Escrito por Mariana Capelo
Foi lançado nesta terça-feira às 10h o Comitê da Verdade do Distrito Federal, com o intuito de apurar o desaparecimento de pessoas que combateram a ditadura no Brasil. Cerca de 300 pessoas estiveram presentes no auditório da reitoria da Universidade de Brasília para prestigiar o evento. Enquanto a Comissão Nacional da Verdade não sai do papel, organizações civis se antecipam e criam comitês regionais para pressionar o governo.
Participaram da mesa de lançamento a ministra de Direitos Humanos das secretaria da Presidência da República, Maria do Rosário; a deputada distrital e presidente da Comissão de Direitos Humanos da câmara legislativa, Celina Leão; e a deputada federal e integrante da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados Érika Kokay. O reitor da Universidade de Brasília, José Geraldo de Souza Júnior, recebeu também a presidente da Comissão de Mortos e Desaparecidos de São Paulo, Luiza Erundina. Durante a breve cerimônia, cada um dos participantes da mesa fez um discurso apoiando a iniciativa brasiliense.
Lançamento do comitê da verdade contou com presença da Ministra de Direitos Humanos, Maria do Rosário
Os comitês são organizações sem vinculação política e não têm acesso a documentos da ditadura, apesar disso, eles são capazes de estimular o governo e apurar, por conta própria, crimes políticos. Já foram criados quase 20 comitês da verdade. Mais que pressionar o governo pela criação da Comissão Nacional da Verdade, os comitês são importantes para reunir as investigações de crimes políticos. Com cada cidade apurando suas denúncias, a comissão poderá trabalhar com mais abrangência e segurança.
A proposta de criação da Comissão Nacional da Verdade tramita no Congresso pelo projeto de lei nº 7376/2010. Atualmente o projeto está na Câmara dos Deputados e aguarda a criação de uma comissão especial da casa. A comissão será composta por sete membros indicados pelo presidente da República e terá dois anos para produzir um relatório. As ações terão de seguir a Lei da Anistia e as leis que criaram a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos e a Comissão de Anistia.
A Comissão da Anistia, criada em 2001, pretende indenizar famílias que foram prejudicadas financeiramente por motivações exclusivamente políticas entre o ano de 1946 e 1988. Sueli Bellato, representante da comissão e presente no lançamento, acredita que terá acesso a documentos que tornarão seu trabalho menos doloroso. “Às vezes negamos o pedido de uma família com o coração sangrando. Agora teremos acesso a documentos que não tínhamos antes, isso vai facilitar nosso trabalho”.
Em discurso caloroso, Maria do Rosário deixou clara a disposição do poder executivo em levar adiante a investigação da ditadura no Brasil. Depois de se colocar a disposição do comitê, reforçou sua vontade particular de prosseguir. “Nós não vamos amarelar na hora de abrir a caixa preta”, revelou.
Em dezembro de 2010 a Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) classificou como crime contra a humanidade o desaparecimento de 62 integrantes da guerrilha do Araguaia. A guerrilha foi organizada pelo PCdoB no início dos anos 70 na região do Bico do Papagaio (divisa dos estados de Tocantins, Pará e Maranhão).
Segundo a corte, O Brasil teria que devolver os restos mortais às famílias dos desaparecidos. Ainda segundo a corte é dever do Estado investigar, julgar e punir torturadores. A punição dos torturadores brasileiros é impedida pela lei da anistia de 1979, que foi uma via de mão dupla: anistiou os presos políticos, mas também anistiou os seus algozes.
Histórias interrompidas
Laurenice Dias, apesar de não ter ficado presa, sofreu na pele as consequências da ditadura. Perdeu o marido antes do tempo e até hoje se emociona ao contar sua história. “Meu marido morreu jovem ainda. Ele saiu vivo, mas com 54 anos eu acho que ainda é muito jovem para morrer, ele nunca se recuperou do que viu na prisão. Ele viu um rapaz ser torturado até a morte, e nunca se recuperou disso. Nós colocamos o nome do nosso primeiro filho em homenagem a esse rapaz. É uma forma de continuar vivendo aquela luta, aquela história, em outra geração”.
Laurenice não vê na comissão uma chance de revanche. “Acho que não é uma coisa de sair numa caça às bruxas como fizeram conosco, não se deve fazer disso uma paranóia nacional, e nem fazermos hoje novas vítimas, vivemos uma nova situação e os nossos algozes também têm família. Da mesma forma que nós fomos vítimas de um processo eu não quero que eles sejam vítimas de uma tentativa nossa de puní-los”, afirmou.
Análise da notícia
A Comissão Nacional da Verdade poderá contar com audiências, requisitar documentos para órgãos públicos e ler documentos sigilosos. Sem função punitiva, a comissão não pode criminalizar pessoas que se revelarem ex-torturadores.
A Comissão é controversa desde que nasceu do terceiro Plano Nacional de Direitos Humanos, com missão de defender o direito à memória e à verdade. A UnB reforça sua vocação política apoiando o lançamento do comitê da verdade. A comissão ainda tem um longo caminho para tornar-se realidade e a esperança daqueles que pretendem vê-la fora do papel é que, com uma presidente com interesses pessoais no assunto, a comissão possa realmente apurar os desaparecimentos políticos.
Fonte: Recebido por e-mail
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